CANTOS E CONTOS DO RIO PARAÍBA DO SUL

Após levar montagens com textos que abordam a história e as características de cada cidade o Projeto Arte na Comunidade volta aos mesmos locais com um segundo texto. “Cantos e contos do Rio Paraíba do Sul” é a montagem, como o próprio título indica, sobre a região visitada e o mesmo texto foi apresentado nas cidades contempladas pelo projeto.

Conrado Sardinha, Luciana Fonseca e Rodolfo Oliveira voltaram a Cruzeiro, Lavrinhas e Queluz, onde verificaram os resultados da primeira visita (Quando solicitaram dos alunos narrativas próprias sobre as cidades) e também convidaram os mesmos para o encerramento, ocorrido em locais públicos de cada município.

“Cantos e Contos do Rio Paraíba do Sul” resgata lendas, fatos históricos e culturais da região, além de alertar para a necessidade da preservação ambiental. Escrito e dirigido por Valdo Resende, a direção musical é de Flávio Monteiro e os figurinos de Carol Badra.

Idealizado por Sonia Kavantan, o Arte na Comunidade 4 foi patrocinado pela Alupar, Taesa e apoiado pelas Usinas Queluz e Lavrinhas. Uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.

Havendo interesse em reproduzir o texto ou interpretá-lo, é necessária a citação do motivo pelo qual o texto foi escrito e a autoria do mesmo.

CANTOS E CONTOS DO RIO PARAÍBA DO SUL

Original de Valdo Resende

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Luciana Fonseca e, acima, Rodolfo Oliveira e Conrado Sardinha. Foto: Atelier da Fotografia

(CARACTERIZADO BASICAMENTE TAL QUAL NA APRESENTAÇÃO ANTERIOR O ATOR ENTRA CANTANDO A MÚSICA DE ABERTURA; CAMINHANDO POR ENTRE O PÚBLICO DEVERÁ SEMPRE QUE POSSÍVEL RESGATAR ELEMENTOS DA PRIMEIRA APRESENTAÇÃO).

Vamos brincar de teatro…

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Luciana Fonseca e a letra da música de abertura. Foto: Atelier da Fotografia

Meus amigos: Voltei! Que bom estar novamente com vocês. Fazer teatro na própria cidade para os parentes, os amigos, os conhecidos é muito bom. Eu andei por toda a cidade, em várias escolas. Vou repetir meu nome; gosto que guardem o meu nome. Sou… (ADRIANO, CHICO ou PEDRO) e desta vez estou de volta para contar outros fatos, outros contos e cantos, agora da nossa região. Vamos brincar de teatro e o tema da nossa apresentação é o Vale do Paraíba, a Serra da Mantiqueira, as outras cidades do Vale. Vai ser muito legal. Vamos nessa? Quem já aprendeu a canção pode cantar comigo:

(CANTA APENAS O REFRÃO)

Vamos brincar de teatro…

Eu já andei muito por aí, nesse mundão de Deus. Fazendo peças de teatro, escrevendo e recitando meus versos. Vi muitos lugares bonitos, cidades encantadoras, regiões inteiras de uma beleza intensa, exuberante. Viajei pelo planalto, pela caatinga, pelo serrado, por florestas fechadas… Conheci as chapadas de Minas Gerais, o pantanal de Mato Grosso, nossas praias de norte a sul! Mas, nada supera o meu vale. O nosso Vale do Paraíba! É bem verdade que minha opinião é tendenciosa; como dizem por aí, cada um puxa a sardinha para a sua lata, não é mesmo? Mas, como não gostar daqui?

Eu sempre gostei de contar as histórias da nossa cidade e da nossa terra. Sempre que me perguntavam: – Onde fica a sua cidade? E pra fazer mistério, para acentuar a magia da nossa região eu respondia: – Sou das terras da A-man-ti-kir! Ninguém entendia nada e eu completava: A-man-ti-kir, a serra que chora. E escolhi contar tudo através do teatro. Em teatro, já sabem, não é, a gente pode ser tudo o que quiser!

(VINHETA. O ATOR CONTARÁ A LENDA DA MANTIQUEIRA INTERPRETANDO VOCALMENTE TODAS AS PERSONAGENS. CHAMARÁ QUATRO CRIANÇAS E ENTREGARÁ, A CADA UMA, ADEREÇOS MÍNIMOS PARA CARACTERIZAR AS PERSONAGENS. O ATOR DISTRIBUIRÁ AS QUATRO CRIANÇAS PELO PALCO, FACILITANDO O ENTENDIMENTO DO PÚBLICO).

Para contar a história da A-man-ti-kir, vou precisar de quatro crianças. Dois meninos e duas meninas. Quem quer brincar comigo?  (APÓS ESCOLHER AS CRIANÇAS). Bom, fiquem atentos, cada um aqui é um personagem e eu vou contar a história e vocês ilustrarão, com o corpo e as expressões de vocês. Vamos começar.

(ENTREGANDO ADEREÇOS PARA CADA CRIANÇA)

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Conrado Sardinha prepara criança para brincar de teatro. Foto: Atelier da Fotografia

(UM PEQUENO COCAR PARA UMA MENINA) – Você é uma indiazinha. (PARA A PLATEIA). Guardaram? Ela é uma índia da tribo tupi.

(UMA TESTEIRA DOURADA PARA UM GAROTO) – Você será o sol. O nosso rei dos astros. Um sol brilhante e forte!

(UMA TESTEIRA BRANCA PARA UMA MENINA) – Você será a Lua! Nosso satélite que enfeita o céu deixando-o claro, bonito.

(UM PEQUENO COCAR VERMELHO PARA UM MENINO) – E você, com esse cocar vermelho, será Tupã, o Deus poderoso dos índios. Deus tupã!

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“O sol” observa “Tupã” sob o comando de Rodolfo Oliveira. Foto: Atelier da Fotografia

Agora, vamos começar a história. (APROXIMA-SE DE CADA CRIANÇA, NA MEDIDA EM QUE CRIA AS VOZES DE CADA PERSONAGEM. O TOM DA CENA DEVE SER FARSESCO, ACENTUANDO A BRINCADEIRA DO FAZER TEATRAL. O ATOR, SEMPRE QUE POSSÍVEL, ORIENTARÁ AS REAÇÕES E EXPRESSÕES DE CADA CRIANÇA).

ÍNDIA – Olá! Eu sou uma indiazinha tupi. Sou muito linda e gosto de brincar com as flores e com os pássaros. Ultimamente tenho ficado um pouco triste. É que estou apaixonada. Muito apaixonada. Super apaixonada! #apaixonada!

(O ATOR VOLTA A SER ELE MESMO ENQUANTO CAMINHA PARA O SOL)

ATOR – #apaixonada! Será que essa indiazinha tem whatsApp? Eu, hein. Vai saber, não é? Vamos ao outro personagem, o sol!

SOL – Olhem para mim! Vejam como sou… Amarelo como o ouro, gostoso como o amarelo mel! Todos admiram minha grandeza e ficam amarelados perante minha força. Meus raios são amarelos fantásticos!

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Conrado Sardinha orienta criança que faz “o sol”. Foto: Atelier da Fotografia.

ATOR – (VOLTANDO PARA A ÍNDIA) Esse sol é modesto como ele só!

INDIA – Oh, como sou infeliz! Oh, de que me adianta ter os cabelos negros lindos, boca carnuda linda se o sol, por quem estou apaixonada, nem me enxerga. Oh! Estou apaixonada pelo sol e ele nem me percebe, não sabe que eu existo. Oh, mundo cruel!

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Conrado Sardinha observa menina que faz “a lua”. Foto: Atelier da Fotografia.

ATOR – Coitadinha! A menina passava horas e horas olhando para cima e nada de o sol percebê-la! Que bobo! Uma indiazinha tão linda! Acontece que, um dia – sempre tem um dia nessas histórias – o sol percebeu a menina e… Ficou ligado na garota! Enfeitiçado pela doce indiazinha. Ficou tão apaixonado que resolveu não sair mais do alto do céu, só pra permanecer olhando a menina. Imaginem! O sol, parado no centro do céu, lá de cima namorando a menina! Os outros índios da aldeia, os animais, os seres todos não entendiam a falta da noite? Onde a noite tinha ido parar? Acontece que mais alguém estava apaixonada pelo sol! A lua! (APROXIMA-SE DA CRIANÇA QUE FAZ A LUA).

LUA – Ai que ódio! Que ódio, que ódio, que ódio! Esse solzinho ousa me desprezar! E pior, me trocou por essa indiazinha borocoxô.

ATOR (QUEBRANDO A CENA). Borocoxô? Que palavra antiga, dona lua! Assim a senhora entrega a sua idade. Ninguém mais por aqui sabe o que é borocoxô (VOLTA RAPIDAMENTE PARA A MENINA QUE FAZ A LUA).

LUA – Indiazinha chata foi o que eu quis dizer. E agora tenho que ficar aqui, no canto, porque o sol bobão não sai do alto do céu. Vou reclamar para Tupã, eles vão ver o que é bom pra tosse! (APROXIMANDO-SE DO MENINO QUE FAZ TUPÃ). Tupã, vê se pode, ele fica lá no céu, aquela indiazinha na terra, um chove não molha, e acabaram-se as noites, todas as noites! Como os animais vão descansar? Como as pessoas poderão dormir? Está tudo secando. Esturricando de tanto sol! Ah, eu tentei falar com ele e ele disse que nem Tupã, nem você, Tupã, tira ele de lá!

ATOR – Luazinha ciumenta. Venenosa. Tupã não deixou por menos.

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Um “tupã” feliz ao lado de Rodolfo Oliveira. Foto: Atelier da Fotografia

TUPÃ – Acordem nuvens negras! Acordem raios enraivecidos! Escureçam todo o céu. Tirem o sol para lá! Vou criar, com minhas mãos de Deus, a montanha mais alta que já existiu! Apareça! Grande montanha! Enorme, imensa!E vou colocar essa indiazinha lá dentro, longe dos olhos do sol. E resolvo essa situação.

ATOR – (REUNE AS QUATRO CRIANÇAS PERTO DE SI) Pobre indiazinha! O que poderia fazer contra Tupã, a Lua? Lá, dentro da imensa serra criada por Tupã só fazia chorar. Chorou tanto, mais tanto, que suas lágrimas alcançaram o topo da serra e desceram, formando rios e mais rios por todo o vale. Foi assim que surgiu A-man-ti-kir, a serra que chora. A-man-ti-kir, que todos chamamos Mantiqueira! E assim termina nossa história. Palmas para nossos atores! (AGRADECE AS CRIANÇAS, CONDUZINDO-AS DE VOLTA A SEUS LUGARES).

Linda a lenda de como surgiu a Serra da Mantiqueira, vocês não acham? Nas minhas apresentações teatrais essa lenda interessa a todos, pois todos ficam encantados com a grandiosidade e beleza da nossa Mantiqueira.

Vocês sabiam que a Mantiqueira tem 500 quilômetros de extensão? E que dos dez pontos mais altos do Brasil, quatro estão aqui, na nossa serra? Todavia, esses números todos que dizem respeito ao complexo imenso da Mantiqueira não são mais importantes que um único pôr de sol. Nós, que somos daqui, somos presenteados constantemente com imagens mágicas, fantásticas, o melhor show que a natureza pode oferecer.

Eu já estive lá em cima, à noite, acampando em noite de lua cheia. O nosso vale é tão lindo e as nossas cidades, iluminadas, parecem o céu na terra, cheio de estrelas reunidas em grupos, cada grupo indicando uma localidade. Cruzeiro, Lavrinhas, Queluz, Lorena, Aparecida, Taubaté…

Uma noite de lua muito clara, lá de cima, todos nós conseguíamos ver o Rio Paraíba, serpenteando pelo Vale. Nosso belo rio Paraíba do Sul não nasce na Serra da Mantiqueira; ele vem de outro lado, a Serra da Bocaina que, por sua vez, é parte da Serra do Mar. Para que os colonizadores chegassem até aqui tiveram que subir a Serra do Mar e para irem atrás do ouro, em Minas Gerais, tiveram que atravessar a Mantiqueira. Nosso Vale do Paraíba ali, entre duas serras.

A história do Vale do Paraíba ganha dimensão mundial, mundial mesmo, no período em que o Brasil não só exportava café para o mundo todo; nosso país era o maior produtor de café e as primeiras fazendas mais importantes estavam aqui, no Vale do Paraíba. O nosso ouro, a nossa riqueza veio primeiramente do café.

(CANTA A CANTIGA “O CAFÉ”)

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Cantiga de roda e também de trabalho: “O Café” foi um dos resgates do Arte na Comunidade.

Uma reviravolta mundial ocorreu em 1929, quando a bolsa de valores de Nova York caiu, fazendo cair os preços das mercadorias em praticamente todo o mundo. O café, que valia ouro, passou a valer muito pouco e como tínhamos grandes estoques tivemos que queimar o café que não conseguimos vender. Muitos fazendeiros ficaram arruinados, mas logo em seguida se levantaram, extraindo madeira das encostas da serra, cultivando cana de açúcar e, depois, com o passar dos anos, valorizaram a pecuária leiteira, da qual fomos grandes produtores. Café, madeira, cana, leite! É muita riqueza!

Se a gente prestar atenção vai perceber que toda a riqueza da nossa região está ligada aos nossos rios. Todo o nosso vale é amplamente irrigado por água doce.

Podemos dizer que a vida das pessoas, habitantes do Vale do Paraíba, está intimamente ligada aos rios, cachoeiras, córregos; há histórias, muitas histórias envolvendo nossa gente e os rios. Há verdadeiras, aquelas que estão registradas nos livros e na lembrança das pessoas e há também outras, que aconteceram no imaginário de alguns criadores que, contando fábulas e lendas para os filhos, netos, amigos, enriqueceram a imaginação de todos.

É daqui, do Vale do Paraíba, que as histórias do Saci, do Caipora e da Cuca, entre muitos outros seres, saíram para ganhar páginas de livros, as telas do cinema e da televisão (PEGA O LIVRO CONTOS E LENDAS DE UM VALE ENCANTADO, DE RICARDO AZEVEDO). Algumas estão aqui, neste livro. Histórias contadas pelas avós, pelos tios, que foram recolhidas por um autor legal, o Ricardo Azevedo. Eu gosto muito da história que ele chama de Sopa de Malandro.

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Conrado Sardinha exibe o livro de Ricardo Azevedo. Foto: Atelier da Fotografia

Essa história é do tempo quem que Pedro Malazarte, um caboclo esperto andava por todo lado. Ele gostava de correr mundo e um dia veio passear por aqui, no Vale do Paraíba. Subiu um pouco da serra, cansou, voltou, atravessou rios, córregos, boa parte do vale e, claro, teve uma hora que sentiu muita fome. Mas, muita fome mesmo! Sabe aquela fome que parece que está destruindo a barriga da gente? Pois então, quando Pedro passou por uma casa, em uma das tantas fazendas por aqui, sentiu cheiro de comida… Esperem! Vou interpretar os dois; o Pedro e a dona de casa. Foi mais ou menos assim:

(VINHETA. O ATOR PREPARA-SE PARA INTERPRETAR PEDRO MALAZARTE E UMA COZINHEIRA DO VALE. UM CHAPEU PARA PEDRO E UM LEQUE PARA A DONA DE CASA SÃO OS ELEMENTOS MÍNIMOS SUGERIDOS).

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Duas personagens e um ator. O Projeto priorizou o jogo teatral. Foto: Atelier da Fotografia

PEDRO – Ai, que fome! Como é duro caminhar quando a gente tem fome. Esperem, mas que cheiro de comida é esse? Hum; que delícia! Não resisto, vou pedir um pouquinho dessa comida.

ATOR – Pedro bateu palmas (FAZ A AÇÃO) e apareceu uma mulher, com cara de poucos amigos. (FAZ UM PEQUENO JOGO, SIMULANDO OS DOIS PERSONAGENS)

MULHER – O que o senhor quer?

PEDRO – Boa tarde, Dona. Andei a manhã inteira, a tarde toda, venho de longe e não tenho nada para comer. Estou com tanta fome! A senhora poderia me arranjar um pouquinho de comida?

ATOR – E a mulher, com cara de deboche e de poucos amigos respondeu:

MULHER – Moço, não tenho comida. Aliás, eu nem vou jantar. Outro dia, quem sabe!

ATOR – O cheiro de comida que se espalhava pelo ar dizia que a mulher era mentirosa. Pedro fingiu acreditar e, de repente, teve uma ideia. Vejam o que ele fez!

PEDRO – Tudo bem, dona. Não faz mal. Eu dou um jeito. Já que a senhora não pode me dar comida eu vou preparar uma sopa de pedra.

MULHER – Sopa de quê?

PEDRO – Sopa de pedra! A senhora nunca experimentou? É uma das melhores sopas que tem. Aprendi com minha mãe. A mãe da senhora não ensinou como fazer sopa de Pedra? É melhor que sopa de batata, cenoura, sopa de feijão, de milho.

MULHER – Nunca ouvi falar.

PEDRO – Se a senhora me emprestar um tacho, eu faço a sopa pra matar a minha fome e, ao mesmo tempo ensino-a como fazer uma deliciosa sopa de pedra.

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As versões de Luciana Fonseca e Rodolfo Oliveira  para o Pedro Malazarte.

ATOR – Já ouviram dizer que a curiosidade matou um burro? Pois então; e não é que a mulher emprestou um tacho para o Pedro? Ele, espertíssimo, arrumou alguns gravetos, fez uma fogueira, encheu o tacho de água e colocou pra ferver, enquanto saiu por ali, bem em frente à mulher, escolhendo as pedras para a tal sopa.

PEDRO – (PEGANDO SUPOSTAS PEDRAS) Hum; essa pedra é boa. Substanciosa! Essa aqui também; essa, não. É dura demais. Nossa; essa é das mais gostosas que tem. E essa daqui? Delícia!

ATOR – A mulher olhando e Pedro catando pedras. Limpou todas e já foi jogando dentro do tacho. Quando a água começou a ferver ele, com a voz mais macia do mundo, pediu:

PEDRO – Não daria pra senhora me arrumar uma colher e um tantinho assim de manteiga? Por obséquio!

ATOR – A mulher atendeu arrumando a colher e a manteiga, curiosa para ver como era a tal sopa. Pedro começou a mexer a sopa e voltou a pedir, com a mesma voz macia.

PEDRO – E um tiquinho de sal, tem?

ATOR – A mulher atendeu e o Pedro emendou:

PEDRO – E um pouquinho de cheiro-verde? E uma rodelinha de cebola? Uma batatinha e um chuchu, tem? Essa sopa vai ficar muito boa!

ATOR – E a mulher, só indo buscar coisa por coisa que o Pedro pedia. O cheiro começou a ficar bom e foi então que Pedro fez o pedido final:

PEDRO – Por favor, a senhora não tem um pedacinho de linguiça e um punhadinho de arroz? É só pra dar gosto.

ATOR – A mulher voltou com a linguiça e o arroz. Pedro terminou de fazer a sopa e ainda pediu um prato e uma colher para a mulher que, ali, curiosa, viu ele tomar toda a sopa. E lá se foi o cheiro-verde, a cebola, a batata, o chuchu, a linguiça e o arroz. A mulher até sentiu vontade de tomar um pouco da sopa, mas Pedro tomou tudo, deixando as pedras no fundo da panela. Só as pedras. A mulher, olhando aquilo e já se sentindo otária perguntou:

MULHER – Mas… e as pedras?

ATOR – Pedro pegou as pedras, guardando-as no bolso e se despediu, rindo da cara da mulher.

PEDRO – Vou levar as pedrinhas comigo, para a próxima sopa! Tchau! (CORRE EM VOLTA DO PALCO, COMO SE FUGINDO DA MULHER)

ATOR – Não adiantou nada ser ruim e não dar comida para o Pedro. Ele, esperto, levou a melhor! Há muitas outras histórias aqui e em outros livros do Ricardo Azevedo. Este livro chama “Contos e Lendas de um Vale Encantado”, o nosso vale do Paraíba. A gente pode ler as histórias e contá-las para outros, brincando de fazer teatro, como fizemos agora. Mas, não são só lendas que tem aqui. Há ditados populares da região, quadrinhas, receitas, crendices e adivinhas. Quer saber, vamos brincar de adivinhas?

Vou convidar algumas crianças para brincar de adivinha!

(O ATOR CONVIDA CRIANÇAS, COLOCANDO-AS AOS PARES PARA TENTAR ADIVINHAR AS RESPOSTAS DAS PROPOSIÇÕES. UMA PRANCHETA E LÁPIS OU CANETA SERÃO OFERECIDOS PARA QUE AS CRIANÇAS REGISTREM AS RESPOSTAS. O ATOR DIRÁ A ADIVINHA, REPETIRÁ A MESMA E DARÁ TEMPO PARA AS RESPOSTAS).

ATOR – Prestem bastante atenção que esta é fácil. Vamos lá. Ninguém fala a resposta, anota no papel pra que a gente veja quem adivinhou. Não vale assoprar. Lá vai:

O que é; o que é?

Luiz tem na frente

Miguel tem atrás

Solteiro tem no meio

E casado não tem mais?

(O ATOR REPETE A ADIVINHA E ESTABELECE O TEMPO PARA A RESPOSTA. APÓS UM TEMPO MÍNIMO DÁ A RESPOSTA E INICIA A PRÓXIMA ADIVINHA).

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A adivinha estimula a memória e a interpretação de texto. Foto: Atelier da Fotografia

ATOR – Muito bem, agora vamos para a segunda adivinha. Muita calma, atenção e vamos adivinhar. Não se esqueçam, não é pra falar, é para escrever a resposta.

O que é; o que é?

É verde, mas não é planta,

Não é bule, mas tem bico.

Conversa, mas não é gente,

Vergonha não tem um tico?

ATOR – Palmas para quem acertou! Agora, a última adivinha! Vamos ouvir, adivinhar e anotar a resposta. Atenção! Essa adivinha é das boas!

O que é; o que é?

É ave, mas não tem bico.

É ave, mas ninguém caça.

É ave sem asa e sem pena.

É ave cheia de graça.

(O ATOR DÁ A RESPOSTA, PEDE APLAUSOS PARA OS PARTICIPANTES, AGRADECE E CONDUZ AS CRIANÇAS A SEUS LUGARES).

ATOR – Ave-maria! Maria, a Aparecida. Nossa região ficou muito famosa por conta da aparição da imagem de Maria no Rio Paraíba. A mãe do Cristo não só teria aparecido, mas também feito vários milagres. O Vale do Paraíba abriga todas as religiões, mas é impossível negar a importância de Aparecida no cenário católico nacional.

Todo mundo sabe ou ouviu falar de como a imagem apareceu. Um fidalgo português com fome, exigindo comida e a saída foi pescar para atender o homem. Três pescadores encontraram a santa ao jogarem a rede para pescar. Acharam o corpo, sem cabeça, em seguida pescaram a cabeça da imagem e por fim, conseguiram pescar muitos peixes. Ok! Acharam a imagem dentro do rio. Mas, cá pra nós, quem foi que jogou a santa dentro do Paraíba?

Quem foi que jogou a santa dentro do Paraíba?

Diz a lenda, e aí, é lenda, que no tempo de antigamente apareceu uma gigantesca e monstruosa cobra no rio Paraíba. Era tão grande, mas tão grande, que quando a cabeça estava em Queluz, o rabo ainda estava em Cruzeiro! Dizem que ela devorou muitos pescadores e que fez buracos imensos, pra se esconder, em toda a extensão do rio. O povo tinha medo que as cidades despencassem, caindo nos buracos feitos pela cobra gigante e vivia assustado pelas constantes mortes de pescadores. O buraco feito pela cobra ia longe, tão fundo, que diziam que chegava até ao inferno. Um terror! Até que um dia, o povo resolveu pedir ajuda à santa:

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Rodolfo Oliveira diz versos inspirados em Ariano Suassuna. Foto: Atelier da Fotografia.

Valei-nos, Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré!

Não há bode, não há cobra, ninguém que pode com a fé,

Afaste do rio essa cobra, mande-a pra onde puder,

Valei-nos, Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré.

E jogaram a imagem no rio, bem na frente da cara da cobra. É, foi isso sim. A imagem foi boiando rio abaixo e a cobra foi seguindo, seguindo, até desaparecer pra nunca mais voltar. O monstro foi embora e a imagem acabou se partindo nas pedras do Paraíba, indo para o fundo, só sendo encontrada muito tempo depois. Como diz Chicó, aquele amigo de João Grilo, que por sua vez é amigo da Compadecida, tudo gente do Ariano Suassuna: “- eu não sei, só sei que foi assim”!

Esse tempo de santos e lendas, de índios e colonizadores ficou na história, lá longe. O Vale do Paraíba, como todo bom lugar, foi se transformando com o crescimento do país, com a chegada das grandes empresas, grandes indústrias que favoreceram o crescimento das cidades mudando tudo por aqui. Só aqui, no Estado de São Paulo, são 39 municípios sediados no Vale do Paraíba. Alguns se tornaram grandes metrópoles, mudando totalmente a economia da região.

Outro dia estava olhando e descobri que temos, em todo o Vale, mais de dois milhões e duzentos mil habitantes! Mais de dois milhões! É gente demais, não é? Gente que precisa trabalhar, que precisa de energia elétrica pra manter usinas siderúrgicas, a indústria aeronáutica, indústria bélica além, é claro, da agropecuária. Uau! Muita coisa!

Quando há muita coisa os problemas aparecem. Por isso devemos estar sempre atentos para garantir a qualidade de vida do nosso vale. Quando visitei as escolas, quando estive aqui, ensinei origami para algumas crianças.

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Luciana Fonseca com o origami, feito junto com os alunos de cada cidade.

Fizemos um peixe, lembram-se? Para quem não se lembra, ou para quem não sabe, a ideia é fazer um peixe com dobradura, a arte do origami e, com isso, alertar as pessoas para que não sujem nossos rios. Vamos fazer o peixe? Vou ensinar a vocês.

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Momento de fazer origami para lembrar de preservar o rio.

(APÓS FAZER O PEIXE, PROSSEGUE) Desta vez, além de fazer o peixe – sim, porque essa é uma campanha que devemos manter, sempre! – vou cantar pra vocês uma música! Mas, eu gostaria de não cantar sozinho. Quero algumas crianças que façam o coro, cantando junto comigo. Quem gosta de cantar? Quem vem cantar comigo?

(O ATOR DEVE ESCOLHER UM MÍNIMO DE CINCO CRIANÇAS, NO MÁXIMO DEZ, EVITANDO ENCHER DEMAIS O ESPAÇO CÊNICO. DEVE ENSINAR O REFRÃO E, SEMPRE QUE POSSÍVEL, UMA COREOGRAFIA BÁSICA).

ATOR – Atenção que primeiro vamos aprender o refrão:

Limpe a água

Limpe o rio

Piraquara quer pescar!

ATOR – Piraquara é o pescador, o homem do campo que vive da pesca. Vamos lá, de novo, vamos aprender a cantar e a dançar, vamos fazer um som legal.

Limpe a água

Limpe o rio

Piraquara quer pescar!

ATOR – E agora que estamos com o refrão na ponta da língua vou fazer o meu som, que lembra muitos peixes de água doce e alguns dos principais rios do nosso país. Vamos lá!

(A MÚSICA DEVE SER ACOMPANHADA, NO MÍNIMO, POR PALMAS FAZENDO O RITMO E DANDO ANDAMENTO APROPRIADO. O REFRÃO É DITO PRIMEIRAMENTE PELO ATOR QUE, NO BIS, PEDE O ACOMPANHAMENTO DAS CRIANÇAS).

Cadê tilápia, traíra?

Onde tem tucunaré?

Piabuçu nunca vi!

Nem jundiá, nem mandi!

Limpe a água, limpe o rio

Piraquara quer pescar

Pra onde foi surubim?

Piau-palhaço vai voltar?

Não vejo mais lambari

Piabanha onde é que tá?

Limpe a água limpe o rio

Piraquara quer pescar

Bagre-guri tem ali?

Ximboré, curimbatá?

Corvina do outro lado?

Dourado veio pra ficar!?

Limpe a água limpe o rio

Piraquara quer pescar

Paraíba, Rio Doce,

Amazonas, Paraná

São Francisco, Beberibe,

Araguaia, Japurá,

Rio Madeira, Tietê,

Rio Purus, Juruá,

Tocantins, Solimões,

Brasileiro quer pescar!

Limpe a água limpe o rio

Brasileiro quer pescar (REPETE DUAS VEZES)

(O ATOR AGRADECE E CONDUZ AS CRIANÇAS A SEUS LUGARES, PREPARANDO-SE PARA ENCERRAR A APRESENTAÇÃO)

ATOR – Cantar é bom, porque dá um clima de festa. E essa festa é válida para que nós fiquemos atentos para as coisas do nosso Vale do Paraíba. Para os problemas, buscaremos soluções e para tudo o que há de bom por aqui vamos preservar e celebrar, meus amigos…

(CONFORME A CIDADE, O RESPECTIVO ATOR DIZ OS VERSOS ABAIXO)

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Luciana Fonseca esteve em Queluz

Violeta é meu nome!

Sendo pobre nunca passei fome,

Pois nasci em belo vale

Onde aprendi a pescar,

A carpir, fabricar!

Senhores, sou de Queluz

Devo me despedir,

Agora vou terminar.

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Além de Lavrinhas, Rodolfo Oliveira também foi Pedro Menestrel, em algumas escolas de Cruzeiro

Adriano, este é o meu nome,

Sendo pobre, nunca passei fome,

Pois nasci em belo vale

Onde aprendi a pescar

A carpir, fabricar!

Senhores, nascido em Lavrinhas!

Devo me despedir,

Agora vou terminar.

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Conrado Sardinha apresentou-se em Cruzeiro.

Pedro Menestrel é meu nome

Sendo pobre, nunca passei fome,

Pois nasci em belo vale

Onde aprendi a pescar

A carpir, fabricar!

Senhores, nascido em Cruzeiro!

Devo me despedir,

Agora vou terminar.

(APÓS OS VERSOS O ATOR DESPEDE-SE CANTANDO)

E agora, quem se lembrar da canção que cante comigo:

(CANTA A MUSICA DE DESPEDIDA)

Vamos brincar de teatro

Vamos brincar de ser…

Tchau, pessoal! Adeus! Até a próxima!

Valdo Resende/2016

OS SETE RIOS DE LAVRINHAS

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Rodolfo Oliveira é Adriano, o bardo em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

O Projeto Arte na Comunidade tem, entre seus principais objetivos, contar histórias e estimular esta atividade em crianças das escolas das cidades visitadas. Para isso inclui em seus textos autores e obras que, no final do projeto, estão entre os livros que são doados às bibliotecas das escolas para uso comum.

Na quarta edição do Arte na Comunidade, no Vale do Paraíba, escolhemos autores de textos teatrais (Sylvia Orthof, por exemplo, no texto para Lavrinhas) e nossos atores lembraram menestréis, bardos, poetas, saltimbancos, em um divertido exercício de teatro dentro do teatro tendo, como apoio, os adereços e figurinos criados por Carol Badra.

Em “Os Sete Rios de Lavrinhas” Rodolfo Oliveira interpreta Adriano, um bardo que lembra personagens correlatos à história do município do Vale do Paraíba. Escrito e dirigido por Valdo Resende, com direção musical de Flávio Monteiro, o trabalho foi apresentado em todas as escolas municipais.

Havendo interesse em reproduzir o texto ou interpretá-lo, pedimos a citação do motivo pelo qual o texto foi escrito e dos profissionais envolvidos na montagem original.

Idealizado por Sonia Kavantan o Arte na Comunidade 4 foi patrocinado pela Alupar, Taesa e apoiado pelas Usinas Queluz e Lavrinhas. Uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.

OS SETE RIOS DE LAVRINHAS 

Original de Valdo Resende

(CARACTERIZADO COM ELEMENTOS QUE REFEREM UM BARDO, O ATOR ENTRA CANTANDO A MÚSICA DE ABERTURA CAMINHANDO POR ENTRE O PÚBLICO E, ANTES DE IR PARA O ESPAÇO CÊNICO PRINCIPAL – PALCO OU SALA DE AULA – BRINCA COM OS PRESENTES; ADRIANO DEVE CAMINHAR RAPIDAMENTE POR ENTRE TODOS, AGITADO).

 

Vamos brincar de teatro

Vamos brincar de ser,

Viver muitos personagens

Nessa viagem e assim crescer.

O palco é a rua, a sala,

A praça ou o nosso quintal

A história a gente inventa

Ou conta aquela já bem contada

Que recontada, não tem igual!

(TERMINANDO DE CANTAR, CUMPRIMENTA A PLATEIA)

Meus amigos: Cheguei!

(NOS PRIMEIROS MOMENTOS O ATOR SE MOSTRARÁ TENSO, ELÉTRICO, ESTRESSADO).

Olá para todos! Tudo bem? Como vão? Ah, que bom que eu cheguei aqui! Não via a hora de chegar à minha Lavrinhas! Não via a hora, mesmo! Ando tão fatigado, extenuado, cansado, esgotado, combalido, estressado, acabado! A vida por aí não anda nada fácil! De onde venho é muita correria, muita tensão, muita agitação! E eu, estressado, só pensava em vir pra minha cidade, encontrar minha família, meus amigos e… Brincar de teatro! (RESPIRA FUNDO) Foi só chegar por aqui, olhar as casas, os rios, as pessoas e já estou me sentindo melhor. Já quero brincar! Teatro é tão relaxante, tão divertido, bom para distrair, desanuviar!

Vamos brincar de teatro

Vamos brincar de ser,

Viver muitos personagens

Nessa viagem e assim crescer.

(RESPIRA EXAGERADAMENTE FUNDO, RELAXADO) Eu nasci aqui, em Lavrinhas. Faz tempo! Bem ali, na Rua Manoel Horta, perto da Igreja. Uma calmaria, uma tranquilidade! O rio passando no fundo de casa, aquele barulho gostoso! Naquela época eu já adorava ouvir a chuva caindo sobre o rio. Vocês já pararam pra prestar atenção? Quando a chuva cai e as águas ganham maior volume, correm mais depressa, como se fossem para uma grande festa! Depois a chuva passa, a água volta a correr como sempre. Eu gostava de ter o rio passando ali, no fundo do quintal. Eu subia em um pé de goiaba e, lá de cima, ficava olhando a água correr, imaginando onde ela iria parar… Iria evaporar e tornar a cair em forma de chuva? Terminaria fervendo em uma panela e virando caldo de feijão? Café? Refrigerante? Dá pra lembrar um monte de usos para á água.

Ontem, quando cheguei, estava muito mais elétrico e muito mais estressado. Estava assim, vejam! (O ATOR FAZ UMA PANTOMIMA, FINGINDO-SE AGITADO). Aí, deixei minha bagagem na casa de uns amigos e chispei, corri, acelerei, disparei até a Cachoeira da Pedreira. Cheguei lá e mergulhei de roupa e tudo no poço… Uma delícia! Aí, foi só deixar a água cair forte, fresca, gostosa. Aquele banho me fez sentir que havia chegado. Estava em casa.

Foi olhando a natureza que aprendi a gostar de poesia. Ficava buscando palavras para expressar o que eu via; as corredeiras, os pássaros, a mata, a serra… Uma vez, na Festa de São Francisco de Paula, apareceu um cantador, viajante nordestino, que cantava e contava histórias em versos. Fiquei encantado e naquele dia resolvi que seria poeta, cantador, contador de histórias. Comecei a estudar o assunto e descobri que eu seria um bardo! Espera! Está na hora de vocês saberem, em versos, um pouco mais do que sou.

(O ATOR DECLAMA OS VERSOS APRESENTANDO-SE AO PÚBLICO)

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Rodolfo Oliveira. Foto divulgação/Atelier da Fotografia

Atenção, todos vocês,

Apresento-me, sou um bardo!

Um poeta diferente,

Não faço da vida um fardo.

Desde os tempos de outrora

Pela graça do Senhor

Conto histórias, mitos, lendas,

Invento fábulas e lorotas

E por ser um vencedor

Fui mais além nessa vida,

Prestem atenção: sou um ator!

Adriano, este é o meu nome,

Sendo pobre, nunca passei fome,

Pois nasci em belo vale

Onde aprendi a pescar

A carpir, fabricar!

Senhores, nascido em Lavrinhas!

Vim aqui me apresentar.

(TERMINA FAZENDO MESURAS E VOLTA A FALAR NORMALMENTE)

Os bardos, dizem, surgiram há muito tempo, lá na Europa. Antes mesmo dos trovadores, dos menestréis que são outros tipos de poetas. Bardo é um nome diferente, não é? Todos os poetas, trovadores, menestréis gostam de versos, de rimas, de contar e cantar histórias. O bardo narra a história de sua gente em versos, em prosa, com música. Gostando de poesia e de teatro foi fatal conhecer um dos maiores poetas e dramaturgos de todos os tempos: William Shakespeare! Lá da Inglaterra. Chamam-no “o bardo”. Pois em suas peças há muita poesia e ele também escreveu sonetos.

Desculpem-me a ousadia; muita pretensão ser tão bom quanto ele; entretanto, a gente deve espelhar-se no que há de melhor; é assim que crescemos. Olhando para o alto. Então, tendo crescido aqui me habituei a observar a grandeza da serra, a determinação dos nossos rios, às riquezas do nosso vale… Tudo tão maravilhoso! Tomei a decisão de contar pelo mundo a história da minha terra. Em verso e prosa.

Lógico que, de cara, não consegui dominar as palavras, os versos. Fui aprendendo aos poucos e, em teatro, a gente aprende observando. Meu professor dizia: (IMITANDO UM POSSÍVEL PROFESSOR) “– Adriano; observe a vida, as pessoas, só assim você poderá ser ator. Observar e viver, esta é a missão do poeta, de todo artista. Você é capaz de lembrar-se da sua gente, lá da sua cidade?”. Claro que sou! E o professor me disse? “-Será mesmo? Vamos começar fisicamente!”. Hein? Observar fisicamente? Como assim, observar fisicamente? E ele continuou: “- Adriano lembre-se das pessoas de sua cidade, do que elas faziam; do que elas fazem e são e reproduza com seu próprio corpo”.

(O ATOR, CONFORME NOMINA, VAI IMITANDO GESTUALMENTE)

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A primeira pessoa que me veio à mente foi o Padre Antonio (IMITA COM GESTOS SACROS); eu ajudava o padre nas missas e, por isso, sabia tudo o que ele fazia (VOLTA A IMITAR). Depois me lembrei do Tio Manoel; (NARRA REALIZANDO AS AÇÕES SUGERIDAS) Tio Manoel, volta e meia, saia de casa, ia até a beira do rio e, pegando a canoa, saia remando em pé; o máximo! Procurava um bom lugar para pescar. Imaginem só! (IMITA O BARQUEIRO REMANDO) É difícil manter o equilíbrio com o barco em movimento, balançando; e meu tio ali, firme! Dizia que aprendeu com descendentes de índios que viveram por aqui. Tio Manoel passava horas pescando. Pegava a vara, acertava o anzol, punha a isca e, lançando na água esperava pacientemente por um bom peixe. (REPETE A SEQUÊNCIA RAPIDAMENTE) Caminhar, pegar o barco, navegar, pescar… (MUDA O TOM) E os peixes sumindo, sumindo. Pesca exagerada, água poluída… (QUEBRA O CLIMA) Vamos brincar de teatro! Quero cinco crianças! Cinco! Vamos brincar de teatro e começar fisicamente, como aprendi com meu professor.

(O ATOR ORIENTA AS CRIANÇAS PARA CRIAÇÕES FÍSICAS DE PROFISSÕES COMUNS AOS HABITANTES DA CIDADE. ANUNCIA A PROFISSÃO E REALIZA GESTOS, FACILITANDO A LEMBRANÇA OU O CONHECIMENTO PARA CADA PARTICIPANTE).

Prestem atenção! Quem sabe fazer de conta que está garimpando? Com bateia, uma peneira própria para pescar. Onde teve ouro, sempre poderá haver novamente. (FAZENDO AS AÇÕES COM AS CRIANÇAS) Mergulhando a bateia na água, enchendo com o cascalho que há no fundo do rio, chacoalhe para frente e para trás, de um lado e de outro e retire da água. A sujeira se dissolve, as partes menores passam pela bateia ficando o cascalho e, se der sorte, encontramos ouro! E esse local onde o ouro está é o que chamamos lavra. Lavrinhas! Várias lavras de ouro!

(ESCOLHE ENTRE AS CRIANÇAS AQUELA QUE SERÁ O GARIMPEIRO) Quem quer ser o garimpeiro? Tem que ser forte, resistente, porque dá uma dorzinha nas costas… (DEFINE A CRIANÇA). Bom, agora vamos brincar de lenhador; vamos extrair madeira para a produção de carvão vegetal. (FAZENDO AS AÇÕES) Escolhemos a árvore e, com um machado, fazemos um primeiro corte que será a base onde colocaremos a serra. Lenhador tem que ser forte! Não é fácil segurar e sustentar uma serra elétrica! E tem que ser responsável! Escolhe a área para extrair a madeira, mas depois tem que replantar e reflorestar. Do contrário, a madeira acaba. Já não temos tanta mata por aqui… Vamos escolher um lenhador! (DEFINE A CRIANÇA. AS PRÓXIMAS PROFISSÕES SERÃO ESCOLHIDAS COM MAIS RAPIDEZ).

Já temos um garimpeiro e um lenhador, agora está na hora de encontrar quem saiba ordenhar. Em um sítio todos sabem ordenhar. (FAZ A AÇÃO) Quem gosta de leite? Queijo, iogurte, manteiga? Então, para ter leite é preciso ordenhar. Eu sei ordenhar, pois aprendi quando passava férias com meu avô. Vamos ordenhar! Com força e delicadeza! (FAZ E ESCOLHE UMA CRIANÇA, RETOMANDO A BRINCADEIRA). Quem vai ordenhar? Já temos um garimpeiro, um lenhador e aquele que irá ordenhar.

Vamos lembrar meu tio Manoel? Mas, sem pescar de pé que estou cansado e gosto de pescar para relaxar. Vamos pescar! Pega a vara, acerta a linha, coloca o anzol, a isca, lançar na água e… Eita, vida boa! (SENTADO, PARA FAZER A PESCARIA O ATOR FINGE QUE DORME, ATÉ SIMULAR UM PUXÃO NA LINHA). Opa! Olha o peixe! Pesquei! Pesquei um! (PERMANECE SENTADO PARA A PRÓXIMA AÇÃO) Vamos escolher, definindo o pescador do nosso grupo. (PARA A ÚLTIMA CRIANÇA) E você que ficou por último, mas não menos importante será um soldado! Mas, não um soldado qualquer (REALIZA A AÇÃO) Um combatente! Lutando bravamente em uma trincheira, atirando para garantir seus ideais! O combatente da Revolução de 1932!  (SIMULA ATIRAR COM UMA METRALHADORA).

E agora, senhoras e senhores, temos cinco criações físicas que serão fundamentais para compor uma história! Uma pequena história que aprendi de um querido vizinho, antigo morador da nossa cidade. Vai ser assim: eu vou contando a história, como se fosse meu antigo e simpático vizinho e nossos atores ilustrarão fisicamente os fatos narrados nessa boa história. Só que para narrar irei me transforma no meu vizinho, um velhinho muito querido!

(O ATOR MUDA A CAMISA E COLOCA ADEREÇOS COMO UM BONÉ, ÓCULOS E UM CACHECOL, COMPONDO A PERSONAGEM. EM SEGUIDA, NARRA E REALIZA AS AÇÕES COM AS CRIANÇAS).

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

AVELINO – Olá! Tudo bem com vocês? Meu nome é Avelino! Avô de Amélia, Aurora, Alice e amigo de Adriana. Eu sou um cidadão Lavrinhense. Um verdadeiro cidadão Lavrinhense! Não basta nascer aqui. Pra começar, eu adoro comer! Peixe! Um peixe bem fritinho, um pirão… (BRINCA DE PESCADOR JUNTO COM A CRIANÇA DETERMINADA PARA TAL AÇÃO). Pescar é bom, não é mesmo, compadre? Surubim, bagre, dourado! Compadre, você já ouviu falar que trouxeram o dourado de longe? Que não havia dourado no Paraíba? Trouxeram do Paraná! Não estou mentindo não! Compadre fique aqui pescando que eu preciso continuar minha história.

Além de pescador um lavrinhense deve saber cortar lenha. Eu cortei muita lenha por aqui. Escolher a árvore, derrubar e cortá-la em bons pedaços (FAZ A AÇÃO JUNTO COM A CRIANÇA DETERMINADA). Para nosso fogão à lenha, em casa, escolhíamos madeira sequinha, evitando encher a cozinha de fumaça. Madeira úmida dá uma fumaceira! E vendíamos para a companhia da estrada de ferro. Ganhamos muito dinheiro extraindo madeira. Derrubando uma árvore aqui, tirando o mato dali, fomos abrindo espaços na mata para nossas fazendas, para a criação de gado leiteiro. Qual criança vai me ajudar a ordenhar? Você? Ah, vamos ordenhar!

Nos sítios da minha família tirávamos leite para nosso sustento. E o excedente, o que não iríamos usar ia para os grandes laticínios. Nas grandes fazendas eram centenas de litros; na região, milhares de litros de leite. Hoje eu tomo leite de caixa… Tenho uma saudade do leite ordenhado ali, na hora, quentinho! Um cheiro! Uma delícia! (PARA A CRIANÇA) Quer tirar mais um pouquinho? Vamos ver se você aprendeu direitinho! (OBSERVA) Muito bom!

(DEIXA A CRIANÇA ORDENHANDO E APROXIMA-SE DA QUE FARÁ O GARIMPEIRO) Sabem que eu já achei umas pepitas de ouro? Bem pequenas; pequenininhas! Dizem que onde houve ouro pode aparecer mais. Aí, nas horas vagas eu, lavrinhense, gostava de matar o tempo garimpando (FAZ A AÇÃO). Sete rios para a gente procurar um cantinho e, quem sabe, encontrar uma pepita de ouro! Há muito tempo garimpeiros descobriram por aqui pequenas Lavras e, é claro, garimparam o ouro. Lavrinhas! Vai que a gente encontra uma pedrinha amarela! No mínimo, umas pedras bonitas. Eu tenho sete! Uma de cada rio que banha a região. (MUDA DE TOM) Acontece, agora, de a gente garimpar lixo. Sem problemas! A gente aproveita e colabora para limpar nossos rios. Mas, que tal não jogar lixo no rio? (VOLTA) Ai, minhas costas! Não tenho mais tanta disposição para garimpar. O tempo passa. Todavia, se for necessário lutar, estou pronto! (APROXIMA-SE DO SOLDADO)

Eu espero nunca mais, nunca mais mesmo, não mais pegar em armas. Nem eu, nem um Lavrinhense, nem um paulista ou um brasileiro. Somos gente da mesma terra, não temos que lutar uns contra os outros. (FAZ A AÇÃO) Eu lutei na revolução. 1932! Foi difícil, foi duro, mas se precisar eu luto de novo. Só se precisar. Agora, só de brincadeira. (VOZ DE COMANDO) Soldado! Fogo! Quem puder que se esconda das nossas balas! (FINGE FARSESCAMENTE QUE LEVA UM TIRA) Ai, ai, me acertaram! Socorro! Estou morrendo! Morri!

(CAI. VINHETA. TIRA OS ADEREÇOS, VOLTANDO A SER ADRIANO).

ADRIANO – Palma para os nossos atores! Grandes atores que interpretaram fisicamente a pequena peça “Os habitantes de Lavrinhas”. Palmas! E agora, por favor, eu peço que nossos atores permaneçam no palco. Sim, vamos continuar o “lance” do teatro. Então, meu professor nos ensinou a observar as pessoas e a reproduzir, compor os gestos caracterizando-as, certo? Pois bem, ele também nos fez observar coisas e acrescentar som. O cara era pirado! (IMITA O PROFESSOR) “– Adriano, se o povoado de Lavrinhas cresceu com a chegada da estrada de ferro, com a construção da nossa estação, represente um trem”. Hein? Trem? Representar um trem? Ai, meu Deus, porque é que eu fui dizer a ele que a nossa estação foi a segunda a ser construída aqui no Vale do Paraíba? Fazer o que! Quando professor pede é porque quer que a gente aprenda, evolua. Já fizemos garimpeiro, pescador, lenhador… Vamos fazer um trem! (PARA AS CRIANÇAS QUE JÁ ESTÃO NO ESPAÇO CÊNICO) Vocês me ajudam? Por favor! Vamos compor um trem!

Para compor um trem vamos começar pela locomotiva. Daquelas antigas, Maria Fumaça! Com aquelas travas presas, movimentando as rodas (FAZ OS GESTOS COMPONDO A LOCOMOTIVA). Agora vamos fazer os carros, os vagões. Fila indiana para nosso trenzinho. (ESTABELECE UM SINAL) E atenção, quando eu fizer sinal, todo mundo apita. Vamos Ensaiar! (FAZ O GESTO) Piuiiiiiiiii! Agora, vamos brincar de trem! Primeiro um ensaio e depois vamos fazer pra valer. Vamos lá. Ensaiando! (FAZ O ENSAIO) E agora é pra valer! Atenção. No meu gesto, o apito! Não esqueçam.

(O ATOR DIRÁ OS VERSOS EM TRÊS VELOCIDADES, QUE MARCARÃO O RITMO DO ANDAR DO TREM. COMEÇA LENTAMENTE E ACELERA NO FINAL).

Meu trenzinho pequenino

Desce a Serra, vai pro mar,

Vai correndo, vai ligeiro,

Sobe a serra devagar

Meu trenzinho de menino

Para sempre vou lembrar!

(FAZ O GESTO PARA O APITO E VOLTA ACIMA, NO PRIMEIRO VERSO. REPETE TRÊS VEZES).

E o nosso trem termina essa viagem aqui, em Lavrinhas. Palmas para nossas crianças! E vamos em frente! Eu gosto de fazer coisas no palco. Gosto de fazer gente e gosto de fazer coisas. É; e de fazer coisas! (PEGA O LIVRO DA SYLVIA ORTHOF) em teatro da pra fazer de conta que a gente é tudo o que der na cabeça da gente ou do autor. (MOSTRA O LIVRO)

Neste livro aqui está o texto da primeira peça de teatro que fiz como ator profissional. Na escola a gente estuda e pensa em ser galã, bem bonitão. Entretanto, vocês acham que eu estreei nos palcos fazendo um príncipe? Um rei? Um herói? (PAUSA) Meu primeiro personagem foi… Um chuveiro! É! Um chuveiro; isso mesmo! (MOSTRA O LIVRO) A autora do texto é a Sylvia Orthof. Nas peças escritas por ela os personagens são pessoas, coisas, seres mágicos.

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

Ah! Minha primeira peça! O nome da peça é este aqui, que está na capa do livro: Eu chovo, tu choves, ele chove! E eu, como chuveiro, era apaixonado por uma sereia! Incrível, não é? A Sylvia Orthof tem textos lindos pra gente brincar de teatro. Um texto é sempre um pretexto pra gente brincar de teatro. A gente escolhe um texto, chama os amigos… Quanto mais amigos melhor! E parte para a brincadeira. Uma brincadeira séria, pois cada um faz a sua parte, na hora que deve fazer. É a ação de todos, ou seja, a junção do trabalho de cada um que deixa tudo bonito, legal, da hora! Quando não tem texto, ou se a gente quiser dizer algo diferente, só nosso, o jeito é escrever! Sim, podemos escrever nossos próprios textos, nossas peças de teatro. É muito divertido escrever porque a gente pode criar as personagens mais incríveis.

Depois de interpretar um chuveiro, uma temporada de grande sucesso, vim passar uns dias aqui, na cidade. E seguindo os conselhos do meu professor, que agora era meu diretor de teatro, resolvi escrever meu primeiro personagem para mostrar pra minha família, para os meus amigos, que eu já era um ator. Vou mostrar pra vocês o primeiro personagem que escrevi. Prestem atenção!

(VINHETA. O ATOR TRANSFORMA-SE EM UM ANTIGO TELEGRAFISTA. NAS MÃOS UM SIMULACRO DE TELÉGRAFO).

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

TELEGRAFISTA – Toc, toc, toc… Tem gente que acha que telegrafista faz toc, toc, toc. Telegrafista não faz toc, toc. Telegrafista faz dit, para sons curtos, e dah para sons longos. Dit, dah. Dit Dit Dit Dah Dah Dah. E vai formando letras, palavras, textos inteiros. Dit Dah Dah Dah Dit Dit Dit Dah. Isso se chama código Morse. Dit é curto, seco. Dit, dit! Já o dah deve ser longo. É um código ultrassecreto. Ideal para mensagens entre estações de trem. Eu sou um telegrafista! Dos bons, modéstia às favas. Eu estava aqui, em 1874 quando foi inaugurada a nossa estação. O primeiro trem veio puxado por uma locomotiva a vapor, o maquinista se achando o máximo. O chefe da estação bancando a autoridade, mas eu, fui eu, com meus Dit Dit Dah que informei: A linha está liberada! Podem vir com o trem!

Aqui, em volta da estação, era uma fazenda linda, enorme, dos irmãos João Emídio e Antônio Francisco Ribeiro. Eles cederam terreno da Fazenda Lavrinha e assim veio a estação. O objetivo dos fazendeiros era facilitar o comércio do café. Eles tinham cafezais imensos e despachavam a produção para São Paulo, de lá para Santos, para o porto de onde nosso café ia para todas as partes do mundo.

Hum! Não posso falar em café que me dá uma vontade! Ali, na estação, no meu Dit Dit Dah Dah de todo dia, um café ajudava a passar o tempo. E o tempo viu surgir o vilarejo no entorno da estação. Uma pequena vila, semente da nossa cidade. Vi centenas de vagões saindo cheios de café, depois de madeira e até vagões tanque, transportando o leite de nossa região. Fui telegrafista durante 40 anos! 40! Sabem o que é isso? Vocês têm ideia de quantos Dit Dah Dah Dit Dit dei nessa vida? A data da minha aposentadoria, 1914, nunca me saiu da memória. Foi um ano importante para o mundo, mas o que realmente guardei na lembrança foi a ida de meu netinho para a escola. Eu não queria que ele fosse embora. Já pensou? Meu único neto? Pois foi em 1914 que os padres Salesianos instalaram aqui, em Lavrinhas, o colégio São Manoel. Nossa vila, que já era distrito de Lavrinhas tinha seu colégio!

(VINHETA. VOLTA A SER ADRIANO).

ADRIANO – Eu gosto muito desse personagem. O telegrafista. Se ele visse a nossa Lavrinhas de hoje! Cresceu, tornou-se uma cidade adulta e com tanta beleza natural! Além das fazendas, das chácaras, temos balneários pras pessoas descansarem. Os turistas desfrutam da maravilhosa paisagem do vale, da serra; banham-se nas nossas cachoeiras, pescam em nossos rios…

Se nosso telegrafista visse! Quantas cidades! Milhares de pessoas. Centenas e centenas de grandes empresas. Por onde o ser humano passa as transformações são imensas. Nossas reservas florestais diminuíram demais e a extração da madeira ficou no passado; as grandes fazendas, históricas, bonitas, abrindo campos para o gado leiteiro também transformaram o ambiente. Lavrinhas, atenta às mudanças e certa da necessidade de cuidar e preservar o meio ambiente construiu uma estação de tratamento de esgotos. Fiquei tão contente! Podem acreditar; há no nosso país cidades inteiras sem redes de esgotos! Nossa maior riqueza é nossa terra, cheia de rios, de árvores, uma natureza exuberante! Em hipótese alguma devemos permitir que isso acabe. Sem sujeira! Sem Poluição!

(CANTA OS PRÓXIMOS VERSOS COM A MELODIA DA CANTIGA DE RODA “ANQUINHAS”)

Oh, cidade de Lavrinhas.

Tão bela, tão rica em águas

Preserve teus sete rios

Por toda a eternidade!

Sete rios! Quanta riqueza! Quanta vida! Vimos recentemente o país inteiro passar por uma crise com falta de água. E nós, aqui em Lavrinhas, temos sete rios! (PEGA PAPEL DE ORIGAMI E COMEÇA A DOBRÁ-LO, CRIANDO UM PEIXE) Se a gente quiser podemos destinar um rio para cada coisa. Assim: um rio para nadar, outro só para pescar. Daquele pegaremos água para beber e do outro, energia para nossas casas. Olhem que privilégio! Mas, para aproveitamos desses sete rios precisamos cuidar deles. Mantê-los limpos, preservá-los. Por isso criei esses versos pra gente não esquecer de que temos que cuidar direitinho dos nossos sete rios. Vamos aprender esses versos? Eu canto uma frase e vocês repetem; assim, a gente aprende e guarda na mente os novos versos, lembrando-nos do que devemos fazer.

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Rodolfo de Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

Oh, cidade de Lavrinhas

Tão bela, tão rica em águas

Preserve teus sete rios

Por toda a eternidade!

(O ATOR OFERECE O PEIXE PARA ALGUMA CRIANÇA E, EM SEGUIDA, ENSINA A PLATEIA, CANTANDO UM VERSO, PEDINDO QUE A MESMA REPITA E APÓS FAZER OS QUATRO VERSOS, REPETIRÁ TODA A CANTIGA. ENQUANTO ISSO FARÁ OUTRO PEIXE COM O PAPEL DE DOBRADURA.).

(EXIBE O PEIXE PARA A PLATEIA) Vejam no que transformei esse papel. Um peixe! Eu disse que faríamos duas coisas, certo?  A primeira foi a música. Agora quero ensinar as crianças a fazerem esse peixe. A ideia é a seguinte: sempre que possível, a gente faz um peixe para lembrar que temos que cuidar dos nossos sete rios para mantê-los vivos. E quando a gente perceber alguém, seja quem for, sujando os nossos rios, nós não vamos brigar, vamos fazer um peixe como este e dar de presente à pessoa, para lembrá-la que rio sujo é rio sem vida. Vamos aprender a fazer esse peixe?

(O ATOR FARÁ O ORIGAMI. TODAS AS CRIANÇAS PODERÃO PARTICIPAR DA ATIVIDADE. EM SEGUIDA, AGRADECE AS CRIANÇAS E PROSSEGUE).

Dobrar papel é uma arte desenvolvida no Japão. Lá eles dizem origami e assim ficou conhecido no mundo inteiro. Origami. Arte de dobrar papel e transformá-lo em flores, animais e toda uma série de coisas. Aprendi a fazer origami por conta de uma peça que fiz, ambientada no Japão. Pesquisamos sobre a comida japonesa, as roupas, os hábitos… E aí, aprendi a fazer origami. Tudo isso lá, com meu grupo de teatro. Eu vivia contando histórias da minha terra. Tinha gente que duvidada que alguém pudesse construir um viaduto para uso particular. Ficavam me olhando, desconfiados, mas o fato aconteceu.

O coronel Manoel Pinto Horta mandou construir um viaduto sobre a estrada de ferro ligando a casa onde morava com o armazém, também propriedade dele. Que máximo! (IMITANDO O TAL CORONEL) “- Vê lá se irei dar voltas e mais voltas para ir ali, do outro lado da linha”!  Pois construíram o viaduto. Só para uso do coronel. Aí, a estrada de ferro comprou uma locomotiva, lá na Alemanha! Na primeira viagem na linha Rio – São Paulo, chegando a Lavrinhas a locomotiva parou. Sabem o motivo? A máquina tinha chaminé alta e não dava para passar sob o viaduto do coronel. O trem parado e o coronel tranquilo, olhando lá de cima (IMITANDO O CORONEL) “– Cortem a chaminé que a máquina passa”! E assim chamaram um técnico e assim foi feito.

Eu contava esses fatos na escola e um dia meu mestre me desafiou a escrever versos sobre a cidade. (IMITANDO O PROFESSOR) “- Adriano, você vive dizendo que admira o bardo, nosso grande bardo; seja como ele, faça poesias, sonetos, peças de teatro; conte a história de Lavrinhas em verso”!

Quem sou eu, pensava, para ser um bardo! Quem sou eu! Às escondidas eu rascunhava uns veros, tentava, jogava fora, até que mostrei ao professor. Ele corrigiu, criticou e mandou fazer outros, melhores. Foram esses, que vou dizer agora, os primeiros versos aprovados pelo meu professor:

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

Lavrinhas, no Vale do Paraíba,

É a cidade onde nasci!

Entre belas cachoeiras,

Sob serra altaneira,

Nadando em teus rios cresci.

Cidade calma e tranquila

Trago-te em tudo o que faço.

Hoje e por todo o sempre

Recebas com carinho o meu abraço.

Desde então passei a me apresentar como Adriano, o Bardo. Cantando e inventando cantigas e brincando com as palavras. Gosto muito de tudo o que faço e teatro é a melhor coisa que aconteceu em minha vida. E poder escrever versos, então, nem digo! Que melhorar muito e, quem sabe, ser reconhecido por toda a gente como o bardo de Lavrinhas; já pensaram?

Lavrinhas, no Vale do Paraíba,

É a cidade onde nasci!

Entre belas cachoeiras,

Sob serra altaneira,

Nadando em teus rios cresci.

Bem, sou um bardo em formação. Vou trabalhar muito, para me aprimorar e agora estou aqui lembrando fatos da nossa cidade e brincando de teatro com todos vocês. Teatro é uma forma de contar histórias e os versos deixam essas histórias mais bonitas. Aqui brincamos de compor fisicamente personagens comuns em Lavrinhas e também brincamos de colocar som, interpretar coisas. Um passo importante para quem quer brincar de teatro é saber escrever diálogos, interpretando com outro ator. Quando não tem outro ator, a gente faz os dois. É o que eu farei agora com uma história que eu ouvi contarem, mas não tenho certeza se ocorreu ou não. Foi o encontro do Presidente Dutra com um camponês, criador de gado leiteiro aqui da nossa região.

Em 1951 foi a inauguração da Via Dutra. Da nova Via Dutra. A estrada já existia desde 1928, mas o Presidente da República, o General Eurico Gaspar Dutra, construiu e veio inaugurar a BR 116, Rodovia Rio de Janeiro – São Paulo. Foi uma grande comemoração e, conta um velho amigo da minha família, que o Presidente Dutra estava todo pimpão, vaidoso e orgulhoso de seu feito. Depois de descerrada a placa de inauguração teve um almoço, com toda a gente importante da cidade. Foi aí que se deu o encontro do Presidente com o camponês, criador de gado leiteiro aqui no nosso município. Vou interpretar os dois!

(VINHETA. O ATOR SEGURA UM LITRO DE LEITE EM UMA DAS MÃOS, QUANDO FOR O CAMPONÊS E, NA OUTRA, UMA FAIXA VERDE-AMARELA, REMETENDO À FAIXA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. NAS PRIMEIRAS FRASES O ATOR NOMINA AS PERSONAGENS, AJUDANDO O PÚBLICO A IDENTIFICAR AS DUAS PERSONAGENS).

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

DUTRA – Ora, então o senhor é criador de gado leiteiro! Muito prazer!

CAMPONÊS – É uma honra, Vossa Excelência!

DUTRA – O senhor deve saber que a nova estrada tem 111 quilômetros a menos do que a antiga?

CAMPONÊS – Sei, Vossa Excelência, senhor presidente.

DUTRA – E que reduzimos em 6 horas o tempo de viagem entre Rio de Janeiro e São Paulo?

CAMPONÊS – Sei, Vossa Excelência, senhor presidente.

DUTRA – O senhor sabe que usamos 1.300.000 sacos de cimento na construção.

CAMPONÊS – Não sei, Vossa Excelência, senhor presidente.

DUTRA – Mas, então, o senhor sabe que usamos 8.000 toneladas de asfalto?

CAMPONÊS – Não sei, Vossa Excelência, senhor presidente, me desculpe!

DUTRA – Ora, não se desculpe, o senhor é apenas um camponês!

CAMPONÊS – Criador de gado, Vossa Excelência!

DUTRA – Sei, criador de gado.

CAMPONÊS – Que sabe uma coisa que Vossa Excelência não sabe!

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

(QUEBRA A CENA MOMENTANEAMENTE, VOLTANDO A SER ADRIANO)

ADRIANO – Foi um deus nos acuda. Um camponês dizendo ao presidente que ele não sabia algo. Como assim? E os assessores? Um presidente deve saber tudo! Mas, vamos voltar a cena.

DUTRA – Meu caro camponês (O CAMPONES ESBOÇA DESAGRADO E O PRESIDENTE CORRIGE) me desculpe; criador de gado! Quando eu não sei algo, meus assessores sabem.

CAMPONÊS – Só se o senhor tiver assessor aqui, de Lavrinhas, porque do Rio de Janeiro ou de São Paulo, “duvi-d-ó-dó”.

DUTRA – Pois me pergunte o que eu não sei, meu caro criador de gado leiteiro. E eu responderei.

CAMPONÊS – Lá vai! Segura aí, Vossa Excelência. Diga-me: Qual o nome dos sete rios de Lavrinhas?

DUTRA – Sete? Sete Rios?

CAMPONÊS – Diga lá, Vossa Excelência. Eu não tenho pressa. Pode ir aí, perguntar para os seus assessores.

(VOLTA A SER ADRIANO)

ADRIANO – Foi uma loucura. Um embaraço total. Dizem que o homem, todo engravatado, saiu perguntando aos outros engravatados da sua comitiva quais eram os nomes dos sete rios que banham o município de Lavrinhas. Paraíba é fácil. Paraíba do Sul! Os outros é que são elas. Vamos ajudar o presidente? Vamos levantar o nome dos sete rios da cidade? Quem sabe? Pode perguntar pra professora, consultar o Google, pode tudo! Vamos lá?

(O ATOR DEVE CONVERSAR E LEMBRAR O NOME DOS SETE RIOS QUE BANHAM O MUNICÍPIO)

Além do Paraíba do Sul, o mais famoso de todos, temos mais seis. Um deles é fácil de lembrar ou adivinhar; quando as mulheres têm muito, mas muita idade, elas são chamadas de? (RIO DAS VELHAS).

Viram como é fácil memorizar? Um rio tem nome de um dos membros do corpo humano. O corpo humano, a gente sabe, é composto de cabeça, tronco e membros. Os membros são pés e braços. O nome do Rio? (RIO DO BRAÇO)

Dois rios têm o mesmo nome; um normal e outro no diminutivo. Nome de ave! Quem sabe? (RIOS JACU E JACUZINHO)

Vamos contabilizar: Paraíba, Rio das Velhas, Rio do Braço, Rio Jacu, Rio Jacuzinho. Faltam dois! Um é o contrário de escuro; o outro é o contrário de curto. Qual o nome desses rios? (RIO CLARO E RIO COMPRIDO).

Pronto! Já temos o nome dos sete rios. Vamos ver como terminou a história. O Presidente Dutra, depois de muito perguntar para a gente de fora, entregou os pontos e foi muito honesto, pois evitou perguntar aos moradores da região. Foi assim!

(“REMONTA” OS DOIS PERSONAGENS)

DUTRA – Meu caro criador de gado, eu peço perdão. Diga-me, pois, quais são os sete rios de Lavrinhas?

CAMPONÊS – Anota aí, Vossa Excelência, para nunca mais esquecer. Lavrinhas, minha cidade, é banhada pelos seguintes rios. Rio Claro; Rio Comprido; Rio das Velhas; Rio do Braço; Rio Jacu; Rio Jacuzinho e, é claro, o grandioso, o sagrado Rio Paraíba do Sul.

(FAZ MESURAS, AGRADECENDO COMO SE FOSSE O CAMPONÊS. VOLTA A SER ADRIANO).

Muito obrigado a todos. Agora está na hora de ir embora.  Gostei muito de estar com vocês. Brincar de teatro é bom demais. E no meio da peça a gente canta, a gente declama poesia, faz origamis, cria personagens… Sempre é bom lembrar: Os livros são nossos grandes guias nessa viagem. Não se esqueçam do livro da Sylvia Orthof e, se quiserem ver outros livros, falem com seus professores! Há muitos livros com peças e histórias pra gente brincar.

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Rodolfo Oliveira em Os Sete Rios de Lavrinhas. Foto: Atelier da Fotografia

Agora preciso ir embora. Vou visitar muitas escolas, muitas salas e brincar de teatro com muito mais gente. Prestem atenção que tenho algo muito especial a solicitar de vocês: eu gostaria que cada um de vocês escrevesse uma história sobre nossa cidade. Pode ser em versos, uma redação, uma peça de teatro… Quando eu voltar, verei o que vocês fizeram; combinado? Pra vocês, que ficam por aqui, meu muito obrigado e quem já aprendeu a canção pode cantar comigo.

(canta a musica de despedida)

Vamos brincar de teatro

Vamos brincar de ser,

Viver muitos personagens

Nessa viagem e assim crescer.

O palco é a rua, a sala,

A praça ou o nosso quintal

A história a gente inventa

Ou conta aquela já bem contada

Que recontada, não tem igual!

(DÁ ADEUS AO PÚBLICO)

Tchau, pessoal! Adeus! Em breve estarei de volta. Até a próxima!

Valdo Resende,  concluído em Março/2016.

Arte na Comunidade 4 nas Ruas de Cruzeiro

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O personagem Pedro Menestrel  é lembrado no desfile

Acontecimento inusitado – e feliz! – para todos nós, do Arte na Comunidade nesse dia 7 de setembro. Creio que nenhum de nós tenha pensado algum dia em ver citações do nosso projeto em um desfile lembrando a Independência. Foi o que ocorreu em Cruzeiro, no Vale do Paraíba. Um grupo de alunos da Escola Professor Joaquim Rebouças de Carvalho Netto  lembrou personagens apresentados nas montagens do Arte na Comunidade 4 e mais levaram para as ruas peixes feitos em origami, aprendidos durante o projeto, para lembrar a necessidade de limpar e preservar o Rio Paraíba do Sul.

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Crianças recriam personagens da lenda da Amantikir, nossa Serra da Mantiqueira

Faz pouco tempo. Relatando as estreias do Projeto Arte na Comunidade 4 em Cruzeiro e Queluz, ressaltei o tipo de herança que nós, todos os envolvidos, queremos deixar. Nosso Projeto busca resgatar hábitos culturais, valorizar a história, preservar o ambiente. Fazemos isso contando e representando histórias, estimulando a criação dessas pelas crianças que, também, são convidadas a realizar atividades pertinentes aos temas abordados.

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Peixes em origami, distribuidos durante o desfile

No dia 9 de maio, em Cruzeiro, vi uma das apresentações feitas por Rodolfo Oliveira na Escola Professor Joaquim Rebouças C. Netto interpretando “O Viajante do Embaú”. Tanto alunos quanto professores mostraram-se atentos e satisfeitos com a montagem e agora, temos certeza, gostaram o bastante para levar em frente, recriando momentos das peças para o desfile pelas ruas da cidade.

Quero registrar aqui, em nome de toda a equipe realizadora do Arte na Comunidade 4, o mais profundo agradecimento por essa carinhosa homenagem. O que nos move é, com certeza, o desejo por um mundo melhor e, para isso, a parceria com professores e educadores é fundamental. Também cabe lembrar o apoio das Secretarias de Educação, das autoridades de cada cidade e dos nossos patrocinadores. Todos sonhamos com um mundo melhor e todos nós buscamos semear, conforme nossas aptidões e possibilidades, ideias e ações para um futuro mais digno. O desfile da Escola Professor Joaquim Rebouças de Carvalho Netto foi um alentador sinal de que estamos no rumo certo.

Até mais!

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Nota: Idealizado por Sonia Kavantan, o Projeto Arte na Comunidade 4 é patrocinado pela Alupar e Taesa e apoiado pela Usinas Queluz e Lavrinhas; uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.

As fotos deste post foram originalmente publicadas por Rodolfo Oliveira (Obrigado!)

Domingo, Mostra Teatral em Queluz – SP

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Rodolfo Oliveira, Conrado Sardinha e Luciana Fonseca. Elenco de “Os Piraquaras do Vale do Paraíba”  (Foto Divulgação). 

“Histórias para a hora do não”, de Carla Fioroni, direção de João Acaiabe é a peça convidada na Mostra Teatral do Projeto Arte na Comunidade 4 em Queluz, no próximo domingo, dia 28, às 14h30. No elenco estão Carla Fioroni e Katherine Zavagnison. O evento será aberto com a apresentação de “Os Piraquaras do Vale do Paraíba”. Escrita e dirigida por Valdo Resende, a montagem conta com os atores Conrado Sardinha, Luciana Fonseca e Rodolfo Oliveira. Composição e direção musical é de Flávio Monteiro e os figurinos são de Carol Badra

Patrocinados pela Alupar e Taesa e apoiado pela Usinas Queluz e Lavrinhas, o projeto Arte na Comunidade 4 é uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.

Conheça outros detalhes abaixo.

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Teatro valoriza o Rio e os Piraquaras do Paraíba do Sul

 

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O Rio Paraíba e a estrada de ferro, no município de Lavrinhas – SP

A montagem “Os Piraquaras do Vale do Paraíba” está na Mostra Teatral que encerra a passagem do Projeto Arte na Comunidade 4 pela cidades de Lavrinhas, Cruzeiro e Queluz, no interior de São Paulo. Teatro dentro do teatro, as personagens são atores que nasceram na região e que também são poetas, menestréis, bardos, trovadores, contando fatos em prosa e verso, além de apresentar cenas valorizando aspectos históricos e culturais do Vale do Paraíba.

A Serra da Mantiqueira, a estrada de Ferro, a Revolução de 1932, a Via Dutra estão presentes em cenas onde os atores mudam de personagem durante a ação, agilizando a narrativa e evidenciando o jogo teatral, elemento que permeou todo o trabalho do Arte da Comunidade 4 na região. Personagens do folclore são citados assim como a importância dos acontecimentos religiosos que tornaram famoso o Rio Paraíba do Sul.

O progresso e o crescimento de todo o Vale do Paraíba teve consequências que vem de longe, como o desmatamento da Serra da Mantiqueira e, mais recente, a poluição dos rios. Somando história e cultura regional às questões ambientais, ganha destaque na peça o cuidado que se deve dispensar ao meio ambiente. Piraquaras são os habitantes ribeirinhos do Rio Paraíba do Sul. A peça resgata a expressão carinhosa que identifica pescadores, lavradores e demais ribeirinhos do Paraíba e pede cuidado para com os rios, fundamentais para a sobrevivência de todos nós.

Durante as primeiras fases do Projeto Arte na Comunidade 4, nas escolas das cidades participantes, nossos atores ensinaram aos alunos peixes confeccionados em origami, a técnica japonesa para dobradura. Durante a mostra intensificam a campanha iniciada nas escolas pedindo que cada criança faça um peixe com dobradura e dê de presente a quem sujar o rio. Um alerta para enfatizar a vida que se perde com a poluição.

Escrita e dirigida por Valdo Resende, Os Piraquaras do Paraíba conta com os atores Conrado Sardinha, Luciana Fonseca e Rodolfo Oliveira. Composição e direção musical é de Flávio Monteiro e os figurinos são de Carol Badra

Idealizado por Sonia Kavantan, o Projeto Arte na Comunidade é patrocinado pela Alupar e Taesa e apoiado pela Usinas Queluz e Lavrinhas; é uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.

E agora, Queluz!

Queluz SP

No próximo domingo, dia 28 de agosto, das 14h30 às 18h00, no Espaço de Eventos 8 de Março teremos a Mostra Teatral que encerra o Projeto Arte na Comunidade 4 na cidade de Queluz, no Vale do Paraíba. “Histórias para a hora do não”, de Carla Fioroni, com direção de João Acaiabe está na programação que também terá a apresentação de “Os Piraquaras do Vale do Paraíba”, texto e direção de Valdo Resende, autor também do poema abaixo:

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Queluz (sp) Fotos Valdo Resende

 

A NOSSA QUELUZ

Queluz, no vale do Paraíba,

É minha cidade natal.

Não confunda, meu amigo,

Com a outra de Portugal.

Aquela é cidade de reis

A nossa, bem brasileira,

Para nós é sempre a primeira.

São duas belas cidades

Quem conhece assim afirma

No meu coração não tem igual

Por isso repito e te peço

Não confunda, meu amigo,

Com a outra de Portugal.

A montagem de Os Piraquaras do Vale do Paraíba foi feita exclusivamente para o encerramento do Arte na Comunidade 4. No elenco estão Conrado Sardinha, Luciana Fonseca e Rodolfo Oliveira. As músicas são de Flávio Monteiro e os figurinos de Carol Badra.

O Projeto Arte na Comunidade, idealizado por Sonia Kavantan, tem patrocínio da Alupar e Taesa, via Ministério da Cultura e Apoio Cultural das Usinas de Queluz e Lavrinhas. É uma realização da Kavatant & Associados.

Todos estão convidados!

E a menina cantou nossa canção!

Últimos ensaios de “Os Piraquaras do Vale do Paraíba” na cidade de Cruzeiro. Tomo o ônibus de volta para São Paulo e divido o assento com uma garota morena, de onze, doze anos de idade. Os pais, nos bancos da frente, colocaram a menina sem dar muita atenção ao acompanhante. Quase que instintivamente pensei na possibilidade de perturbações, mas mudei de ideia quando a menina, percebendo que a mãe falava muito alto ao telefone pediu, educadamente, para a mulher falar mais baixo. Arrumou-se e ficou quietinha enquanto tentei me distrair com um livro.

A Via Dutra apresentando o rotineiro pôr de sol atrás da Mantiqueira enquanto, à nossa esquerda um garoto, com uma tosse forte, profunda, ininterrupta, fez-me lembrar de outras épocas quando tal situação culminava com estadias nos sanatórios de Campos do Jordão, ali mesmo, no meio da Serra. A garotinha puxou assunto: “- Minha mãe também tosse assim. Sempre!”. E emendou, olhando meu livro: “- Você vai ler tudo isso, página por página?” Acenei que sim e ela: “- Eu gostaria de ler. Um dia vou gostar”. Achei a resposta engraçada e resolvi conversar com a garota: – Sua professora não indica livros, não pede leituras? “- Que ano você acha que estou?”

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Conrado Sardinha na Dr. Arnolfo Azevedo; onde estará minha nova amiga?

Eu olhei e chutei. Terceira? Não, quinta série, ela respondeu e informou estudar na Doutor Arnolfo Azevedo, em Cruzeiro. A escola entrou para a história por ter sido o local onde assinaram documentos dando por fim a Revolução de 1932. Conrado Sardinha esteve lá apresentando as montagens do Arte na Comunidade 4. Resolvi perguntar se ela havia visto e o que se lembrava das peças. Para minha surpresa a menina começou a cantarolar:

Vamos brincar de teatro

Vamos brincar de ser

Viver muitos personagens

Nessa viagem e assim crescer…

Ela não tinha certeza da segunda parte e eu, já emocionado, cantei com ela:

O palco é a rua, a sala,

A praça ou o nosso quintal.

A história a gente inventa

Ou conta aquela, já bem contada,

Que recontada, não tem igual.

Sábado à tarde, pôr de sol na Via Dutra. Uma garotinha cantando a música que fiz em parceria com Flávio Monteiro. Ela, sem perceber minha emoção, disse adorar o nome Menestrel.  “– É muito bonita essa palavra, Menestrel! Como era o primeiro nome do moço?” Pedro, Pedro Menestrel, respondi. E abrindo o celular mostrei fotos dos nossos ensaios, do Flávio e do Pedro, que na escola dela foi interpretado por Conrado Sardinha. “– Como, Conrado Sardinha? Por que mudar o nome?” Pedro é a personagem; Conrado é o nosso ator. “- Ele é muito bom! Engraçado!” Tenho certeza de que Conrado irá gostar, informei.

Já íntimos, mostrei fotos também de Rodolfo Oliveira, em Lavrinhas, e da Luciana Fonseca, em Queluz. Convidei a garota para nossa apresentação, no próximo sábado, dia 20, em Cruzeiro, na Praça da Rua 7. – Pede para o teu pai te levar! Foi o único momento em que ela mudou o semblante. “- Ele não é meu pai, é padrasto.” Preferi não identificar o sentimento com que concluiu a informação, como se fosse uma pequena vingança: “- Ele é muito mais velho que a minha mãe”.

O garoto, do outro lado, não parava de tossir, encolhido na poltrona. E minha companheira de viagem, esquecendo o padrasto, perguntou por que ele não se deitava, já que estava sozinho em duas poltronas. E de novo mudou de assunto, perguntando como se escreve Resende. Eu informei e a pequena, ardilosa, fingiu não entender, pedindo-me para que mostrasse no Facebook. Em seguida, já na minha página, ela falou-me o próprio nome e pediu que eu pesquisasse, para vê-la. Obedeci; olhamos algumas fotos e ela, confirmando o ardil: “- Me adiciona! É ali, no canto. Clica ali”.

Sábado estaremos em Cruzeiro. Espero rever minha nova amiguinha. Cansados de fotos, peças, mesmo com as tossidas do garoto, tiramos um cochilo, acordando já em São Paulo, em plena Marginal. Logo ela se foi no burburinho da rodoviária, sem olhar para trás, e eu voltei para casa, feliz! Há uma garota que canta a letra que escrevi, musicada por Flávio Monteiro. Há uma criança que acha Menestrel um lindo nome e que dificilmente irá se esquecer de Conrado Sardinha. Esse é o nosso trabalho, no Arte na Comunidade. Povoar cabecinhas de histórias e de boas lembranças. É isso que faz com que nos sintamos realizados, felizes.

Até mais