Noite de Creedence, tico-tico e frio!

creedence

Tudo tinha começado perfeito após ampla e meticulosa preparação pra uma noite quente composta pelo tripé “Drogas, sexo e rock and roll”. No quesito drogas a opção recaiu sobre cigarros e vodca. No item rock and roll, algo mais suave, para noites de frio, tipo Creedence Clearwater Revival; para o sexo Vanilda, a tatuada, havia encontrado o parceiro certo: um italiano legítimo do Brás paulistano, barba cerrada, olhos verdes e cheio de amor para dividir. Vanilda cantarolou por todo o dia:

Hey, tonight

Gonna be tonight

Don’t you know i’m flyin

Tonight, tonight…

Vanilda já esteve mais presente neste blog.  Muito trabalho, um pouco de solidão voluntária ( -Só tem homem porcaria dando sopa, Vavá! Os interessantes têm dona ou dono…). Enfrentando o inverno rigoroso deste ano, a moça resolveu sair da toca, embora com critérios: “- Sexo, Vavá, só com qualidade!” De preferência, completei por ela, com um parceiro jovem e tarado. Virando os olhos e simulando desdém, minha amiga limitou-se a responder: “- Óbvio!”.

Claro que tratando-se de Vanilda, hibernar significa doses generosas de vodca, palavrões direcionados ao clima e discos nacionais com boa música. O que me causou espanto foi a escolha do já quase distante CREEDENCE, com sua música do final dos anos sessenta, início dos 70. Informando ter conhecido o italiano em um site de relacionamento, em sala de bate-papo sobre o festival de Woodstock, optou por um clima musical pertinente. Antes de ouvir minha censura pela paquera virtual, Vanilda tratou de dar a ficha do moço: amigo do amigo, primo do amigo, vizinho do amigo… Portanto, gente conhecida e quase de confiança.

Santo Deus! Essas redes virtuais que elevam fotos e nomes à categoria de amigos! O fato é que Vanilda e o amigo de um monte de amigos marcaram um encontro real, ocorrido recentemente, em uma rara noite sem passeada. Preparando-se, Vanilda enfrentou uma funilaria completa: fez pé, mão, esfoliação, hidratação, depilação, massagem e, lindamente renovada, foi ao supermercado. Comprou vodca, uísque, mais vodca, um guaraná, outra vodca – agora uma russa autêntica – e, vai que a noite pedisse algumas cervejas… Comprou uma dúzia. Com certa censura perguntei: – E a comida, mulher? Ela, sorrindo, lembrou novamente a banda americana. “- Vavá! Comida… Basta um feitiço, meu querido…”

I put a spell on you

Because you’re mine.

You better stop

The things that you’redoing…

Vanilda, eu soube depois, continuando a preparação da grande noite, cuidou do ambiente com orquídeas de diferentes cores e tipos, rodeadas de espadas de São Jorge… “- É isso aí, Vavá! Pra ilustrar preferências e, ao mesmo tempo, contar com a ajuda do Santo”. Deixou velas à mão, caso o moço fosse tímido, pois ela adora fazer tudo às claras. “- Não gosto de perder detalhes, você sabe!” e vestiu-se com um vestido leve, sem botão, zíper ou qualquer outro empecilho que a impedisse de livrar-se rapidamente do mesmo.

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Pontual, o rapaz chegou armado com uma caixa de bombons para, como ele fez questão de frisar, “o depois”, com uma piscadinha de cafajeste. Vanilda fingiu não ver a piscada obscena e, grata pela ausência da ansiedade da espera, roçou suas cinco tatuagens pelo corpo do rapaz (Para quem não sabe, as tatuagens de Vanilda estão na nuca, tronco e membros…). Ciente de sua capacidade em enfeitiçar, cantarolou um trecho de “The Night Time is The Right Time”, enquanto puxou o moçoilo para o sofá, para um primeiro round:

You know the night time, oh, is the right time

To be with the one you love

I said the night time, oh, is the right time

To be with the one you love…

Em seguida, enquanto Vanilda preparava nova dose de vodca, com gelo e laranja, o italiano do Brás, mexendo em alguns discos sobre a mesa de centro, encontrou um single de DANIELA MERCURY. Entusiasmado, pediu para ouvir a faixa e Vanilda, contrariada, pois estava no clima CREEDENCE CLEARWATER REVIVAL, resolveu consentir. Antes que a baiana rodasse a saia e soltasse a voz, o rapaz cochichou para Vanilda: “- Feche os olhos!”. Vanilda obedeceu e a música rodou:

Tico-tico-rei

Um tico-tico tá

Ta outra vez aqui

O tico-tico ta comendo o meu fubá

O tico-tico tem, tem que se alimentar

Que vá comer umas minhocas no pomar…

As mãos do rapaz percorreram o corpo de Vanilda com a mesma rapidez da música. Ritmo de toques certeiros em pontos-chave, enlouquecendo a tatuada que não conseguia fugir – também não queria – e via-se a beira de um orgasmo monumental, sem que o rapaz lhe desse a menor chance de respirar. De repente, não eram apenas as mãos do moço a tocar o corpo de Vanilda…

Oh! Por favor, tire esse bicho do seleiro

Porque ele acaba comendo o fubá inteiro

Tira esse tico de cá, de cima do meu fubá

Tem coisa que ele pode pinicar…

Em meio ao supremo entusiasmo a temperatura explodiu no apartamento de Vanilda. As doses de vodca, “o pássaro fora do seleiro”, tudo enlouquecendo a tatuada que, pretendendo estender a euforia, soltou-se dos braços do rapaz iniciando um pega-pega entre orquídeas e espadas de São Jorge. Afoita para fugir do moço, já nua, aguardando ansiosamente ser alcançada, Vanilda resolveu dividir seu prazer com a noite e,abrindo tempestuosamente a porta para o terraço, no nono andar, expôs o corpo para a lua ausente de uma noite gelada. A corrente de ar bateu forte. Vanilda travou!

O choque térmico provocou um tremendo “revertério”. Qualquer coisa tipo nervo ciático, entrou em colapso total, travando Vanilda nua; os gemidos de prazer substituídos por outros, dolorosos. O italiano – daqui para frente denominado “escroto” – caiu na gargalhada e Vanilda mandou-lhe vasos de orquídea em meio a palavrões, palavrões, palavrões…

Após expulsar o princípio de amante e arrastando-se até o telefone, Vanilda chamou-me, para levá-la ao pronto-socorro. Foi complicado enfiá-la, tortinha da silva, dentro do meu limitado Celta. Pior foi aguentar seu humor estragado, e os muitos palavrões, só porque liguei o rádio e estavam tocando Creedence:

Someone told me long ago

There’s a calm before the storm

I know, it’s been comin’for some time…

… I want now, have you ever seen the rain?

Levei minha amiga de volta ao apartamento quando a noite já ia adiantada, chuvosa e fria. Já disposta, Vanilda resolveu limpar o apartamento da lembrança da noite frustrada. Suspirando e caindo na gargalhada, ela ofereceu-me bombons, presente do italiano, enquanto agitava uma espada de São Jorge pelo ar…

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Até!

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Notas musicais:

Hey,Tonight – John Fogerty

Iput a spell on you – Screamin’ Jay Hawkins

TheNight Time is The Right Time – Roosevelt Sykes

Tico-tico no Fubá –Zequinha de Abreu e Eurico Barreiros

Haveyou ever seen the rain? – John Fogerty

(valdoresende)

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