Quando fiz faculdade, perto de onde supostamente D. Pedro deu o grito, corria um boato de que ao comer um único pastel de feira equivaleria ao sujeito o mesmo que consumir 400 cigarros. Não sei de qual marca. Para tal afirmativa utilizava-se um argumento de autoridade: havia sido um estudo da USP.
Pastel de feira é uma delícia! Popular, barato e temperado com insondáveis iguarias. Na feira que mais frequentei, a barraca do pastel fica às margens da Avenida Brigadeiro Luiz Antônio, ao lado de um corredor por onde trafegam incontáveis ônibus. Estes sobem e nas demais pistas descem caminhões, peruas, carros, motos, alguns veículos expelindo resultados da queima de óleo, gasolina, aditivos, deixando o ar bastante peculiar. O mesmo ar sobre os tachos onde são fritos os pasteis, em óleo trocado diariamente. Só aposta ser verdade essa troca a Velhinha de Taubaté, crédula personagem de Luís Fernando Veríssimo.
Pessoal que frequenta feira livre costuma falar alto, para ser ouvido pelos feirantes que, sem mais nem menos, costumam berrar ofertas. Do outro lado e sem muito recato costuma-se gritar o sabor do pastel desejado. As falas às vezes em conflito com o motor de algum veículo, mais problemas de dicção, desvios dentários, questões de emissão e sei lá mais o que, lançam perdigotos. A gente finge não perceber, mas alguns irão parar no óleo fervente. Um alívio, posto que acreditamos ser o óleo fervente capaz de matar minúsculos e indesejáveis seres.
Quando o alimento do dia é pastel, Euzinho, confiante nos cuidados divinos ataco logo dois. Já tive dias melhores, com dois e meio, três. Depende do tamanho. Feliz com meu pastel de queijo e meu copo com caldo de cana, nada me perturba. Quer dizer, exceto quando tenho que dividir companhia no balcão da barraca com qualquer político que seja. Outro dia fingimos não conhecer uma senhora loira, cheia de assessores, candidata a deputada. Não é porque o ser aparece atrás de votos, invadindo minha serenidade pasteleira que lhe darei atenção.
Pior que político comendo pastel de feira é o que traz a avó para a propaganda eleitoral. Que filho da puta! Não é segredo estar nos meus 67 anos. E convivo com iguais. Tenho me encontrado cotidianamente com uma senhorinha que, braço recém quebrado, ainda na tipoia, está sempre sozinha. Casais de idosos passeiam pela praia, outros pelos jardins. Sempre sós. A questão primordial é que, fora da campanha, durante os quatro ou oito anos de mandato, onde estão os avós dos candidatos?
É conveniente mostrar empatia, devem ensinar os “coachs” dos nossos candidatos: Finja que sente prazer em caminhar por ruas lotadas, abraçando e cumprimentando desconhecidos. Coma pastel, ou qualquer gororoba que ofereçam! Entre em uma igreja, fale de Deus, de um time de futebol, fale da família. E no quesito família, valor máximo, apresente sua vovozinha ao mundo!
Não me incomodam as alianças entre antigos rivais. Afinal, quantos namorados, temporariamente tornados inimigos, não reataram? Também, não me afeta saber que inimigos caminham juntos, pois a gente sabe quantos desafetos convivem na sagrada família. É conveniente conviver com os parentes da esposa, do marido. Mesmo quando insuportáveis! Conviver com a diferença, mais que conveniência, é necessidade. Como tudo tem limite, os meus estão expostos. Quer meu voto? Deixe tua avó em paz. E vá comer pastel em outra freguesia! Ah! E não me cumprimente se me encontrar na rua. Não falo com estranhos.