
Quando prestamos atenção percebemos que a vida está sempre nos sinalizando, lembrando-nos nosso verdadeiro tamanho, o papel que temos perante o mundo e, mais raro, até nos lembrando do que nos trouxe até aqui, nesse velho e bom planeta terra. Se falharmos na atenção, é freqüente, o aviso soa mais contundente e os problemas aparecerão. O melhor é que o remédio para tais problemas são tão conhecidos! Dormir bem, tomar refeições saudáveis e, além do corpo, alimentar a alma.
Carecendo de afago na alma atendi, com prazer, convite de amigos para ver o Concerto de Verão que abriu a temporada de 2013 da Orquestra Sinfônica de Santo André. A regência foi de Carlos Eduardo Moreno e o repertório prestou uma homenagem à música brasileira de concerto com obras de Camargo Guarnieri, Lorenzo Fernandes, Villa-Lobos, Cyro Pereira e Neymar Dias.
Auditório lotado, com lugares extras para acomodar tanta gente interessada. Mais uma vez confirmo o que já sei: basta um programa interessante para que as pessoas abandonem a mesmice televisiva. O problema é que poucas cidades brasileiras possuem boas salas de espetáculo e é muito menor o número dos municípios que mantêm uma orquestra sinfônica.
Nada melhor para apurar o ouvido do que uma bela orquestra; discernir, na harmonia de cada peça musical os instrumentos participantes; cada músico como pequena, mas vital parte do todo. Habituados a violinos, flautas, fagotes, clarinetas, harpas; de repente, aparece uma viola caipira. Entre os consagrados Camargo Guarnieri e Villa-Lobos, a Orquestra Sinfônica de Santo André apresentou o jovem Neymar Dias, um virtuose da viola caipira e compositor de talento. No programa da noite, a orquestra apresentou o Concertino em 3 movimentos para viola caipira, com o próprio compositor como solista.
Nada mais brasileiro que uma viola caipira; o som limpo, suave e denso, remete à pureza, simplicidade. A platéia ficou hipnotizada sob o som da música de Neymar Dias. Técnica impecável, interpretação segura, o jovem músico foi efusivamente aplaudido e brindou a platéia com um bis onde lembrou Tião Carreiro, Piraci e Lourival Santos, tocando “Rio de Lágrimas”. Essa música é popularmente lembrada como “Rio Piracicaba”, presente nos versos da canção:
O rio de Piracicaba
Vai jogar água pra fora
Quando chegar as águas
Dos olhos de alguém que chora…
A viola de Neymar Dias lavou minha alma, tornando-a leve. Os acordes extraordinariamente executados, na mais pura e perfeita tradição do violeiro que foi Tião Carreiro soaram trazendo de volta um Brasil da minha infância, lembrando-me Uberaba, meu pai, toda a minha família. Tudo indica que, pela forma como foi aplaudido, o músico alcançou a platéia tanto quanto me senti atingido. A viola caipira de Neymar Dias quebrou todas as distinções entre o erudito e o popular, exaltando o que interessa: a boa música.
Domingo em casa, ainda sob os efeitos da boa música. Fica fácil dispensar as desgraças televisas ou a inutilidade de outros programas. Se é mesmo fundamental dormir bem, tomar refeições saudáveis e alimentar a alma, a digestão espiritual pede silêncio, recolhimento. A vida fica mais fácil, melhor, calma com o som de viola caipira, de harpa, oboé, tímpanos, contrabaixos… Bem que outras cidades seguissem Santo André e também propiciassem aos seus munícipes uma boa orquestra. Seríamos um Brasil melhor.
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Boa semana para todos.
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Veja aqui um vídeo onde Neymar Dias lembra canções de Tião Carreiro.
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