Wanderléa: “Amo, respiro e ainda sei cantar!”

As grandes gravadoras – ditas majors – nunca facilitaram a vida de nenhum artista. E a história guarda fatos e conflitos envolvendo vários dos maiores cantores, compositores e instrumentistas brasileiros. O artista faz sucesso e as majors passam a encarar a pessoa como produto, uma marca; algo que para manter o ciclo deve fixar tais características, ser sempre o mesmo, fazer tudo igual. Há os que resistem! Wanderléa é uma entre esses.

Quem segue a carreira da cantora sabe que os primeiros discos foram na Colúmbia, depois vieram outros de imenso sucesso na CBS, nesta cobrindo o período da Jovem Guarda. É bem provável que Wanderléa teria o mesmo destino de outras cantoras das jovens tardes de domingo, caso gostasse da ideia de manter-se ternurinha, maninha do rei Roberto. Ela queria mais e foi para a Polydor. O primeiro sucesso na nova gravadora deixava uma mensagem muito clara, em letra da própria cantora:

De repente acordei,

Vi que o sonho acabou para mim.

De repente, eu só sei, adeus! (Bye, Bye)

Talvez muitos fãs não tenham entendido o recado. De qualquer forma, Wanderléa manteve seus propósitos e o primeiro LP, Wanderléa Maravilhosa (1972) na nova empresa é um marco, deixando a Ternurinha lá na década de 60. Mais ou menos! Penso que foi imposição da gravadora ter uma versão de Rossini Pinto em meio a canções incríveis de Gilberto Gil, Assis Valente, Hyldon, Jorge Mautner. Mata-me depressa, a canção, é um pé preso ligando a cantora ao público acostumado com as canções do período anterior.

No segundo disco da Polydor a mineira e geminiana Wanderléa radicalizou com um naipe de compositores de primeiríssimo time no disco Feito Gente (1975): Gonzaguinha, Sueli Costa, Joyce Moreno, João Donato, Gilberto Gil, Luiz Melodia, e entre outras feras Walter Franco. Não se pode dizer que seja um disco de sucesso de massa e os tais fãs, aqueles do Pare o Casamento, ficaram por aí, pedindo e insistindo pelas Provas de Fogo da vida. Wanderléa deixou a Polydor.

Artista que se preza não se entrega, rompe barreiras, quebra paradigmas. Na nova gravadora, a Emi-Odeon, Wanderléa reiterou o recado dado no primeiro disco da Polydor ao unir-se a Egberto Gismonti para fazer aquele que é um grande marco musical de sua carreira: Vamos que eu já vou! (1977) E creio ser desse período o imenso prestígio que Wanderléa tem no meio musical. Se já era respeitada pela trajetória juvenil dos sucessos que nunca sairiam da memória dos fãs, é na Polydor e na Emi-Odeon que a cantora deixou claro que seguiria firme no objetivo de ir muito além. Veio Mais que a paixão (1978) com repertório caprichado privilegiando grandes compositores e participações especiais de Djavan, Moraes Moreira e Egberto Gismonti, o autor da canção que dá título ao LP.

Interessadas em maiores vendagens, as gravadoras tentaram impor à Wanderléa uma volta ao jeito Jovem Guarda. Um longo jogo visível em vários dos discos seguintes quando, sem muita razão de ser, entre gravações inéditas colocam “lembranças” com regravações de antigos sucessos. Junte-se a isso muitas coletâneas mesclando as diferentes fases. Enquanto isso a cantora fazia participações em discos de diferentes colegas, além de emplacar vários êxitos em trilhas de novelas. O público da fase juvenil manteve-se fiel, novas gerações passaram a seguir seu trabalho.

Em 2008 Wanderléa lança Nova Estação, pela Lua Music. O disco recoloca a cantora interpretando samba, blues, choro. E, em seguida, em 2013, grava ao vivo no Theatro Municipal de São Paulo o Wanderléa Maravilhosa. Novamente um marco denotando que a partir de então a cantora fará somente o que quiser. Isto inclui, inclusive, um retorno triunfal à Jovem Guarda no Show “60! Década de Arromba. Doc. Musical” (2016). Longa temporada no Rio de Janeiro e em São Paulo, depois percorrendo as principais cidades do país, a Ternurinha fazendo a plateia chorar de emoção ao rever os anos de 1960. Paralelamente, ela lançou Vida de Artista, com todas as faixas compostas por Sueli Costa, um disco suave e emocionante.

Nesta sexta-feira, 27 de maio, Wanderléa esteve no Sesc Santos com seu novo trabalho, onde canta chorinhos clássicos da história da MPB. Acompanhada por um octeto formado por ótimos músicos, a cantora apresentou todas as músicas do cd Wanderléa choros, do selo SESC. Confessando ser um sonho acalentado desde a infância quando ouvia no rádio Ademilde Fonseca, a cantora faz um resgate memorável do ritmo brasileiro esbanjando dicção, ritmo e interpretação, sempre com muita segurança. Os fãs estão presentes e em alguns momentos ouve-se um “canta senhor juiz” e outras canções da Jovem Guarda. Wanderléa encerra o show com Ternura, o primeiro mega sucesso de sua longa carreira. Passeia pela plateia, carinhosa e atenciosa para com quem a ama.

De volta ao palco, aclamada com pedidos de bis, prioriza os chorinhos, é o que quer cantar nesse momento. E a gente fica muito feliz por ela conseguir não ter se dobrado ao que as gravadoras quiseram para ela. O mínimo que podemos desejar aos artistas que amamos: Serem eles mesmos sobre o palco, fazendo e cantando o que bem quiserem.

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Obs. No título, o verso “Amo, respiro e ainda sei cantar” é da música Carne, osso e coração, de Joyce Moreno, incluída no show Wanderléa canta choros.

Mulheres brasileiríssimas

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Para o dia 8 de março saí passeando pela música, lembrando as mulheres todas do nosso imaginário, ícones do nosso povo, exemplos da nossa gente, presentes na música brasileira de todos os tempos. Meu caminho, o abecedário…

No “A” encontrei “Ana Júlia”, “Aurora”, “Ana de Amsterdã”, a trágica “Angélica”e a judiada “Amélia”, com freqüência execrada como alienada, acomodada, sem vontade própria. Eu gosto de vê-la como companheira (coisa difícil de encontrar hoje em dia!).

Nunca vi fazer tanta exigência

Nem fazer o que você me faz

Você não sabe o que é consciência

Não vê que eu sou um pobre rapaz…

Deixei “Amélia” no tempo e fui para o “B” e, de cara, recordei “Benvinda”, muito doce e “Bárbara”, muito forte. Esbarrei em “Beth Balanço”, mas parei mesmo em “Beatriz” que é, talvez, uma das mais belas composições de CHICO BUARQUE.

Sim, me leva sempre, Beatriz

Me ensina a não andar com os pés no chão

Para sempre é sempre por um triz

Ai, diz quantos desastres tem na minha mão

Diz se é perigoso ser feliz…

As moças que não percebem o tempo passando são lembradas no “C”de “Carolina”. Mas aqui é legal assinalar a doce poesia de JOYCE, homenageando suas filha Clara e Ana em “Clareana”. Corro rápido para o “D”, de “Dona” que, tenho bem certeza, era música que meu irmão apreciava. Nessa letra tem a “Dinorah”, a “Domingas” a “Doralinda”, mas esse citado irmão ficaria chateado se eu deixasse de citar “Diana”:

Não se esqueça meu amor

Que quem mais te amou fui eu

Sempre foi o seu calor

Que minha alma aqueceu

E num sonho para dois

Viveremos a cantar

A cantar o amor, Diana!

A letra “E” anda meio pobrinha… Só encontrei uma “Valsa de Eurídice”, linda demais pra ter outra. Deixei a tristeza de “Eurídice” e fui rapidinho encontrar “Flora”, na letra “F”. Flora, a da vida real, é a esposa do GILBERTO GIL. Certamente apaixonada pelo cara, por toda a eternidade, depois de tão soberba homenagem.

Toda aquela luz acesa

Na doçura e na beleza

Terei sono, com certeza

Debaixo da tua sombra

Ô, Flora…

Depois da ternura de GIL por sua esposa, chego num ícone de mulher, criada nesse Brasil moreno, imortalizada por JORGE AMADO em seu romance. O “G” só pode ser de “Gabriela”. “Glória, Glorinha” que me perdoe e até GAL, que tem seu nome em música, mas “Gabriela” é o máximo! E tem “Cantiga por Gabriela” “Tema de Amor de Gabriela”… Tudo muito bom, com a assinatura do mestre maior, TOM JOBIM.

Molha tua boca na minha boca

A tua boca é meu doce, é meu sal

Mas quem sou eu nessa vida tão louca

Mais um palhaço no teu carnaval

“H” é letra da “Helena” na voz do grande TAIGUARA, de grata lembrança. Os ecos das risadas de “Irene” ecoam pelo “I” e por todo abecedário musical; todavia a triste história de “Iracema” é que será aqui mencionada também por lembrar uma grande mulher, CLARA NUNES, intérprete definitiva da música de ADONIRAN BARBOSA.

E hoje ela vive lá no céu

E ela vive bem juntinho de nosso Senhor

De lembranças guardo somente suas meias e seus sapatos

Iracema, eu perdi oseu retrato.

“Januária” deve ter visto tudo da janela, ambas com “J”. Aqui tem uma música que gosto muito, “Joana, a Francesa” e sempre recordo a “Jezebel” na poderosa voz de LENNY EVERSON. Tocando em frente, chego no “K” de “Kátia Flávia, a Godiva do Irajá”e charmosa louraça belzebu, com suas calcinhas rendadas.

Pulo rapidinho para o “L” de “Luiza”. Mulheres fortes nessa letra: “Luz Del Fuego”, “Lindonéia” e, é claro, “Lady Laura” (Aqui mando um beijo pra minha mamãe!)

Quantas vezes me sinto perdido

No meio da noite

Com problemas e angústias

Que só gente grande é que tem

Me afagando os cabelos

Você certamente diria

Amanhã de manhã você vai se sair muito bem…

“Maricotinha” é fresquinha, não gosta de chuva. “Marina” pintou o rosto e o pai, DORIVAL CAYMMI não gostou. Nesse “M” tão forte e poderoso, fica a minha senhora do engenho, a “Maria Bethânia”. Há um disco maravilhoso, produzido por ELBA RAMALHO, todo em homenagem à grande mãe de todos nós, Maria, a cheia de graça. MILTON NASCIMENTO e FERNANDO BRANT fizeram a música representativa de todas as Marias do Brasil, na interpretação impecável de ELIS REGINA.

Mas é preciso ter manha

É preciso ter graça

É preciso ter sonho sempre

Quem traz na pele essa marca

Possui a estranha mania

De ter fé na vida…

Encontrei, no “N”, a “Nina” de DANIELA MERCURY e no “O”, Olga. Aqui, gosto de brincar com o “se você fosse sincera, ô, ô, ô, ô ORORA”, que o MUSSUM cantava, divertindo meio mundo. Andei mais, que esse post está ficando imenso, e cheguei no “P” de Patrícia, do CAETANO VELOSO.Resolvi seguir em frente, pois, no “Q”,não encontrei ninguém, indo direto para a próxima letra.

“R” lembra a “Rita Baiana”; uma personagem e tanto, diferente da outra, “A Rita”, que “levou seu retrato, seu prato, seu trapo, que papel!”

Das tantas “Rosas” desse país, a “Rosa de Hiroshima” lembra um momento triste da humanidade, mas hoje é dia de alegrias e eu fico aqui é com “A Rosa” safada, danada da gota, cantada por CHICO BUARQUE e DJAVAN.

A falsa limpou a minha carteira

Maneira, pagou a nossa despesa

Beleza, na hora do bom me deixa, se queixa

A gueixa

Que coisa mais amorosa

A Rosa….

No “S” todo mundo lembra-se de pedir “Oh!Suzana” não chore… Mas, legal mesmo é lembrar da cigana mais famosa dos últimos anos; de todo o povo querendo, junto com SIDNEY MAGAL, ver “Sandra Rosa Madalena” sorrir e cantar.

Ela é bonita, seus cabelos muito negros

E o seu corpo faz meu corpo delirar

O seu olhar desperta em mim uma vontade

De enlouquecer, de me perder, de me entregar…

Das cantigas de roda CHICO BUARQUE resgatou uma “Terezinha” que viveu grandes amores. Aqui, encontro “Tati”, a garota, e chego ao tango, esse maravilhoso e caliente ritmo. Tango, no “T”, só o “Tango pra Tereza” na voz de ANGELA MARIA, uma entre as grandes cantoras brasileiras de todos os tempos. Tem outra, a “Tereza da Praia”. Duas Terezas, urbanas, mas a “Cabocla Tereza”, de JOÃO PACÍFICO, é imbatível.

Senti meu sangue ferver

Jurei a Tereza matar

O meu alazão arriei

E ela fui procurar

Agora já me vinguei

É esse o fim de um amor

Essa cabocla eu matei

É a minha história, dotô!

No “U” também não encontrei nenhuma Úrsula ou similar. Em “V”, os talentosos JOÃO BOSCO e ALDIR BLANC contaram a história de “Violeta de Belford Roxo”, uma santinha que engravidou de um sargento, vizinho… Sem querer fofocar, fui para o “X” da Xica que manda, a “Xica daSilva” de JORGE BENJOR.

Pra ninguém me chamar de radical coloquei Diana, uma música estrangeira nesse abecedário. Não será a única. No “Y”, quem pode deixar “Yolanda” de fora?

Se alguma vez me sinto derrotado

Eu abro mão do sol de cada dia

Rezando o credo que tu me ensinaste

Olho teu rosto e digo à ventania

Yolanda, Yolanda

Eternamente, Yolanda

Chegamos ao “Z”, de ZEZÉ MOTTA, e a música que RITALEE fez para homenagear nossa atriz e cantora, que deu cara, voz e uma imagem definitiva para a “Xica da Silva”.  Ave, ZEZÉ MOTTA!

Esse abecedário não pretende ser completo. Antes de concluí-lo, outras músicas já aparecem, mas eu paro por aqui, mandando um beijo para todas as mulheres que permeiam minha vida, e a vida de todos nós.

Feliz dia Internacional da Mulher!

Beijos!

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Sete mil vezes Caetano Veloso

Impossível não reverenciar Caetano Veloso quando este grande, entre os maiores compositores brasileiros, completa 70 anos. O natalício será neste próximo dia sete de agosto. Difícil escrever algo novo sobre Caetano já que o mesmo, merecidamente, será homenageado pelos maiores intelectuais deste país; difícil também escrever para alguém que escreve tão bem! Mas, vamos lá, deixar o coração falar para homenagear alguém que, ao longo de tantos anos, propiciou momentos incríveis para milhões de brasileiros.

Claudia Cardinale e Brigitte Bardot
Todo mundo, como Caetano, sonhava com Cardinale e Bardot

A primeira música que emerge, quando penso em Caetano Veloso, fala de um amor arrebatador. Todavia, como a música brasileira é sempre presente em minha vida, inclusive em sala de aula, falar em primeira é falar em “Alegria, alegria”. Criança – eu tinha 9, 10 anos – pouco sabia que em música brasileira não se usava guitarra elétrica. A música daquele rapaz cabeludo da Bahia era contagiante; eu não usava nem lenço nem tinha documento e era, como todo garoto de então, apaixonado por Brigitte Bardot, com uma grande queda para Claudia Cardinale. Tudo era uma grande festa!

…Espaçonaves, guerrilhas

Em Cardinales bonitas

Eu vou

Em caras de presidentes

Em grandes beijos de amor

Em dentes, pernas, bandeiras,

Bomba e Brigitte Bardot…

A vida tratou de ensinar-me que Caetano Veloso era mais que “Alegria, Alegria”. Antes de completar 17 anos saí de casa pela primeira vez. Foram tempos conturbados para todo o país e eu, como o baiano de Santo Amaro da Purificação, também tive que vir embora. “No dia em que eu vim-me embora” a canção de Caetano Veloso e seu parceiro Gilberto Gil, é trilha profunda para o retirante que sou.

…E quando eu me vi sozinho

Vi que não entendia nada

Nem de por que eu ia indo

Nem dos sonhos que eu sonhava…

Caetano Veloso foi embora para Londres onde criou “London, London”, uma das mais belas canções com a capital inglesa como tema, e voltou para um Brasil de sempre, com “podres poderes” que demoraram a tomar rumo. Longe de Uberaba fui ao primeiro show daquelas quatro figuras mágicas, então denominadas “Doces Bárbaros”: Gal Costa, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Maria Bethânia. Quem é da minha geração pode entender qual o impacto de, em um mesmo palco, encontrar quatro imensas feras da nossa música. Isso em uma época onde não rolavam festivais de verão e similares. No show, no disco, o aprendizado que persigo e que pretendo seguir enquanto vivo:

O seu amor

Ame-o e deixe-o livre para amar…

Ame-o e deixe-o ir aonde quiser…

Ame-o e deixe-o ser o que ele é…

Alguém importa quando importa para a vida de muita gente. É o caso de Caetano Veloso que, creio, seja autor de canções para a vida da maioria dos brasileiros. Desde o primeiro disco o compositor, também excelente cantor, jamais fugiu de suas raízes populares. Gravou Vicente Celestino com o mesmo respeito que gravou Chico Buarque; fez sucesso com canções de Peninha, Roberto Carlos e atualmente segue em parceria nos palcos, ao lado de Maria Gadu.

Caetano Veloso 70 anos

Poderia alongar-me aqui e escrever sobre a trilha sonora de “Velhos Marinheiros”; a adaptação do romance de Jorge Amado foi para os palcos de São Paulo, com uma trilha baseada em Caetano Veloso; meu amigo Ivan Feijó participou deste trabalho e corrigiu-me a memória (vejam no comentário abaixo). No espetáculo teatral dirigido por Ulysses Cruz, Ivan contribui com as canções de Vicente Celestino. Poderia escrever sobre as inesquecíveis aulas de Dirce Ceribeli, na UNESP, introduzindo semiologia através das letras das canções do compositor. Poderia contar um monte de histórias; várias delas com “Eclipse Oculto” como tema.

Nosso amor não deu certo

Gargalhadas e lágrimas

De perto fomos quase nada

Tipo de amor que não pode dar certo

Na luz da manhã

E desperdiçamos os blues do Djavan…

Tantas histórias de tantas vidas com a música de Caetano Veloso ali, presente; marcando acontecimentos, tornando pessoas inesquecíveis. As canções são sempre novas para quem não as conhece. Tornam-se vivas e tornam vivas as pessoas, mesmo que o tempo tenha ficado longe demais. Muitas histórias, mas hoje é segunda-feira…

– Vamos trabalhar!

Então, deste humilde blog quero desejar outros 70 anos ou setenta mil vezes setenta para Caetano Veloso. Penso que basta uma música para fazer célebre um grande compositor. Sou contra cobranças ou exigências de novas canções, novos sucessos, outra “Sampa”. Cada pessoa tem sua preferência e, em se tratando de Caetano Veloso, esse leque é bastante amplo. Eu prefiro “Sete mil vezes”. Feliz de quem pode amar e, para esse amor, tomar emprestada a música e a letra de Caetano Veloso para soltar o gogó….

Sete mil vezes eu tornaria a viver assim
Sempre contigo transando sob as estrelas
Sempre cantando a música doce
Que o amor pedir pra eu cantar
Noite feliz, todas as coisas são belas
Sete mil vezes, e em cada uma outra vez querer
Sete mil outras em progressão infinita…

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Feliz aniversário, Caetano Veloso!

Boa semana para todos!

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Para os melhores amigos…

As melhores canções. Não dá pra escolher uma, porque há muitas e todas são emocionantes. Cada um tem a sua preferida e neste post estão aquelas que me ocorrem sempre quando penso nos meus grandes amigos (todos eles são melhores!)…

Para ler este post, seja manhã, tarde ou noite, clique aqui para ouvir Abílio Manoel. A canção é a inspiração básica para entrar no clima e relembrar outras sobre amizade. “Bom dia, amigo” é uma composição interpretada pelo autor, Abílio Manoel. Cantei muitas vezes essa música com grupos de criança e ao pensar esse texto, foi inevitável relembrá-la. Então, clique e deixe o som de fundo para continuar a ler.

Um lugar assim, para conviver com meus amigos.

Algumas canções são tiro e queda quando o tema é amizade. Em qualquer lista aparece, sem delongas, “Canção da América”, de Milton Nascimento e Fernando Brant. Quem pode negar que “Amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito”? O mais difícil desta música é escolher entre a interpretação de Elis Regina (clique para ouvir) e a do próprio Milton Nascimento; mas, essa é outra questão.

Outra que não falta em uma provável lista também é figurinha carimbada, presente em todo e qualquer boteco onde cantar ainda é possível: “Amigo é Pra Essas Coisas”, composta por Silvio da Silva Jr. e Aldir Blanc. Um diálogo transformado em sambinha dos bons;  marcou toda uma geração que sabe que “tua amizade basta” e que “o apreço não tem preço”. A interpretação do MPB-4 é imbatível.

Amigo que é amigo escuta, atentamente, todas as nossas agruras amorosas. Quando apaixonados, se o amor está em crise, diante de uma nova paixão, encucados por uma desavença, só mesmo um amigo pra nos ouvir. Para amores complicados Roberto Carlos e Erasmo Carlos criaram uma verdadeira obra-prima: “Amiga”. Originalmente a música foi criada especialmente pelo desejo de Roberto Carlos gravar com Maria Bethânia. Veja-os, em 1982.

Shangrila, para sonhar um lugar ideal para grandes amigos.

Foi nos anos 80 que Djavan criou “Nobreza”. Talvez a mais bela canção para a amizade verdadeira entre dois homens. Os versos são ousados para ouvidos conservadores e, provavelmente por isso, a música não é tão comum em bares e similares. É difícil para a maioria dos rapazes, mesmo diante do melhor amigo, cantar “uma bela amizade é assim: dois homens apaixonados…” Talvez um dia a coisa mude de rumo; mas que é uma belíssima música, é só ouvir e comprovar.

Chico Buarque, o melhor de todos os nossos compositores, criou com Francis Hime “Meu Caro Amigo”. É uma carta em forma de chorinho, para soltar o gogó amaciado por uma boa cerveja. E como amigo verdadeiro assume a família do outro, “a Marieta manda um beijo para os seus, um beijo na família, na Cecília, nas crianças…”

Se você chegou até aqui já leu minhas escolhas para a música preferida sobre amizade. Sinta-se livre para indicar outra fora desta relação, que talvez eu não conheça ou tenha deixado de fora. Caso indique outra, não deixe de mencionar os autores. Eles merecem.

Nosso Lar, para viver todas as vidas com meus amigos

A vida me presenteou com amigos incríveis – muitos! – só entendo uma música para expressar o que sinto por meus amigos; é a canção que escolhi para concluir este, na voz suave e inesquecível de Mercedes Sosa: Los Hermanos, de Atahualpa Yupanqui. Se você é realmente meu amigo, esta canção é pra você.

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Bom final de semana!

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Até!

Bethânia, oásis da música brasileira

O lançamento do 50º álbum de Maria Bethânia celebra a carreira de uma das mais importantes cantoras da nossa história. “Oásis de Bethânia” é o título do novo trabalho, que tem na capa uma imagem do semi-árido brasileiro, em pleno sertão nordestino. Para a imprensa justificou a capa: “- Preciso lembrar que existe esse lugar no meu país. Isso me coloca do tamanho que eu sou”. Essa é a Bethânia, a mulher admirável, a mulher brasileira.

Ouvindo as dez faixas do cd,  reforço a certeza de que a discografia de Maria Bethânia sintetiza toda a música do país. Não é exagero afirmar que conhecer Bethânia é conhecer nossa música. Nos discos da cantora todos os ritmos, todas as regiões, todos os maiores compositores de nossa história. De Noel Rosa a Chico Buarque, Bethânia, que lançou em disco o irmão Caetano Veloso, canta Pixinguinha, Dorival Caymmi, Ari Barroso, Herivelto Martins, Lupicínio Rodrigues, D. Ivone Lara, Joyce, Edu Lobo, Alceu Valença…

Poxa, são 50 álbuns. A lista desse Oásis de qualidade que é a carreira de Maria Bethânia cabe muito mais nomes. De Luiz Gonzaga a Gonzaguinha, tem também Djavan, Gilberto Gil, João Bosco e Aldir Blanc, Milton Nascimento, Roberto Mendes, Roberto Carlos e Erasmo Carlos, Haroldo Barbosa, Moraes Moreira, Dominguinhos e, que me perdoem todos os outros, vou encerrar essa lista primária com Vinícius de Moraes e Tom Jobim.

Além dos maiores compositores brasileiros, Maria Bethânia celebrou, em seus discos, as grandes cantoras do país, sempre respeitosamente reverenciadas por ela. As duas cantoras mais presentes em seus discos são Gal Costa e Dalva de Oliveira. Com a amiga Gal, muitas gravações em dupla, com sucessos memoráveis, como “Sonho Meu”. De Dalva, Bethânia resgatou boa parte do repertório da mais notável cantora da era do rádio; inclusive no presente álbum, Dalva de Oliveira é lembrada através de “Calúnia” (Marino Pinto e Paulo Soledade).

Muitas outras cantoras estão nos discos, álbuns ou DVDs de Maria Bethânia. Nara Leão, Alcione, Miúcha, Sandra de Sá, Wanderléa, a cubana Omara Portuondo, a francesa Jeanne Moreau, Dona Ivone Lara e, entre muitas outras, Ângela Maria e a divina Elizeth Cardoso. Como fez com Dalva de Oliveira, Maria Bethânia relembrou em outros discos as canções de Aracy de Almeida, Carmen Miranda, Maysa, Isaura Garcia, Elis Regina…

Minha cantora preferida é incansável. Além dos próprios discos, Bethânia produziu outras cantoras, como D. Edith do Prato e a jovem Martinália e prepara, para breve, um Songbook com oito CDs dedicados à obra de Chico Buarque. Este sempre esteve nos discos da cantora. No atual, ela gravou “O Velho Francisco” com Lenine, um dos grandes momentos do álbum. Apesar de tudo o que já gravou de Chico Buarque, Maria Bethânia quer mais. Pretende abordar todas as diferentes faces do grande compositor brasileiro.

O trabalho constante de Maria Bethânia é o que faz da “Senhora do Engenho” a menina baiana que roda a saia pelos palcos do mundo todo, com uma graça e presença inconfundíveis. Estou, propositalmente, falando pouco sobre o atual disco, pois o lançamento do 50º álbum de Maria Bethânia é fato para lembrar aspectos de uma carreira brilhante, única.

Oásis é onde o caminhante do deserto mata a sede. Oásis é o lugar agradável, paradisíaco, pleno de água e sombra e conforto. O “Oásis de Bethânia” é a caatinga nordestina, o pampa gaúcho, a chapada mineira, a mata e o sertão brasileiro. A obra de Bethânia é o oásis de qualidade das nossas canções.

Maria Bethânia incomoda muita gente. Quando todo mundo engole, economiza palavras, Bethânia nos brinda com a poesia de Fernando Pessoa, Castro Alves e torna populares os densos temas de Clarice Lispector. Incomoda, porque enquanto incontáveis artistas se rendem as leis de consumo, Bethânia grava Villa Lobos, revive Catulo da Paixão Cearense, e torna populares os pontos de Oxossi, Iansã.

Enfim, se milhares de brasileiros entregam-se a uma aposentadoria precoce, vivendo apaticamente em função de um copo de cerveja, um jogo de futebol ou um ordinário programa de televisão, de outro lado, uma jovem senhora baiana,  de 65 anos, nos dá claros sinais de que está longe de parar. Gravou o 50º e prepara oito novos álbuns para o próximo ano. Depois; bom, depois virão outros e mais outros e, tomara, muitos outros!

Que bom poder beber no seu Oásis, Maria Bethânia!

Bom final de semana!

Maria Rita navega em águas seguras

O novo disco da cantora, “Elo”, mantém aposta no estabelecido

Capa do Novo Disco

O primeiro trabalho de Maria Rita veio com composições de Milton Nascimento, Rita Lee, Lenine e Zélia Duncan. Compositores mais jovens, da geração da cantora, estiveram presentes através de Marcelo Camelo.

No disco seguinte, “Segundo” uma novidade, Rodrigo Maranhão, o autor de “Caminho das águas” e mais gente consagrada: Marcelo Camelo, Edu Lobo e Chico Buarque, Marcelo Yuka.

Em “Samba Meu”, no terceiro disco da cantora, o samba foi de Arlindo Cruz, presente em seis canções. Ainda teve Gonzaguinha e outros bons sambistas cariocas.

Visto assim, a impressão é que ousadia não caracteriza a carreira da cantora. E ao que indica o quarto disco, “Elo”, Maria Rita continua aposta na segurança, no estabelecido. Chico Buarque, Caetano Veloso, Rita Lee,  Djavan e Marcelo Camelo. Entre os compositores mais jovens estão os filhos de grandes músicos, como Davi Moraes, Pedro Baby e Daniel Jobim.

Pedro é filho de Baby do Brasil e Pepeu Gomes; Daniel é neto do maestro Tom Jobim. Uma parceria de ambos, “Pra matar meu coração” é a primeira música do disco que está sendo divulgada. O lastro, na retaguarda, vem de canções como “Menino do Rio” (Caetano Veloso) e “A história de Lily Braun” de Chico Buarque e Edu Lobo (a relação completa esta abaixo).

E é assim, navegando em águas seguras, garantida em regravações de grandes sucessos, que Maria Rita distancia-se da sombra e da carreira da mãe, Elis Regina. A trajetória de Elis foi marcada por ousadia, gerando em todos a curiosidade em saber qual seria o compositor da vez a ser lançado pela maior cantora do Brasil. Ao contrário, Maria Rita já cantou a maioria das canções deste quarto disco, experimentando a “aceitação do produto”, como é hábito do marketing contemporâneo. Quem segue a carreira da moça conhece as canções, na voz da própria, em shows e programas de tv.

Ah, Maria Rita, é preciso prestar atenção no que sua mãe cantava. Uma canção de um colega dela, consagrado por si próprio e também na voz dela. Um cara que revolucionou a música brasileira, Gilberto Gil, que então escreveu em “Oriente”:

…Considere, rapaz 
A possibilidade de ir pro Japão 
Num cargueiro do Lloyd lavando o porão 
Pela curiosidade de ver 
Onde o sol se esconde 
Vê se compreende 
Pela simples razão de que tudo depende… 

Ah, como é bom quando nossos artistas surpreendem, tirando-nos da mesmice!

Boa sexta-feira para todos!

Nota:

As canções do disco “Elo”

1. Conceição dos Coqueiros (Lula Queiroga, Lulu Oliveira e Alexandre Bicudo)
2. Santana (Junio Barreto e João Carlos Araújo)
3. Perfeitamente (Fred Martins e Francisco Bosco)
4. Coração a Batucar (Davi Moraes)
5. Menino do Rio (Caetano Veloso)
6. Pra Matar meu Coração (Pedro Baby e Daniel Jobim)
7. A História de Lily Braun (Chico Buarque e Edu Lobo)
8. Nem Um Dia (Djavan)
9. A Outra (Marcelo Camelo)
10. Só de Você (Rita Lee e Roberto de Carvalho)
11. Coração em Desalinho (Mauro Diniz e Ratinho)