País que valoriza as artes é outra coisa! Vejam essa: entrou em vigor no final do mês de junho lei que determina a exibição nas escolas de um mínimo de duas horas de filmes produzidos no Brasil. Documentários, roteiros originais, adaptações… Tudo para contribuir na formação das nossas crianças. Detalhe interessantíssimo: 43.000 mil escolas não têm televisão! 48.000 escolas não têm DVD!
Nosso país nunca deixou de preocupar-se com o ensino das artes; o problema é que primeiro entram com o bolo, para depois pensar no que comemorar. Também é possível pensar que primeiro oferecem a casa, agora quanto ao terreno para a construção da mesma… Tudo parece um jogo político onde vale o que é dito; a realidade é outra coisa. É fácil arrotar grosso e afirmar que “garantimos duas horas mensais de exibição de filmes para nossos alunos”; omite-se a falta de aparelhos e tudo bem.
Que nenhum mal informado de plantão venha creditar tal postura ao PT. A história está aí, para lembrar, por exemplo, que em 1961, foi instituída a Educação Artística em nosso país. Nesse ano estava saindo Juscelino Kubitschek de Oliveira, entrando o Sr. Jânio da Silva Quadros que, renunciando, deu o lugar para João Belchior Marques Goulart. Na lei de então ficou determinado que um único professor entraria em sala de aula para ensinar música, teatro, artes plásticas, dança, enfim todas as modalidades artísticas. A Educação Artística, por decreto, criou o professor polivalente. O resultado pode ser comprovado por aí… Temos uma população que sabe tanto de arte quanto de física quântica.
A Lei de Diretrizes e Bases vigente para a educação nacional, de 1996 (Senhores, nesta data nosso presidente era Fernando Henrique Cardoso), acabou com a Educação Artística ao determinar a volta do professor especialista em determinada forma ou expressão artística. Lindo! Se antes não tínhamos professores com formação adequada para o ensino da Educação Artística, agora não temos professores suficientes para ensinar cada uma das formas artísticas. O cálculo é interessante: temos mais de 190 mil escolas no país. Não dá para afirmar que temos 190 mil professores de música, outro tanto de dança, mais outro tanto de teatro ou artes plásticas.
Tudo indica que há uma turma que se perpetua no alto escalão da educação nacional, determinando bobagens. Não temos quantidade suficiente de professores de arte, mas temos uma lei que determina o ensino por especialista de cada uma das formas artísticas. Não temos aparelhos de televisão (olha só que precariedade!), mas temos lei que obriga a exibição de filmes.
Em passado recente diríamos: – É este o país que pretende sediar a Copa? Pois é; sediou com sucesso e, com certeza, fará uma belíssima Olimpíada. Então, enquanto aguardamos o próximo evento mundial fica determinado: Assistirão filmes na escola os alunos cuja escola tem TV. Os outros ficarão sem tal atividade. Simples assim. Afinal, é provável que esses mesmos alunos ainda não tenham tido um professor de história e cultura afro-brasileira. É! Não entendeu? Pois bem, a legislação vigente também determina um professor de história e cultura afro-brasileira nas salas de aula do país! Este é ou não é o país da Copa?
Hoje recebi uma solicitação com cheiro de ameaça, de recriminação. Algo tipo “quero só ver até quando você deixará de opinar sobre o BBB”. Revidei, quase asperamente, que meu silêncio sobre o tema já é uma tomada de posição. E pensei em repetir as ladainhas costumeiras tipo “desligue a televisão”, “mude de canal” e etc.. O poeta José Régio,que admiro, escreveu: “só vou por onde me levam os meus próprios passos…”. Portanto, posso começar pedindo para que deixem o BBB em paz.
Para criticar um “reality show” o correto é estabelecer um padrão (do que seja um bom programa desse tipo), ou buscar uma base que sustente comparações. Sabemos que um programa é ruim, porque temos noção do que seja um programa bom. No caso do BBB, me parece que a Rede Globo dá de dez a zero na concorrência e até na matriz, de onde veio o programa. Ou seja: o programa é bem feito, bem editado, bem comercializado, bem apresentado e, evidente, cheio de gente bonita.
Se tecnicamente o programa é bem feito, resta ir buscar o motivo de tantas críticas. Parece que o conteúdo e o comportamento, expresso pelos participantes concorrentes, seja o maior problema. Aqui cabe lembrar alguns versos de Caetano Veloso:
Quando eu te encarei frente a frente
Não vi o meu rosto
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho…
Acontece – e está aqui o maior problema – que o programa é espelho sim. Um perturbador espelho de um tipo de jovem que anda por aí. Os participantes buscam de tal forma o prazer que só não são totalmente hedonistas por enfrentarem provas que provocam desconforto e não são, nem um pouco, prazerosas. Até parece que nossos jovens, fora dos espaços televisivos não saem, vorazes, buscando prazer a qualquer custo…
O que vemos é algo muito semelhante a nós mesmos.
Pelo programa já passou gente de todo tipo. Semianalfabetos, alfabetizados, ricos, pobres, bonitos, feios, certinhos, desbocados, comportados, irresponsáveis… Jovens exatamente iguais aos que encontramos por aí. Nem mais, nem menos. E sendo eles mesmos concorrem ao grande prêmio que será conquistado após festas, namoros, algumas brigas, banhos de piscina, sessões de ginástica…, enfim, muito prazer e vida boa.
O indivíduo denominado BBB poderia estar entre as pessoas das relações de qualquer um de nós: irmão, sobrinho, filho, amigo, conhecido… Essa proximidade, essa semelhança, está entre o que incomoda aos críticos ferrenhos do programa?
Os concorrentes do BBB participam de festas, ganham carros e, entre outros, o prêmio máximo, “sem fazer nada”. E há um montão de outros, aqui de fora, que também não fazem nada, exceto críticas ferrenhas, às vezes indelicadas. Resta perguntar, para cada crítico do programa, quais ações pessoais cotidianas estão sendo realizadas. Certamente leem livros, muitos livros. Nunca bebem, pois estão sempre nos cultos religiosos esperando o casamento para realizar atos sexuais para procriação. Trabalham, nas horas vagas, em asilos, orfanatos e, enfim, jamais assistem ao BBB porque desligam a TV, ou mudam de canal. É isso?
A semana está começando. Gente comum pode sonhar com a loteria. Gente jovem e bonita sonha em participar do BBB. Uns poucos estão lá e um sairá com uma bela grana. Todos os que não estão no programa podem fazer um milhão de outras coisas, inclusive ver televisão. Certo que continuarão as críticas; mas, qual a base? Qual o padrão comparativo? O que fazemos, realmente, no nosso cotidiano que nos torna diferentes de um BBB?