Escrevi sobre Tinoco em fevereiro de 2009. Os últimos anos do cantor foram melancólicos, difíceis e isso ficou claro lá, quando a imprensa noticiou os problemas enfrentados pelo artista. Hoje lamentamos a morte do cantor. Optei por editar o texto anterior e reproduzi-lo aqui. É mais uma constatação de que, infelizmente, as coisas mudam muito pouco. É, também, homenagem sincera ao artista e ao trabalho da dupla Tonico e Tinoco. Aprendi com meu pai a admirar, gostar e a respeitar esses grandes artistas.
TINOCO PRECISA DE TRABALHO?
O Brasil tem cada coisa! Há horas que penso que exagero no nacionalismo deste blog. Quem vem por aqui com frequência já percebeu que raramente abordo estrangeiros. Nada contra; é questão de opção e, em certos aspectos, de resistência. Pura e teimosa resistência.
Há tanto espaço na mídia destinado aos músicos estrangeiros, compositores, bandas e intérpretes, e tanta gente de quem se fala muito pouco. Ou não se fala tanto quanto deveria. E acaba sendo diferencial atentar sobre certos aspectos da nossa música, de nossos artistas e, fundamentalmente, o quanto estão ligados ao nosso cotidiano, nossas vidas.
Reafirmo não ter nada contra, por exemplo, LILY ALLEN; fala-se dela toda hora. Nada contra CHRIS BROWN, nem contra OZZY OSBOURNE, JESSICA SIMPSON, BRUCE SPRINGSTEEN, PETER MURPHY, ou a juventude da banda FRANZ FERDINAND (Esses em 2009. Os “da hora” são outros)
Aliás, já temos, aqui na terrinha, a banda HOLGER com letras em inglês e STEPHANIE TOTH, a paulistana que canta folk. Não; definitivamente nada tenho contra essa gente toda. A urgência é outra. Preciso falar de um brasileiro chamado TINOCO.
“Moreninha linda
Do meu bem querer
É triste a saudade
Longe de você…”
TONICO e TINOCO, mesmo para aqueles que não conhecem a dupla profundamente, ou que não identificam suas vozes, lembram-se dos nomes ao exemplificar música caipira. Isto porque, se alguém tiver vontade em pesquisar, descobrirá que essa dupla paulista emplacou mais de 100 sucessos ao longo de várias décadas. Desde 1946 que o Brasil canta o “Chico Mineiro”.
“Fizemo a úrtima viagem
Foi lá pro sertão de Goiás
Foi eu e o Chico Mineiro
Também foi o capataz…”
A “Dupla Coração do Brasil”, assim chamada pelas gravações de todos os chamados ritmos regionais, terminou em1994, com a morte de TONICO. E o jornal Agora São Paulo, edição do dia 15, conta a atual situação de TINOCO, em matéria assinada por ALBERTO PEREIRA JR. Com uma agenda restrita, um salário ínfimo de aposentadoria e enfrentando problemas familiares, o cantor vive momentos difíceis. Eu fiquei indignado com o que li, triste pelo que este homem está passando. O Brasil precisa cuidar do Brasil, dos brasileiros! Sejam esses simples cidadãos ou grandes artistas.
“Neste mundo choro a dor
Por uma paixão sem fim
Ninguém conhece a razão
Por que eu choro no mundo, assim…”

A dupla TONICO E TINOCO já é nome de praça e tem museu dedicado ao trabalho que realizaram, em Pratânia, interior de São Paulo. Já receberam inúmeras homenagens. Aos 88 anos TINOCO deveria estar colhendo louros da gloriosa carreira, mas “gostaria mesmo é de trabalhar”.Pior, porque estamos no Brasil e temos um sistema de saúde precário, esse senhor “precisa” trabalhar para garantir tratamento para a esposa.
A ganância dos grandes laboratórios farmacêuticos, em colocar o preço dos remédios na estratosfera, leva famílias inteiras à falência e ao desespero, pelo receio constante em não ter como bancar o tratamento dos entes queridos. Contra os 600,00 reais pagos em ingressos para ver MADONNA temos R$ 2,00 cobrados no salão da igreja onde TINOCO se apresentou, buscando garantir os remédios de que a família necessita… É a pior das ironias.
“Ó que saudade do luar da minha terra
Lá na serra branqueando folhas secas pelo chão
Esse luar cá da cidade tão escuro
Não tem aquela saudade do luar lá do sertão…”
Artistas não param nunca. Diferente do operário, louco pra aposentar e abandonar o trabalho árduo, o artista vive e respira através da forma de expressão que lhe é própria. Eu espero que TINOCO não pare de cantar. O ideal seria que ele não precisasse cantar nas atuais condições. Mas, esse é o meu Brasil. Nosso país!
Já citei a dupla em posts anteriores. Gostaria muito de não ter escrito este, com esses assuntos. No entanto, a realidade é esta. Deixo aqui minha solidariedade a TINOCO. Sobretudo, presto minha homenagem ao homem simples, batalhador, que veio da terra para os palcos e mostra, com sua atitude perante a adversidade momentânea, a força, a fé e a raça do caipira brasileiro.
“Vou parar com minha viola
Já não posso mais cantar
Pois um jeca quando canta
Tem vontade de chorar
O choro que vai caindo
Devagar vai se sumindo
Como as águas vão pro mar.”
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Até!
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Notas Musicais:
Moreninha – Tonico, Priminho e Maninho
Chico Mineiro – Tonico e Francisco Ribeiro
Saudade de Matão – Raul Torres e Jorge Gallati
Luar do Sertão – Catulo da Paixão Cearense e Laura Okumura
Tristeza do Jeca – Angelino de Oliveira
Outras:
Para os interessados em ler toda a matéria sobre as dificuldades de TINOCO, em 2009, o link:
http://www.agora.uol.com.br/show/ult10111u504352.shtml
Postado originalmente no Papolog
“Fizemo a úrtima viagem..”