Língua brasileira! Tom Zé no Mirada

Língua Brasileira: Foto:_Matheus-Jose-Maria

Neste domingo vai ser um final e tanto do Mirada, o Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas do Sesc Santos. Iniciado no dia 9 tenho indicado e comentado sobre o que consegui acompanhar. Montagem do Coletivo Ultralíricos com canções inéditas de Tom Zé, Língua Brasileira parte da canção homônima do disco Imprensa Cantada, lançado em 2003:

Quando me sorris
Visigoda e celta
Dama culta e bela
Língua de Aviz…

Tom Zé, aos 85 anos, continua instigante e um dos mais criativos compositores brasileiros. Sobre a velhice e a montagem, o compositor disse: “tem algumas coisas que vão se diluindo, mas na paixão que eu tomei por essa peça, eu virei criança outra vez!”.

“Seis atuantes e quatro músicos dão a ver e ouvir a epopeia dos povos que formaram o português falado no Brasil, seus mitos e cosmogonias, passando pelas remotas origens ibéricas, por romanos, bárbaros e árabes, pela África e a América Nativa.

A montagem passeia pelo inconsciente de nossa língua, suas graças e tragédias, seu “esplendor e sepultura”, paradoxo presente em verso do poema de Olavo Bilac (1865-1918) que leva o mesmo nome do espetáculo”.

O Mirada trouxe 36 obras de 13 países, sendo Portugal o país homenageado pelo evento. Nada melhor do que ver, entre os trabalhos deste domingo, dia 18, Língua Brasileira, trabalho que reflete sobre o “esplendor e sepultura” da nossa língua considerando – conforme o diretor Felipe Hirsch: “quase 200 línguas em extinção, sendo mais de uma dúzia delas faladas por pouca gente; três, quatro pessoas originárias. “E, no entanto, o Brasil está aprendendo a entender um pouco disso, do esplendor da mistura dessa língua, e da sepultura. Essa perpetuação da escravidão, o extermínio de povos nativos indígenas, e várias línguas consumidas por isso”, diz, situando que não se trata de peça didática, tampouco de tese, mas poética”.

Com ingressos esgotados desde o anúncio e abertura de venda dos ingressos, fica registrado aqui para a direção do Festival para que, na próxima edição, tenha mobilidade e reserva de verba e espaço para ampliar o número de apresentações dos espetáculos oferecidos. Vários dos trabalhos não consegui ingressos, o que, felizmente, não aconteceu com Língua Brasileira.

Ficha técnica da montagem

Língua Brasileira. Foto:_Matheus-Jose-Maria

Uma peça dos Ultralíricos e Tom Zé
Direção geral Felipe Hirsch
Música e letras Tom Zé
Elenco Amanda Lyra, Danilo Grangheia (Gui Calzavara), Georgette Fadel, Josi Lopes, Pascoal da Conceição e Rodrigo Bolzan
Direção musical Maria Beraldo
Músicos Biel Basile, Fernando Sagawa, Ivan Gomes e Luiza Brina
Músicos (em alternância) Gustavo Sato, Cuca Ferreira, Gabriel Basile e Daniel Conceição
Diretora assistente Juuar
Dramaturgia Ultralíricos, Felipe Hirsch, Juuar e Vinícius Calderoni
Dramaturgista/consultor geral Caetano Galindo
Direção de arte Daniela Thomas e Felipe Tassara
Iluminação Beto Bruel
Figurino Cássio Brasil
Design de som Tocko Michelazzo
Preparação vocal Yantó
Design de vídeo Henrique Martins
Difusão internacional Ricardo Frayha
Direção de produção Luís Henrique Luque Daltrozo

Canta Brasil!

Esperar destaque para a música brasileira de um programa denominado The Voice é chover no molhado. Somos colonizados e há muitos, entre nós, que pensam que “gritar” em inglês faz do sujeito um grande cantor. O certo é que há um número considerável de brasileiros que entendem parcamente o que diz – canta – cada candidato; assim, pouco importa se o indivíduo pronuncia parcamente ou porcamente.

Nossa música é sofisticada; muito sofisticada! O suficiente para avaliar qualquer cantor, qualquer tipo em qualquer região vocal e sob diferentes aspectos. Por exemplo: quantos concorrentes do The Voice cantariam bem o “Brasileirinho” (Waldir Azevedo – Pereira da Costa) ou o “Tico-tico no fubá” (Zequinha de Abreu – Eurico Barreiros)? Sem firulas, sem exageros, pois não há necessidade disso. Precisa ter folego, dicção privilegiada, capacidade de interpretação acima do comum para interpretar tais canções.

Os concorrentes, dizem, gostam de mostrar extensão vocal. Bom, para esses, há ótimas possibilidades: “Na baixa do sapateiro” (Ary Barroso), “Carinhoso” (Pixinguinha – João de Barro) e “Rebento” (Gilberto Gil) são apenas algumas possibilidades. Entre as mais difíceis considero “Rosa-dos-Ventos”(Chico Buarque), “Sabiá” (Tom Jobim – Chico Buarque), “Eu te amo” (Caetano Veloso) e entre muitas canções de Milton Nascimento, gostaria de ver alguém encarando “Saudade dos aviões da Panair”. (Dele, Milton, com Fernando Brant, também conhecida como “Conversando no bar”).

 

Estou comemorando antecipadamente o “dia do samba” (dia 2 próximo) e quero mais samba, mais chorinho, samba-canção, enfim, de mais música brasileira. Em se tratando de samba, por exemplo, os candidatos de concursos vocais – se querem mostrar que realmente cantam – deveriam arriscar um “Cai dentro” (Baden Powell e Paulo César Pinheiro) que, por sinal, só ficou excelente na voz de Elis Regina.

Sinto que esta é uma batalha perdida (apenas uma batalha!). O tempo costuma vencer todos os candidatos que, com suas músicas estrangeiras, caem no esquecimento. Sempre lembraremos Ney Matogrosso, Elza Soares (Hoje lembrada no The Voice pela excelente Cristal), Vicente Celestino, Gal Costa, Maria Bethânia, Nelson Gonçalves, Tom Zé, Maysa e, é claro, João Gilberto. Estou lembrando alguns grandes interpretes brasileiros que, com toda a certeza, em um ou outro momento cantaram música estrangeira. Todavia, gente como Maria Bethânia não será lembrada por “What is new”; esses intérpretes formidáveis (e podem aumentar a lista!) serão lembrados por sussurros afinados cantando Bossa Nova ou pela voz colocada com perfeição na personalíssima cadência do samba.

Há muito tempo um grande cantor, tão grande que foi chamado de “Rei da Voz”, gravou “Canta Brasil”. O nome desse cantor é Francisco Alves. Depois, veio a gravação de Ângela Maria e, bem depois, Gal Costa regravou a mesma canção, que é de Alcyr Pires Vermelho e David Nasser. Vou concluir este post com a letra deste samba exaltação, pois sinto muita falta dessas canções na nossa televisão; quem sabe, em algum programa, o nosso Brasil musical possa ser prioridade!

As selvas te deram nas noites teus ritmos bárbaros E os negros trouxeram de longe reservas de pranto Os brancos falaram de amor em suas canções E dessa mistura de vozes nasceu o teu canto

 

Brasil, minha voz enternecida Já dourou os teus brasões Na expressão mais comovida Das mais ardentes canções

 

Também, na beleza deste céu Onde o azul é mais azul Na aquarela do Brasil Eu cantei de norte a sul

 

Mas agora o teu cantar Meu Brasil quero escutar Nas preces da sertaneja Nas ondas do rio-mar

 

Oh! Este rio turbilhão Entre selvas e rojão Continente a caminhar No céu, no mar, na terra! Canta Brasil!!

 

Bom final de semana para todos!

São Paulo! Comoção de minha vida…

São Paulo é a segunda cidade de milhões de pessoas que migraram, como eu, em busca de uma vida melhor. E, de “segunda cidade” passa a ser a primeira no coração de toda essa gente. Eu, pelo menos, não consigo pensar minha vida fora de São Paulo e sei de muitos migrantes que também pensam assim. É um sentimento às vezes carregado de culpa quando se coloca a cidade onde nascemos (Uberaba, meu amor!) em segundo plano.

Pra quem vem do Triangulo Mineiro, o Pico do Jaraguá anuncia a chegada em São Paulo.
Pra quem vem do Triangulo Mineiro, o Pico do Jaraguá anuncia São Paulo.

Foi complicado conhecer São Paulo, entender a cidade. Foi difícil aceitar que Santo André, São Caetano, fossem outras cidades. Todas próximas, sem fronteiras visíveis, sem os campos que separam as cidades da minha Minas Gerais. Os primeiros foram tempos de aventura, com dificuldades, descobertas estranhas: Uma mesma rua, por exemplo, a Rua Augusta, muda de nome quatro vezes! Tive, naquele período, algumas alegrias e muita saudade.

Augusta, 

Graças a Deus,

Entre você e a Angélica

Eu encontrei a Consolação

Que veio olhar por mim

E me deu a mão.

Meu primeiro endereço foi a Avenida Paulista. Contei minha chegada, detalhadamente aqui (é só clicar!). Estava perto da Avenida Brigadeiro Luiz Antônio, avenida por onde passo todos os dias já que moro em uma travessa da mesma. Todavia, naquela época, durante o dia eu procurava emprego e, entre uma caminhada e outra, ia conhecendo a cidade onde, um dia, havia sido turista.

Augusta, que saudade,

Você era vaidosa,

Que saudade,

E gastava o meu dinheiro

Que saudade,

Com roupas importadas

E outras bobagens.

O primeiro trabalho foi em uma empresa que fica na Rua Abdo Chaim, uma paralela da Rua 25 de Março. Desde então mantive minha definição para o que via por lá: a imensa capacidade humana de criar objetos obsoletos. De dia trabalhava como auditor. Saia da empresa sempre correndo – aprendi rapidamente a andar como paulistano, às pressas! – para ir ensaiar peças teatrais. Nos finais de semana cantava em botecos. Foi em uma tarde, no trabalho, que ouvi pelo rádio, sem acreditar, que Elis Regina estava morta.

Tom Zé, migrante apaixonado por São Paulo, autor dos versos que colocam poesia neste post
Tom Zé, migrante apaixonado por São Paulo, autor dos versos que colocam poesia neste post

Bom ser jovem. Eu vivia comendo salgados feito por chineses, descobri o pastel de feira, o caldo de cana, milho verde em cumbuca, e, volta e meia, tomava refeição dentro de um vagão lotado do trem suburbano. Via grandes ratos transitando pelo parque D. Pedro e presenciei três assaltos em um único momento, na fila aguardando o ônibus. Dormia três, quatro horas por noite, alimentando-me mal, valendo-me da saúde obtida na vida tranquila de Uberaba.

Angélica, que maldade

Você sempre me deu bolo,

Que maldade,

E até andava com a roupa,

Que maldade,

Cheirando a consultório médico,

Angélica.

Meu primeiro apartamento ficava “nos fundos” do Mosteiro de São Bento. Tinha todas as horas marcadas pelos sinos, com uma musicalidade sóbria, grave e, simultaneamente suave. Minhas sessões religiosas aconteciam ao som do canto gregoriano dos frades beneditinos. Após grandes viravoltas, o segundo apartamento foi no bairro da Liberdade, onde aprendi a gostar de sushi, temaki, sashimi entre tantas outras comidas japonesas.

Antes de parar na Bela Vista contabilizei mais moradias que anos de vida. Vila Mariana, Higienópolis, Ipiranga, Cerqueira César… Fui atropelado, fui assaltado… Um batismo no folclore da grande metrópole.

Quando eu vi

Que o Largo dos Aflitos

Não era bastante largo

Pra caber minha aflição,

Eu fui morar na Estação da Luz,

Porque estava tudo escuro

Dentro do meu coração.

Das lembranças todas suscitadas em datas como a do aniversário da cidade, gosto de comemorar a imensa galeria de amigos. De todos os matizes, raças, origens… De agradecer pela carreira profissional múltipla, a cidade permitindo-me realizações concretas no magistério, no teatro, no jornalismo, nas artes plásticas, nas letras…

Quantas histórias similares a esta. Quantos milhões de pessoas beneficiadas pela graça do Santo, São Paulo, que nunca castigou-me por ser Palmeirense. Há mais de 30 anos por aqui, trago Uberaba no meu peito; sou Minas Gerais. Jamais abdicarei disso por crer que esta é uma condição essencial para perceber e agradecer aos céus tudo o que,como migrante, tenho recebido em São Paulo. Dia 25 sempre foi, no meu entendimento, dia pra comemorar e agradecer.

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Parabéns, minha capital querida!

Obrigado, São Paulo!

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Notas:

1 – O título deste post é o primeiro verso do poema “Inspiração”, de MÁRIO DE ANDRADE in Paulicéia Desvairada.

2 – Os versos que intercalam o texto são da música de TOM ZÉ (Augusta, Angélica e Consolação), onde o compositor sintetiza a alma de três, das principais avenidas da capital. Para ouvir a canção, clique aqui.

Tropicália no Sambódromo é Águia de Ouro

Desde o ano passado gostei da idéia de que a Tropicália seria o tema da Escola de Samba Águia de Ouro. A escolha não poderia ser mais feliz e estou torcendo, desde então, para que a Águia de Ouro brilhe na avenida. Não foi por acaso que Caetano Veloso disse em versos, lá na década de sessenta, na letra da música “Tropicália”:

 Eu organizo o movimento

Eu oriento o carnaval

Eu inauguro o monumento no Planalto Central

Do país. 

Se o samba nasceu na Bahia, a Bossa Nova no Rio de Janeiro, São Paulo é a cidade da Tropicália, assim como foi a cidade da Semana de Arte Moderna em 1922. Nossa São Paulo tem uma especial vocação para a modernidade e aqui que a guitarra elétrica foi definitivamente somada ao instrumental da música brasileira.

Os principais criadores do movimento

O tema da escola do bairro da Pompéia, neste ano, é “Tropicália da paz e do amor! O movimento que não acabou” (clique para ouvir). Historicamente, considera-se o final do movimento com o exílio de Gilberto Gil e Caetano Veloso. Após prisão, foram para Londres. Por aqui, Gal Costa fez um trabalho de resistência e a música brasileira ganhou outro matiz com a posterior chegada do grupo Novos Baianos. 

A letra do samba de enredo da Águia de Ouro é farta em referências explícitas para contar a Tropicália: Cita a Bossa Nova, a Jovem Guarda, o Rock, as guitarras e segue, dando crédito aos criadores Caetano Veloso e Gilberto Gil. Lembra a primeira parte do verso mais famoso da música “Alegria, Alegria”, “caminhando contra o vento” que é momento empolgante do samba. Há ainda a menção aos festivais, ao filme “Terra em Transe”, de Glauber Rocha, e à peça de Oswald de Andrade, “O Rei da Vela”, na encenação histórica do Teatro Oficina. Chacrinha é lembrado e as citações terminam com os Novos Baianos.

Bruna Martini, que é minha aluna e integrante apaixonada da Águia de Ouro, foi a primeira a falar-me da Tropicália enquanto tema da escola. E escreveu-me: “Os autores do samba são Jairo, Fernando Sales, Tadeu e Rodrigues. O intérprete é Serginho Porto e o carnavalesco é o Cebola.” Sendo uma escola da Pompéia, pensei que haveria maiores menções ao pessoal da banda “Os Mutantes”. Os meninos moravam no bairro. Acompanharam Gilberto Gil em Domingo no Parque e, como banda, Os Mutantes participam de todo o disco do cantor e compositor, lançado em 1968. Acima de tudo, Os Mutantes mantiveram uma postura musical tropicalista até a década seguinte, realizando um trabalho que atravessou fronteiras, tornando-se a banda brasileira de rock com maior reconhecimento internacional.

Rita Lee estará na avenida. Caetano Veloso manifestou apoio em vídeo. E a Águia de Ouro já anunciou outros nomes para o desfile. Fiquei pensando com meus botões que se eu fosse o tal Cebola, minha comissão de frente reproduziria a capa de “Tropicália ou Panis et Circensis”. O disco é, em si, o projeto estético da Tropicália e, conforme Celso Favaretto, no livro “Tropicália: Alegoria, Alegria”, é estruturado, musicalmente, como uma polifonia, ou longa suíte. Assim, dá uma clara noção do que os idealizadores do movimento pretendem.

A reprodução desta foto seria minha opção para a comissão de frente.

Imaginem um grupo dançando e, bem no meio do Sambódromo, reproduzindo a famosa foto! E se as baianas viessem com cabelos à la Gal Costa? Um grupo inteiro de noivas, lembrando Rita Lee no Festival Internacional da Canção? Cor é o que não falta e espero, sinceramente, que a Águia de Ouro não só faça um belo carnaval, mas que consiga uma excelente colocação. Só pelo tema, a escola já merece estar entre as primeiras colocadas. Agora é torcer para que ela concretize a Tropicália no carnaval de São Paulo e consiga vencer o campeonato.

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Bom carnaval, Águia de Ouro!

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Nota:

Veja abaixo, a letra do samba de enredo da escola que estará desfilando na segunda noite dos desfiles paulistanos. A ordem do desfile do Grupo Especial no Anhembi será:

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Dia 17/02 – sexta-feira: ordemCamisa Branco e Verde; Império de Casa Verde; X-9 Paulistana; Vai-Vai; Rosas de Ouro; Acadêmicos do Tucuruvi e Mancha Verde.

Dia 18/02 – sábado: Dragões da Real; Pérola Negra; Mocidade Alegre; Águia de Ouro; Unidos de Vila Maria; Gaviões da Fiel e Tom Maior.

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Tropicália da paz e do amor! O movimento que não acabou

Autores: Jairo, Fernando Sales, Tadeu e Rodrigues

Águia de Ouro eterna paixão
O tesouro que guardo no meu coração
No swing da Pompéia eu vou
Na Tropicália da paz e do amor

Brasil, oh pátria amada
Terra abençoada de encantos mil
Sua natureza é divinal
Paraíso de beleza Tropical
A Beira Mar a Bossa Nova Nasceu
Guitarras a tocar, como inspiração
Pra jovem guarda e o rock em apogeu (apogeu)
Com Caetano e Gil, a Tropicália Surgiu
Em liberdade de expressão
“Caminhando contra o Vento”
Ao novo tempo sem repressão

No ar, ecoam notas musicais
Pra eternizar, grandes festivais
E os talentos, o povo consagrou
E a  musica embalou

Sucesso no cinema
Terra em transe na tela
A arte a moda em poema
No teatro, “o rei da vela”
Bate tambor no iê iê iê pro povo balançar
O caldeirão a ferver de cultura popular
A nave louca partiu a dor foi demais
Na luta os seus ideais (Ideais)
Mas, Chacrinha tropicalista imortal
Recebe os novos baianos no Planeta Carnaval

Rock para crianças bem nascidas

Indagaram se eu não escreveria sobre o Rock In Rio. Fui quase intimado a escrever, o que não se faz necessário, já que gosto mais de escrever do que de rock. Cheguei a cogitar de ir ao evento. Minha querida Juliana Ramalho até que mediou a venda de uns ingressos, que alguém ganhou e que estava passando adiante. Fui ver a programação do dia em questão; das vinte e cinco atrações oferecidas teria e tenho real interesse em três: Milton Nascimento, Esperanza  Spalding e a Orquestra Sinfônica de Heliópolis. Para isso eu esbarraria em Nx Zero ou Tulipa Ruiz.  Não cometi pecado recente; não careço de punição. Declinei.

Fui verificar a programação...

Após desistir do tal dia, tentei interesse em algum outro dia e a média foi mantida. Três, às vezes duas, uma vez quatro atrações seriam realmente interessantes. Todavia, nada que eu não possa ver por aqui mesmo. Mas, tem o lance da tribo, da moçada, do ambiente. Bisbilhotei bastante o ambiente.

A “cidade do rock” é bonitinha. Pareceu-me segura. Se eu fosse mais jovem, minha querida mamãe não precisaria ficar preocupada. Não tem barro, assim, poderia ir com minhas roupas de “grife”. Também mamãe não ficaria perturbada, com receio de uma má alimentação: tem praça de comidinhas. E se eu ficasse entediado com Claudia Leitte teria o shopping ou o parque de diversões pra me distrair, aguardando outra “grande” atração. E tranqüilidade maior das mamãezinhas: todas as lojas e em todos os pontos de venda de qualquer coisa aceitarão cartões de crédito. E há caixas eletrônicos! Mamãe pode até mandar mais “algum” caso a criança gaste além da conta.

A Ivete até que é bem bonita! Dia 30.

Os tempos mudaram e as crianças de hoje vão lá chorar amores perdidos enquanto saracoteiam com algum bom som. Eu iria, se fosse de graça e bem pertinho, sem ter que encarar  um monte de “nãos”.

Não pode levar alimentos, tipo sanduba de mortadela (Tem que comprar!). Não pode levar uma boa câmera fotográfica (Investimento perdido!), nem pode levar guarda-chuva! (Santo Deus, quem pensaria em levar guarda-chuva pra um festival de rock?). E também não pode ir de carro particular, só de transporte público (aqui, a coisa não ficou muito clara; bicicleta ou moto, pode?).

Provavelmente terão alguns grandes momentos de rebeldia nesse Rock in Rio; Katy Perry ou Rihanna, Ke$ha ou Shakira, alguma dessas aí fará uma pose ousadíssima. O público, certamente, cantará junto com elas, com a Ivete Sangallo, com o Jota Quest… e tomará cerveja, muita cerveja. Certamente haverá overdose de cervejas. Depois, a criança irá para um banheiro químico expelir a “ceva”, se muito precisará de uma injeção de glicose… Nada que as mamães por aí não estejam acostumadas.

Também prometo não ver pela tv.

Desse Rock in Rio, lamentarei não ver Mutantes + Tom Zé no mesmo palco. E trocaria ingressos de todas as estrelas citadas só pra ver Janelle Monáe. Aguardarei outras oportunidades. Elas virão. A moçada da música do planeta descobriu que aqui no Brasil se ganha muito dinheiro, o povo tem de sobra pra pagar ingressos. Então, dá pra aguardar o festival de verão, o de inverno, o carnaval, o carnaval fora de hora, os festivais de todas as praias e tudo o mais que favorece o consumo que tanto desfalque dá na carteira do pai, mas que é a tranqüilidade da mamãe. Afinal, nas cidades do rock atuais, as crianças estão seguras.