Condomínio eterno

Soube na rua, precisamente na avenida. Manhã ensolarada, céu lindíssimo e o movimento raro para o horário, milhares de pessoas de ambos os lados esperando o féretro do Rei Pelé. Celulares armados aguardando o caminhão dos bombeiros, entre selfies e fotos esparsas havia o jornalismo amador: “Ainda não chegou”. “Fiquei três horas e meia na fila”. “Já saiu há algum tempo”. “Dizem que irá parar no Gonzaga”.

Poderia realizar uma intensa e variada lista de pessoas, suas características, a forma com que aguardavam o célebre defunto. Gente triste, gente alegre, outras apáticas, indiferentes. Ciclistas inescrupulosos em alta velocidade, cuidadores com seus animaizinhos e as inevitáveis sacolinhas com cocô, e barulho, muito barulho. Vou me deter em um sujeito, tipo avô, sentado com o neto ao lado de uma senhora que, mediante um alarme de aproximação do cortejo, saiu dando-me a chance de sentar um pouco.

Pedi licença e o sujeito me pareceu babaca: “Pode sentar, desde que não seja para ficar de mãos dadas”. Brincadeira inapropriada para o momento, a espera da última passagem de Pelé pela orla de Santos, o sujeito esclareceu estar lembrando da brincadeira infantil, as crianças sentadas, de mãos dadas, balançando as perninhas. Minimizei a bobagem e comentei com meu companheiro sobre o movimento dos helicópteros indicando a localização do cortejo. Não demorariam para chegar ao Embaré, passar pela Basílica de Santo Antônio e chegar ao ponto em que nos encontrávamos. O sujeito entrou no assunto.

“Quero distância de São Paulo. Desde que fizeram o rodoanel evito entrar na cidade. Prefiro ficar o mais longe possível”. Falávamos sobre segurança nos cemitérios onde, infelizmente, há registros de roubos frequentes. Citei a visível qualidade da urna do maior jogador de todos os tempos. “Tomara que não profanem o túmulo de Pelé. Mais que o valor material da urna haveria algum louco em querer para si o corpo do jogador?”. Foi quando ouvi a grande conquista do cidadão:

“O que é isso? Nem pensar! Lá é absolutamente seguro. É um condomínio! Comprei um jazigo para a família. Tenho direito a quatro lugares. Pago 800,00 reais do condomínio, que é bimestral. A segurança é reforçada, há jardineiros, faxineiros. Não é um cemitério qualquer, é um condomínio!”.  Operário aposentado, minha pergunta revelou meu lugar no universo social: “E depois que o senhor morrer, se deixarem de pagar o condomínio, o que acontece?” O homem me olhou contrariado: “Passam para outro. É um condomínio! Não pagando, desocupam o espaço e vendem para quem pode pagar”.

Interrompi a conversa e busquei outro lugar. Não quis saber por quanto tempo e como o sujeito garantiria verba para si e os seus terem o próprio túmulo. Percebi em seguida, e os telejornais me ajudaram a compreender, que a presença de Pelé agrega valor ao local. O nome, a história e a fama universal do nosso Rei deve garantir até mesmo a não cobrança de um condomínio.

O féretro passou em direção à casa de D. Celeste, a centenária mãe do jogador. Havia pessoas chorando acompanhando o corpo, muitas! Após uma hora e pouco a comitiva voltou, rumo ao Memorial Necrópole Ecumênica, o cemitério vertical de Santos que ainda não conheço e onde espero não ter por última morada. Mesmo bimestral, um condomínio eterno é caro demais.

O espírito da Copa baixando por aqui

Garrincha, o único “Mané”. Alegria do Povo.

Não tem pra ninguém. Daqui para a frente a prioridade e a estrela máxima passa a ser a Copa do Mundo. Tempo e espaço utilizados para a divulgação da escalação de Tite são os melhores indicadores de quem é que irá dominar o noticiário. Não adianta a atriz ajoelhar levantando aos céus imagem e preces a Nossa Senhora. Nem mesmo a presença de Lula no Egito. Nada hoje foi mais importante que os jogadores que tentarão o hexa.

Primeiro grande problema: Philippe Coutinho está no álbum, mas ficou de fora da escalação. Figurinha inútil tanto quanto o terceiro p incluso no nome, entra para a história dessa competição como o azarado que se machucou. Outros problemas virão e, a gente espera, nada tão desolador quanto morrer na praia. Que todos embarquem e partam em busca do primeiro lugar. Todos! Mas…

Sem polêmica não seria escalação para a Copa. Assim, é o que percebo, Daniel Alves passa a ser a escolha mais discutida do momento. Figurinha que esteve no álbum e ficou de fora em 2018, ele está com 39 anos e isso parece ser um problema seríssimo! Não tanto quanto o problema que são os 38 anos de Thiago Silva. Digo isso por terem questionado o Tite pelo primeiro, não pela convocação do zagueiro.  Thiago perdeu três Copas! E vai de novo!

Até parece que eu entendo de futebol. Não entendo “p.” nenhuma. Talvez por isso me seja fácil perceber que Galvão Bueno apostou na escalação de Roberto Firmino e o casal que o acompanhava no estúdio concordou com ele. Tipo se é para errar vamos com o chefe. Erraram. Eu senti falta do Gabigol. Do Flamengo foram escalados Everton Ribeiro e Pedro. Do Palmeiras, o Weverton.

Ao notar a escalação de Weverton, não deixei de notar outros nomes dignos de uma escalação do Stanislaw Ponte Preta: Militão e Paquetá. O Militão é o zagueiro que deveria estar como meio-campista, que é lugar ideal para militar um “avante povo rumo ao gol”. Já Paquetá (esse nome é o máximo!) deveria sair do meio campo e ficar como zagueiro. Um zagueiro “paquetá” atacante adversário…

Bom, reiterando, nosso noticiário fez com que a lista de Tite fosse mais importante que qualquer outra coisa no planeta. Vide os raros minutos dados ao COP 27, a Conferência do Clima da ONU. Também mereceram espaços menores a prisão do político estuprador de uma menor, a morte do assassino da Daniela Perez e o julgamento da pastora envolvida no assassinato do marido. No meio de tudo, o cara que acabou de perder as eleições deve estar comemorando a Copa, com esperança de que esqueçamos as listas de sigilos que nos foram impostas, ou que não continuaremos exigindo justiça em relação aos crimes cometidos durante a gestão ainda por terminar. Copa à parte, anistia jamais!

Para fechar o início da semana com o bom astral esportivo, presto homenagens para nossas duas campeãs mundiais: Rayssa Leal no skate e Rebeca Andrade na ginástica. Meninas feras! Quanto aos rapazes do futebol: ganhem! É o mínimo que nós, que ganhamos módicos salários, exigimos de quem ganha milhões. O que mais desejo é que nossos atletas, com os bolsos cheios do dinheiro europeu, enfiem um Hexa para a história da Seleção Brasileira.

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Notas:

Garrincha me faz parar para pensar em futebol enquanto arte e diversão. Optei por ilustrar esse texto com quem, entre poucos, que devemos reverenciar por todo o sempre.

Stanislaw Ponte Preta é pseudônimo de Sérgio Porto, grande cronista, jornalista e compositor brasileiro.

Uma personagem com o nome Paquetá apareceu também na Turma do Casseta. Um sujeito enorme armado com um porrete, sempre pronto a “acalmar” seus desafetos.

Futebol! Deus guarde nossos atletas.

Foto: Flávio Monteiro

Jogadores do Goiás não entraram em campo neste domingo por dez atletas do time estarem contaminados com o COVID_19. Os trâmites demoraram o suficiente para a televisão iniciar a transmissão e só depois informar a suspensão do jogo. Outro time, o Imperatriz, do Maranhão também não jogou, pois doze jogadores também receberam diagnóstico positivo para o vírus. O alagoano CSA, time da série B do Nacional substituiu oito atletas e jogou contra o Guarani. SUBSTITUIU! (Esses atletas substituídos horas antes do jogo não estavam em contato com os companheiros?).

Jogadores de futebol são atletas que contam com apoio jurídico na formulação de contratos, na administração da imagem e das atividades com publicidade, entre outros possíveis empreendimentos. Esse departamento jurídico de atletas, empresários e das próprias agremiações não conseguem barrar os interesses financeiros envolvidos nos campeonatos de futebol e aí está o imbróglio. E mais uma pergunta cabe aqui: a pandemia está sob o controle de quem? Dos interesses de quem?

Deus nos livre, só mesmo Ele. Estive ontem em uma farmácia, dessas de rede nacional. O teste para verificar como estou em relação ao vírus fica por R$ 140,00 e a profissional de plantão, simpaticíssima, informou que o mesmo tem 97% de probabilidade de acerto. Você paga na verdade de otário, pois em seguida, caso a doença se manifeste, estão aí os 3% para garantia jurídica de quem está vendendo a coisa.

Deus livre nossos jogadores! A CBF – Confederação Brasileira de Futebol, contratou o Hospital Albert Einstein que identificou erro na coleta de material e, pedindo novo material, atrasou a entrega de resultados. Essa foi a explicação para o ocorrido entre Goiás X São Paulo. Quem coletou esse material? Segundo o noticiário, o hospital (UM DOS MELHORES DO PAÍS!) já forneceu “diagnóstico positivo equivocado” de 26 jogadores do Red Bull Bragantino. O que nos leva a, mais uma vez, apelar pra Deus. Se até hospital do nível do Einstein está cometendo equívocos… Deus livre a todos nós!

OUTRA SITUAÇÃO: A do simples funcionário que, todo dia, precisa atender aos interesses de patrões desnaturados, em um país sem Ministro da Saúde e onde o Presidente, em relação à pandemia, não passa de propagandista ordinário, tentando enfiar goela abaixo dos brasileiros um remédio que, se válido, não nos teria levado a ultrapassar a marca de 100.000 óbitos.

Dá para entender as razões da morte atingir principalmente as pessoas mais vulneráveis? Precisa desenhar?Não custa refletir: mesmo errando ou atrasando o diagnóstico de um jogador de futebol, este, caindo nas garras do COVID terá o próprio Einstein para onde buscará a cura., ou outra instituição de excelência no tratamento médico. Têm dinheiro e convênio médico daqueles que cobrem até unha encravada. Aos demais, aqueles que precisam de tomar ônibus, metrô ou trem, às vezes carecendo dos três meios para chegar ao trabalho, cabe… rezar: Para que esses transportes não estejam lotados, para que consigam viajar e – milagre! – não serem contaminados. E caso sejam, que consigam pelo menos um leito vago, um tratamento digno.

MAIS OUTRA SITUAÇÃO: A dos pais empregados que, sem apoio governamental, são pressionados pelos patrões e precisam deixar os filhos na escola. Ora, se em um jogo de futebol, com 22 atletas em campo (sem contabilizar os demais) a proporção de infectados beira aos 50% (se contabilizarmos os demais essa proporção pode subir) como é que fica a cabeça de um pai, de uma mãe ao ter que encaminhar o filho para a creche, para a escola? Quem garante a saúde da criança que permanecerá em grupo durante tempo maior, bem maior, que uma partida de futebol? Não há humano que garanta imunidade e, caso o faça, está mentindo. Deus guarde e cuide das nossas crianças!

O que me leva a escrever este texto é o fato de perceber pouca atenção dada ao fato ocorrido hoje: Jogadores de futebol! Pessoas que, por definição, têm ótima saúde e, por isso mesmo, sendo profissionais de ponta do futebol nacional teriam guardado quarentena e ficado longe de possível contaminação. Atletas com altos salários, suporte jurídico, influência na mídia, se submetem aos interesses financeiros de agremiações, da própria CBF e até das empresas de comunicação, que lucram horrores com as transmissões. Será que é por isso, pela grana, que os meios não dão a real dimensão do absurdo que é constatar em atividade tantos jogadores infectados? Deus guarde nossos atletas.

Deus guarde todos nós!

Para quem quiser ver a matéria do jornal, na íntegra, clique aqui.

Até mais!

A Bola, histórias que rolam

Companheira de trabalho na peça Um Presente Para Ramiro, Isadora Petrin está em A Bola, histórias que rolam; uma peça infantil com um enredo inteligente, a estreia será no Sesc 24 de maio, bem no coração de São Paulo. Veja a seguir o material de divulgação da montagem.

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Marcela Arce e Isadora Petrin em A Bola. Foto: divulgação

O Grupo Artes Simples de Teatro estreia “A Bola – Histórias que Rolam” no Sesc 24 de Maio.

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A peça conta as várias expectativas que cada bola de futebol tem ao ser fabricada, principalmente o sonho de participar dos principais campeonatos e gramados do mundo. Durante o espetáculo, acompanhamos a bola que virou youtuber, outra que foi parar no espaço, uma terceira que não foi comprada pela Fifa, mas por garotaos que jogam futebol de várzea. Em linhas gerais, o enredo é sobre o sonho do que queremos ser quando crescer, dos caminhos que mudam e da aceitação do que a vida oferece enquanto oportunidade.

O Grupo Arte Simples De Teatro foi criado em 2006 e parte da concepção de que o teatro deve ser um bem cultural acessível a todos, acreditando que essa é a forma de se democratizar o acesso à arte.

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Com direção de Pedro Pires, estão no elenco Andréea Serrano, Eugenia Cecchini, Isadora Petrin, Marcela Arce, Marilia Miyazawa, Tatiana Eivazian e Tatiana Rehder.Direção musical e músicas originais: Adilson Rodrigues. Músicos: Fernando Stelzer e Lucas Paiva. A direção de Arte é de Kleber Montanheiro e a produção executiva de Andréea Serrano e Tatiana Rehder

SERVIÇO:
A BOLA – HISTÓRIAS QUE ROLAM – Com o Grupo Artes Simples de Teatro. Dias 14 e 15/09. Sábado e domingo, das 16h às 17h
Local: Área de Convivência (3º andar) – Sesc 24 de Maio
Duração: 55 minutos.Livre. Grátis.

SESC 24 DE MAIO – Rua 24 de Maio, 109, Centro, São Paulo
Fone: (11) 3350-6300

Todos estão convidados!

Até mais!

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A próxima atração

Depois das fotos de uma pobre mãe nua e das violações sofridas por uma rainha, o que é que vem por aí? O que poderá prender a atenção do público e fazer uma emissora de tv bater recordes de audiência? Fico pensando na moça que raspou o cabelo, nas meninas russas que se afirmam como encarnações da boneca Barbie e continuo sem a menor idéia de onde isso irá parar. Será que o silêncio do político perante a CPI vai causar o mesmo alvoroço que todas essas loiras? Não. Essa certeza é péssima.

Assim como o silencio do político mexe pouco com a audiência, a greve é outra atração indigesta. Greve, idéia geral, é um imenso incômodo. Bom, é preciso lembrar que a idéia é essa mesma: incomodar! Para sensibilizar. Para atrapalhar o comércio, a indústria; aí, os chefões chiam porque carecem do trabalhador para tocar seus negócios e é assim, só assim, que o político toma uma atitude. As reais razões de uma greve dão audiência? Sei não…

Entre as próximas atrações, tem cadeira cativa a demora na construção dos estádios para a Copa do Mundo. Um problemão nesse Brasil tão bem resolvido. Temos ótimas escolas, uma segurança pública impecável, uma imensa rede de hospitais… Esse Brasil a gente tem certeza que não existe, mas parece que a idéia é fazer de conta perante os futuros visitantes.

Já que Copa do Mundo é outra coisa, entre as próximas atrações, o futebol,… E, lamento, nessa área não consigo pensar em algo novo que possa acontecer, entre uma briga de torcidas, um roubo de juiz,  uma vitória, um empate ou, o que é repetido com frequência,  um jogo de “vida ou morte”.

A próxima atração é um caso sério. Há sempre um jogo enorme entre o que interessa para diferentes lados (o da emissora, o do anunciante, o do público), entre o que é necessário e entre o que prende a atenção. Os processos de apreensão de mensagem são variados, mas é fato que algumas palavras são tão fortes que colocam todas as outras em planos secundários. Um exemplo?  No último domingo, pesou tanto a exploração sexual sofrida pela rainha dos baixinhos que, penso eu, pouquíssimos notaram que ela não citou o pai da criança – a dela, a Sacha – nem que a moça deixou de recordar a parceria com Marlene Matos, profissional fundamental na carreira da apresentadora. E assim, porque exploração sexual é um negócio forte, nem nos tocamos que em uma entrevista com o mote “O Que Eu Vi da Vida”, a figura em destaque “não viu” o pai da própria filha…

E vamos seguindo a vida, bombardeados por novas atrações. Uma fatalidade: antes de refletir, ponderar, buscar respostas, indagações, discutir os fatos, outras atrações virão. E fico pensando na vida dura do produtor de tv, naquele responsável pela próxima atração; o que poderá nos sensibilizar? O que nos prenderá a atenção? O que levantará a audiência? Tai um trabalho dificílimo.

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Até mais!

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