Com uma notícia assim, posso afirmar que o dia não começou bem: “O cantor Wando morreu nesta quarta-feira, aos 66 anos, em decorrência de infarto seguido de uma parada cardíaca, confirmou a assessoria do hospital Biocor. Ele estava internado desde o dia 27 de janeiro no hospital Biocor, em Nova Lima (MG)”.
Escrevi uma história, publicada originalmente no Papolog. Uma ficção para justificar o hábito de fãs em jogar calcinhas para o cantor e compositor. Republico abaixo a história. Uma sincera homenagem ao mineiro Wando.
CALCINHAS PARA WANDO
Quem já deu uma olhada nos comentários desses posts conhece Meri Aparecida, irmã da Maria Aparecida, a moça dos croquetes. É, a família é assim: Maria, Meri e o irmão, Mário Aparecido. Os pais, mineiros devotos, atendem por Marta e Mauro e continuaram a sina dos “Ms”; hoje vivem amuados, pois reservaram Márcia Aparecida, Mauro Aparecido e outros “Ms Aparecidos” para os netos, mas os filhos continuam sem dar-lhes a sonhada continuidade familiar.
Meri vive sob tranqüilizantes, trabalhando em Uberaba, de onde sai apenas para assistir aos shows do WANDO. Trabalha continuamente, nos horários de folga, realizando uma tarefa que considera sagrada. –“É tudo para o meu grande amor” revela, entre uma peça e outra.
“Um amor quando se vai, deixa a marca da paixão feito cio de uma loba
Feito uivo de um cão, é feitiço que não sai, dilacera o coração
É um nó que não desmancha, é viver sem ter razão
Chora, coração, chora coração, passarinho na gaiola, feito gente na prisão.”
Vanilda sempre diz: – “A Meri não tinha estrutura pra nos acompanhar, “tadinha”; surtou! Fica lá, no meio de todas aquelas calcinhas.” Então; Meri cria calcinhas constantemente. Calcinhas de lantejoulas, de seda, de tricô, de jeans; calcinhas minúsculas como biquíni, grandes, calçolas que mais parecem ceroulas. Termina de fazer e já corre pro tanque. Lava, seca, perfuma e guarda, em uma arca que mandou fazer, com o formato de um grande coração.
Moça, eu sei que já não é pura,
teu passado é tão forte
pode até machucar
Moça, dobre as mangas do tempo
Jogue o teu sentimento
Todo em minhas mãos
Meri, Vanilda e Maria costumavam sair juntas, em São Paulo; iam a shows, teatro, festas juvenis. Separaram-se para fazer Universidade. Vanilda e Maria Aparecida foram para Assis, no interior do estado e Meri foi fazer corte e costura, em famosa escola de freiras, aqui de Sampa. Foi durante esse curso que Meri tomou-se de amores por WANDO, o mineiro de Cajuri.
Em férias ou feriados prolongados as três voltavam a sair e Vanilda, já começara a curtir uma vodka, enquanto Maria Aparecida passou a consumir rabo de galo e Meri, água pura. É bom frisar que as duas primeiras nunca foram alcoólatras. Chegadas em um copo! Ser bêbado é outra coisa. Mas as duas contam que notaram, desde uma primeira vez: quando Meri, por delicadeza, tomava um gole de qualquer bebida alcoólica, entrava em delírios, imaginando-se com WANDO.
Eu te quero assim,
fazendo uma cama
Na nossa banheira
Fazendo por cima
De lado, ou de beira
Pedindo me espere
Que eu quero mais…
Quando nesse estado, Meri agarrava o rapaz mais próximo; WANDO foi… vários: um alemão parrudo e gay, que fugiu assustado com as investidas de Meri; um cearense que perseguiu-a por semanas, peixeira às vistas, inconformado por ter sido deixado de lado quando o delírio de Meri passou e mais; um japonês, um garçom gago, que imitava FRANK SINATRA, e, é claro, o barman, entre muitos outros.
Não tinha jeito. A noite começava serena e calma, até que Meri, longe da vigilância das amigas, aceitava o gole de muitos que, interessados nos belos seios da moça, ofereciam bebida na esperança que, no surto, ela caísse nos braços do dono do copo. Era Meri beber e o WANDO baixar. Pra acelerar, muitas vezes, o próprio interessado em Meri cantarolava:
Deixa eu te amar
Faz de conta que sou o primeiro
Na beleza desse teu olhar
Eu quero estar o tempo inteiro…
Até que um dia Meri foi assistir seu ídolo, em uma grande casa de shows de São Paulo. Foram dias intensos de preparativos. Meri sonhava o tempo todo em ver seu ídolo de perto. As outras duas, Vanilda e Maria Aparecida, foram juntas, mais para impedir Meri de beber o primeiro gole que, propriamente, interessadas no show.
Chegado o grande dia, as três, produzidas e entusiasmadas, felizes por terem conseguido lugares bem em frente ao palco. O show corria tranqüilo, com o romantismo de WANDO derramando-se pela platéia. Maria Aparecida tinha conseguido entrar no recinto com uma bandeja de croquetes para presentear o cantor e compositor. Meri, só permitiu tal ato após Maria prometer que diria ter sido Meri a fazer o mimo para o ídolo. Em um dado momento, WANDO cantou:
Vem cá gostosa, sensual e saborosa
Delicada, carinhosa, vem que eu sei o que fazer
Não me provoque com seu jeito de fogosa
Que eu me encaixo nessas coxas, faço tudo com você
Levante a saia e me guarde bem de baixo
Vem por cima, vem por baixo, que eu te dou o meu querer
Maria Aparecida, que passara todo o tempo enxugando os copos próximos de Meri, para evitar que esta surtasse, estava pra lá de bêbada. Não pensou duas vezes ao ouvir WANDO chamando ( – Era a mim que ele chamava! Juro, Vavá!); levantou a saia, tirou a calcinha e jogou sobre o palco. Ato contínuo, dezenas de outras calcinhas foram atiradas sobre o cantor.
Foi Vanilda quem notou o desespero de Meri. Esta tinha ido ao show de “fusô” justíssimo, de malha vermelha e, para evitar marcas, estava sem calcinha. Todo o final da música e depois, durante o resto do show, ocorreu uma luta entre Vanilda e Meri, a primeira impedindo que a outra tirasse e jogasse o “fuso” sobre o palco. WANDO continuou:
Senhorita, senhorita
Meu amor, minha razão
Minha honra, meu orgulho
Tens agora em tuas mãos…
Maria Aparecida debruçada sobre o palco, Meri insistindo em tirar o “fuso” e Vanilda tentando impedí-la. As duas acabaram se atracando, puxões de cabelo, beliscões, chutes, gritos, muitos gritos e Vanilda, todo mundo sabe, liberou seu vocabulário de palavrões, palavrões, palavrões… Não deu outra; as duas foram tiradas do recinto, pelos seguranças, enquanto Meri gritava: – “Me larga! Eu quero dar pra ele! Eu quero dar pra ele!”
Final do show. Vanilda, segurando Meri na porta do local, querendo dar umas bifas em Maria Aparecida, que fingiu não conhecer as duas, quando essas se atracaram e ainda foi, ao final do show, tentar entregar seus croquetes para WANDO. Meri, chorando desesperada, só fazia cantar a música de seu ídolo.
Vê, coração bandido
O que fez comigo
Você maltratou
Acreditei, eu ouvi promessas…
Meri nunca mais foi a mesma. Ficou meses sem falar com as outras duas. Com Maria Aparecida, por sentir-se traída, quando a irmã jogou a peça íntima para o “seu amor”; com Vanilda, pelas razões óbvias. Voltando para casa pegou uma tesoura e cortou o “fuso” em pedaços e, desses, fez suas primeiras calcinhas para WANDO. Jurou, sob lágrimas, que jamais ficaria sem calcinhas para jogar sobre seu ídolo. Costurava e cantarolava…
Você é luz
É raio estrela e luar
Manhã de sol
Meu iaiá, meu ioiô…
É assim, desde então. Refugiada em Uberaba, onde trabalha como fotógrafa especializada em imagens de gado zebu. Em todas as horas de folga tece, corta, monta e guarda as calcinhas na arca em forma de coração. Quando acontece show de WANDO, em qualquer parte do Brasil, de carro, ônibus ou avião, Meri parte, calcinhas na bagagem, para serem jogadas sobre seu ídolo. Terminado o show, ela volta para fazer outras, sempre com a esperança de um dia WANDO tirar a que estiver usando.
Ela só liberou a história, na esperança de que o artista, conhecendo o caso, atenda seus desejos. O que é que eu não faço pelas minhas amigas?
Até!
Notas musicais:
Chora coração (1985), Moça (1975), Safada (1996), Deixa eu te amar (1997), Gostosa (1997), Senhorita, Senhorita (1977), Vê, Coração bandido (1976) Fogo e Paixão (1985), todas do repertório de WANDO.
Publicado originalmente em blog, no Papolog.