A ação do Grupo Silvio Santos contra o Teatro Oficina – fechando um dos acessos com uma parede absurda – diz bem do tal grupo e do sujeito que lhe dá nome. Atrás de sorrisos profissionais e de ações para seduzir clientes, esses seres buscam avidamente o poder, perpetuar-se nele através do dinheiro. O cara está com 93 anos, mas tem ganância e herdeiros. E é para esses que ficarão os frutos dessa ação tenebrosa contra um bem cultural brasileiro.
Note-se que a concorrência está silenciosa, muda. A premissa dos grandes grupos de comunicação é a cumplicidade, o corporativismo descarado. As reações ficam por conta de pessoas e grupos de pessoas interessadas no Teatro Oficina, no Bixiga, em defesa do bem coletivo. Aqueles que lutam pelo Parque, com certeza um grande bem para o bairro e adjacências.
Um dos aprendizados mais difíceis, creio, é entender o bem cultural, o bem público como primeiramente propriedade INDIVIDUAL e, concomitante, COLETIVA. O teatro, a biblioteca, a praça, o bosque, o museu, as árvores nas ruas e avenidas, a escola, a universidade, o posto de saúde, o hospital… Tudo isso é primeiramente do indivíduo. MEU, para ser mais claro. E do outro, o tal próximo do amor dito pelo Cristo.
Sou eu o principal beneficiado por me sentar à sombra de uma árvore de frente para o mar, e também o que aprende quando pega um livro na biblioteca, assiste um filme, vê uma peça. Tudo pertence a todos os seres humanos, iguais em deveres e direitos. Pode-se não utilizar um ou mais entre esses itens, mas é impossível viver sem todos eles.
É bom notar também que todas os bens citados acima são frutos de AÇÕES COLETIVAS, do TRABALHO COLETIVO. Faço questão de exemplificar usando a ESCOLA: Há um espaço que foi destinado para receber pedreiros, serventes, que usando materiais fabricados em olarias, metalúrgicas, marcenarias e mais uma infinidade de produtores dos materiais necessários para colocar um prédio escolar de pé. Na formação de cada profissional – professores, coordenadores, pedagogos, bibliotecários, faxineiros, jardineiros, entra outra imensa relação e, assim, liga-se o mundo no COLETIVO. A tinta que colore o cabelo do cidadão citado acima tem processo similar, fruto de uma imensa cadeia de trabalhadores que, juntos, produzem a coisa.
INDIVIDUAL no prisma dessa reflexão básica é a ideia de propriedade. Aquele que paga, que adquire, que toma posse de algo ignora a longa cadeia de trabalho e construção conjunta para cada produto manipulado pelo ser humano. O craque do futebol não deve esquecer o processo de obtenção do couro e da fabricação da bola e o nadador carece de quem constrói a piscina. O pintor não fabrica telas e tintas, nem cavaletes e o cantor nada sabe da construção de um microfone, uma caixa de som. Tudo é resultado da ação da coletividade. O respeito pelo trabalho humano vem daí.
Desconsiderar e desrespeitar a construção coletiva que leva a fatos como a agressão ao Teatro Oficina. Há anos, no distante e espaçoso palacete onde vive, que o cidadão de bem ignora a Bela Vista enquanto lugar de gente, querendo enfiar goela abaixo dos moradores mais um shopping. Durante um certo tempo o SS investiu no Teatro Imprensa, tendo a filha capitaneando produções infantis. Uma ninharia de resultado financeiro se comparado a um shopping, ou ao banco da família plantado no mesmo quarteirão do Imprensa.
Não basta o canal de tv, o banco e sabe-se lá quanto mais. O sujeito resolveu ganhar um pouco mais e o Teatro Oficina, em meio a terreno do cidadão, foi o entrave. Das longas brigas entre Silvio Santos e José Celso Martinez Corrêa, falecido criador do Oficina, constam registros do quanto é abjeta a postura do dono do SBT, que deixou em vídeo a ameaça de transferir a Cracolândia para as imediações do teatro. Ele tem dinheiro para fazer isso. E Zé Celso tinha a comunidade a seu lado, ou aqueles que têm noção do que seja bem coletivo. O Oficina é de cada cidadão que preza pela cultura, pela história do teatro brasileiro e pela cidade de São Paulo. O Oficina é meu!
Percebi através da obra de Domênico de Masi a importância da ideia de ser o dono do MASP, o proprietário da Avenida Paulista, da Biblioteca Mário de Andrade e por aí vai. Tudo é meu! Tudo é do Próximo. Tudo é nosso! E cito o nosso por último, pois careço da comoção geral ante uma perda, ante um fato desrespeitoso. Um cara não pode murar minha casa, destruir meu teatro! A cilada do “nosso” é deixar para o outro a luta, a briga, a palavra pesada contra esse cidadão que não respeita ninguém. E se não tenho o mesmo poder de briga, vou para a ação individual que é ignorar o SBT, Jamais adquirir qualquer coisa da Jequiti, assim como tudo o mais que se refere à Liderança e Capitalização. Essa ação, pequena, pode ser feita por você, se leu até aqui. Sendo pequena, não basta para resolver a questão. Por isso mesmo vamos ao coletivo, apoiando todas as ações do pessoal do Teatro Oficina Uzyna Uzona.
Bora lutar!
Obs. As duas primeiras imagens são do Instagram do Teatro Oficina. A terceira é do meu arquivo pessoal.