
Queluz – SP, foi a terceira cidade visitada pelo Projeto Arte na Comunidade 4, durante edição no Vale do Paraíba que contemplou também os municípios de Cruzeiro e Lavrinhas. “A Baronesa de Queluz”, interpretada por Luciana Fonseca, é referência explícita ao ciclo áureo do café e aos barões que viveram na região.
A montagem apresentada na primeira fase do Arte na Comunidade visitou as escolas municipais; o texto escrito e dirigido por Valdo Resende lembra não só aspectos históricos como também hábitos e costumes presentes na vida da cidade. A direção musical é de Flávio Monteiro e os figurinos de Carol Badra.
Idealizado por Sonia Kavantan, o Arte na Comunidade 4 foi patrocinado pela Alupar, Taesa e apoiado pelas Usinas Queluz e Lavrinhas. Uma realização da Kavantan & Associados, Ministério da Cultura e Governo Federal.
Havendo interesse em reproduzir o texto ou interpretá-lo, é obrigatória a citação do motivo pelo qual o texto foi escrito e a autoria do mesmo.
A BARONESA DE QUELUZ!
Original de Valdo Resende
(CARACTERIZADO COMO UM POETA, TROVADOR, A ATRIZ ENTRA CANTANDO A MÚSICA DE ABERTURA CAMINHANDO POR ENTRE O PÚBLICO E, ANTES DE IR PARA O ESPAÇO CÊNICO PRINCIPAL – PALCO OU SALA DE AULA – BRINCA COM OS PRESENTES. ALÉM DAS CRIANÇAS, DEVE DAR ÊNFASE AO PROFESSOR EM SALA, CUMPRIMENTANDO-O E REVERENCIANDO-O).

Vamos brincar de teatro
Vamos brincar de ser,
Viver muitos personagens
Nessa viagem e assim crescer.
O palco é a rua, a sala,
A praça ou o nosso quintal
A história a gente inventa
Ou conta aquela já bem contada
Que recontada, não tem igual!
– Meus amigos: Cheguei!
(CUMPRIMENTA E BRINCA COM A PLATEIA)
– Bom dia, boa tarde, boa noite! Que horas são? Por gentileza, meu senhor, pode me dizer a hora? Hora, então é… (COMPLETA DEPENDENDO DA RESPOSTA)! Que cabeça essa minha, boa tarde, boa noite, bom dia… Mas, o que interessa é saudar as pessoas. Os dias ficam melhores quando cumprimentamos as pessoas! Saudações! É muito bom estar com vocês! É ótimo estar em Queluz. Estava com muita saudade. E, estar em Queluz e brincar de teatro é melhor ainda. Pra começar uma peça, antigamente, o hábito era dar três toques. Assim (DÁ AS TRÊS BATIDAS TRADICIONAIS). Aprenderam? Agora, com palmas. Três palmas, certo? (FAZ COM O PÚBLICO E RETOMA O REFRÃO DA MÚSICA DE ABERTURA)
Vamos brincar de teatro
Vamos brincar de ser,
Viver muitos personagens
Nessa viagem e assim crescer.
(O FINAL COINCIDE COM A CHEGADA DA ATRIZ AO ESPAÇO CÊNICO DETERMINADO)
Estava por aí, viajando e se voltei, é porque saí daqui. Na verdade sou daqui, de Queluz, onde nasci e onde quero estar. Todavia, desde criança, pensava em viajar, conhecer outros países, outros lugares. Achei que tinha que cumprir uma missão. É, cumprir uma missão (RI, COMO QUE SE ENTREGANDO). Acho que a missão era satisfazer minha curiosidade. Nasci curioso. Olhando nossa belíssima serra, já criança, me perguntava: o que haverá do outro lado? Quem estará lá? Alguém sabe o que há do outro lado da Mantiqueira? (INDAGA O PÚBLICO E ENTABULA CONVERSA) Você, por exemplo, já ficou imaginando o que há do outro lado? (PARA OUTRA CRIANÇA) E você, já foi lá em cima? Olhou para o nosso Vale do Paraíba, com toda a sua imensa beleza? Desde cedo, muito cedo, pensei que devia ir para o outro lado da serra. Mais tarde, fui para o lado oposto ao da Serra da Mantiqueira; quis conhecer o fim do rio, ver se ele deságua no mar e assim viajei bastante… O primeiro lugar que eu visitei ainda criança, com minha família, foi Passa Quatro, ali em Minas Gerais. Alguém já foi até lá? Passa um, passa dois, passa três, passa quatro e muito mais! Lugar bonito! Também fui até o Rio de Janeiro, que é nosso vizinho. Mas, antes de continuar falando e conversando, acho que está na hora de me conhecerem um pouco mais, saber quem eu sou!
(MÚSICA DE FUNDO ENQUANTO O ATOR DECLAMA OS VERSOS APRESENTANDO-SE AO PÚBLICO)
Atenção, senhor, senhora,
Quem vos fala é um cantador,
Aquele que trova, poeta,
Não faz versos só de amor.
Desde os tempos de outrora,
Pela graça divina,
No canto não desafina
Na dança não desatina
Do palco é dono e senhor!
Digo a todos, com respeito,
Prestem atenção: sou um ator!
Violeta, este é meu nome!
Sendo pobre nunca passei fome,
Pois nasci em belo vale
Onde aprendi a pescar,
A carpir, fabricar!
Senhores, sou de Queluz
Vim aqui me apresentar.
(TERMINA FAZENDO MESURAS E VOLTA A FALAR NORMALMENTE)
Nós, cantadores, somos parentes distantes dos trovadores; estes surgiram antes mesmo de os portugueses chegarem ao Brasil. Lá na Europa, na Idade Média, os primeiros trovadores andavam de cidade em cidade, apresentando poemas, cantando em praças, em festas religiosas ou nos grandes palácios. Às vezes cantávamos músicas nossas ou de outros compositores; de outras vezes, declamávamos poemas, sonetos e… Fazíamos teatro!
Eu adoro fazer teatro, também gosto de fazer versos. Então, resolvi ser atriz e poetisa. Ou trovador e ator? Ou cantador e ator? Não sei… Foi na escola que descobri o teatro. Minha professora gostava de fazer peças, de nos ensinar poesia. Depois, cresci e resolvi continuar a brincar de teatro e de fazer versos. Estudei, trabalhei em diversos lugares, com muitos outros artistas e agora estou aqui, de volta à minha cidade. Fazer teatro é muito bom! É uma brincadeira divertida, podem crer. Sabem de uma coisa, melhor fazer que falar. Vou chamar algumas crianças para brincar de teatro comigo. Quem quer? (A ATRIZ CHAMA CRIANÇAS (QUATRO) PARA UMA BRINCADEIRA. COM AS CRIANÇAS NO PALCO, COLOCA-AS NO CANTO E EXPLICA O JOGO).

Prestem atenção! O mundo do teatro é todo de faz de conta; um faz de conta tornado realidade pelo ator. Por exemplo, (COM MÍMICA) nada em uma mão, nada na outra e, de repente, o ator faz todo o mundo acreditar que segura uma vassoura (SEGURA O OBJETO FICTÍCIO E SAI VARRENDO O PALCO) e que está deixando tudo limpinho, limpinho, limpinho. Viram como é fácil? Façam comigo! (REPETE O ATO DE VARRER). Muito bem, agora vamos em frente (MUDA A AÇÃO). Vamos pegar a vassoura por uma ponta e transformá-la em uma vara de pescar! (SIMULA SEGURAR A VARA, JOGANDO O ANZOL EM UM RIO). Alguém aqui já pescou no Paraíba? O nosso bom e velho rio Paraíba do Sul? Pescar é bom demais! Eu ouvi dizer, lá de longe, que os peixes diminuíram muito, alguns tipos desapareceram, foram embora por conta de água suja… Também, quem vive em água suja? Mas, também já sei que estão trabalhando para que voltem peixes em abundância no nosso rio. Bom, vamos tentar pegar um peixinho! Tomara que consigamos pescar, pois eu adoro peixe! Opa! (FINGE QUE FISGOU). Peguei um! Pesquei um! (MOSTRANDO PARA TODOS) Olhem só o tamanho do meu peixe!
(VOLTA-SE PARA AS CRIANÇAS QUE ESTÃO NO PALCO)
Viram como se pode brincar só com a imaginação? Agora vamos continuar a brincar juntos? Vamos fazer de conta que somos soldados em guerra, prontos para defender nossa cidade, como nossos antepassados em 1932 (REALIZA A AÇÃO COM AS CRIANÇAS). Nossa gente é forte e não foge à luta. (MUDA A AÇÃO) Pronto! Agora, vamos brincar de lavradores e vamos capinar; deixar tudo limpinho (REALIZA A AÇÃO, SEMPRE ORIENTANDO E AJUDANDO AS CRIANÇAS)! Capinar é uma tarefa árdua, cansativa. Debaixo do sol, então, deixa eu limpar o suor (FAZ A AÇÃO). Não é fácil. (CONCLUI O GESTO E MUDA) e, finalmente, vamos varrer o que capinamos e juntar tudo nesse canto e assim concluímos mais uma, realizamos nossa ação e, já que terminamos, vamos fazer como atores educados e vamos agradecer a atenção das pessoas (FAZ MESURAS COM AS CRIANÇAS, AGRADECENDO À PLATEIA).
Pois bem, agora que já aprendemos vou dividir nosso pequeno grupo em duas duplas, vou pedir a eles que realizem duas ações e vocês, da plateia, adivinharão o que eles estão fazendo. Vamos lá!
(A ATRIZ PEDE, EM SIGILO, QUE CADA DUPLA REALIZE AÇÕES SIMPLES COMO DESCASCAR UMA LARANJA, UMA BANANA, CARREGAR UMA MALA, AMARRAR O SAPATO, DIGITAR NO COMPUTADOR, FALAR AO TELEFONE… IMPORTA QUE SEJAM AÇÕES FICTÍCIAS E DE ACORDO COM A FAIXA ETÁRIA DAS CRIANÇAS. DURANTE OS ENSAIOS DEVERÃO TRABALHAR, JUNTO A DIREÇÃO DO ESPETÁCULO, DIVERSAS POSSIBILIDADES PARA REALIZAÇÃO NAS ESCOLAS. AO FINAL DA BRINCADEIRA, AGRADECE AS CRIANÇAS, FAZENDO COM QUE VOLTEM A SEUS LUGARES).
Teatro é muito legal, não é! A gente começa fazendo coisas mais simples e depois, vai aprofundando, fazendo coisas mais complexas, até chegar a fazer uma peça inteira, com várias horas de duração. (MOSTRA O LIVRO HISTÓRIA DE LENÇOS E VENTOS, DE ILO KRUGLI). Há peças de teatros com grandes personagens, de todos os tempos e lugares, mas eu quero contar pra vocês que há personagens diferentes, como os criados por Ilo Krugli! Nome diferente, não é mesmo? Ilo Krugli. É que ele nasceu longe, em Buenos Aires. Mas está no Brasil há muito tempo. Ele é um autor de teatro maravilhoso que escreveu a peça História de Lenços e Ventos (MOSTRA O LIVRO). A peça está publicada neste livro. História de Lenços e Ventos!

Imaginem: um lenço azul é o protagonista, o personagem principal da peça (A ATRIZ DEVE MOSTRAR UM LENÇO AZUL PARA A PLATEIA, BRINCANDO COM O MESMO). Ele é um aventureiro, livre como eu gosto de ser; livre! E, curioso, como eu também sou; ele adora conhecer o novo. Às vezes treme de medo; outras vezes vai em frente com a maior coragem. Gosta de carinho, de afago! Um lenço que ganha vida através do teatro (GUARDA O LENÇO).
Na peça escrita por Ilo Krugli há outros personagens muito diferentes. (FOLHEIA O LIVRO, ANUNCIANDO AS PERSONAGENS) Uma nuvem que é sonolenta, dorminhoca mesmo; um guarda-chuva! Já imaginaram um guarda-chuva falante? Ele é o principal protetor do papel, uma folha de jornal que é também personagem da história. Através dessa peça a gente aprende que é possível fazer teatro com aquilo que temos. Não precisamos ficar pensando “ah, se eu tivesse palco”, “Ah, se eu tivesse um cenário grandioso”, “ah, se eu tivesse…”.
No teatro podemos dar vida e emoção às coisas tanto quanto às pessoas, olhando-as com olhos diferentes do comum. Gosto de interpretar coisas, de fingir ações, mas o que gosto mesmo é de contar histórias. Histórias de todo tipo. Nas minhas andanças por ai sempre contava histórias de lugares fantásticos, de lugares imaginários, até que uma vez me pediram para contar quem era e como eram os primeiros habitantes de Queluz. Desafiaram-me dessa forma: (IMITANDO O DESAFIANTE) “-Inventar fantasias é fácil! Queremos ver se você é capaz de transformar história real em teatro”. Pensei com meus botões… Bobo! Esse cara não sabe de nada. Pois vou mostrar pra vocês como é que eu contei essa história, dos primitivos moradores da nossa cidade. Vou me transformar!
(UMA VINHETA MARCA A MUDANÇA DE CENA. COM ELEMENTOS MÍNIMOS A ATRIZ TRANSFORMA-SE NO ÍNDIO PURI CONHECIDO COMO VUTI OU VUITIR – MONGO VELHO. UMA MUDANÇA DE ROUPA, UM COCAR SIMPLES OU TESTEIRA COM MOTIVOS INDÍGENAS SÃO ELEMENTOS MÍNIMOS SUGERIDOS).
VUITIR – Meu nome é Vuti! Alguns me chamam Vuitir! Vuitir! Sou um índio Puri! Nós, os Puris, somos da família dos goitacás. Os Goitacás eram selvagens e cruéis; é o que contam os mais velhos que eu; encheram de terror os portugueses, quando esses chegaram por aqui. Nós, os Puris, somos calmos, gente de paz. Gostamos de viver com nossos cantos e danças e, todos confirmam, somos grandes dançarinos. Vivemos do que plantamos: banana, batata, milho. E também gostamos de cará, mandioca, abacaxi… Somos bons caçadores e bons pescadores. Para caçar fazemos nossos arcos, flecha, zarabatana para pegar aves… Bodoque! Tem algum menino aqui que saiba fazer bodoque? Na minha aldeia toda criança faz bodoque, sabe pescar, nadar e caçar, porque precisamos da caça para nossa alimentação.

Os Puris não são conhecidos como os Tamoios, os Xavantes, os Tupinambás, os Yanomamis, os Caiapós ou os Aimorés. Essas são algumas das tribos, famílias indígenas que já estavam no nosso país muito antes da chegada dos portugueses. Nós estávamos aqui, os Puris. Infelizmente os colonizadores tomaram nossas terras, dominaram nossa gente. Eu, Vuitir, percebendo a força dos invasores, fiz um acordo com eles e trouxe minha gente para viver aqui, desde que fossem bem tratados. Foi tudo como o combinado, ficamos bem. Todavia, com o tempo minha gente foi desaparecendo (COMEÇA A TIRAR ADEREÇOS INDÍGENAS). As doenças trazidas pelos brancos, as mudanças todas diante da nova situação nos foram fatais. Perdemos o nosso modo de vida e saímos da história.
(VINHETA. TERMINA DE TIRAR OS ADEREÇOS E PROSSEGUE.).
VIOLETA – Sabem que eu gosto muito desse velho índio puri? Fico imaginando… Já pensaram se os índios Puris ainda estivessem por aqui? Como é que viveriam? O que eles caçariam? Ninguém mais consegue viver de caça por aqui. As mudanças foram tantas que o ambiente em que eles viviam tornou-se muito diferente. Não conseguiriam mais caçar, mal teriam o que pescar… A mata original se foi, mas o rio está ai. E poderia nos fornecer muito mais peixes, mais riquezas! Há tanta sujeira nos nossos rios. Se a gente não cuidar nem nós sobreviveremos. Não é brincadeira! Sem água limpa, sem peixe, as matas destruídas, onde iremos parar?
(CANTA, COM A MELODIA DE A CANOA, CANTIGA DE RODA)
A canoa parou
Já não posso mais pescar
Foi por causa da sujeira
Nem me deixa navegar…
(VOLTA A FALAR) Até Martim-pescador, o pássaro que vive daquilo que pesca está ficando raro por aqui. Ainda temos gaviões, garças, tico-tico… (TIRA UM PAPEL PARA DOBRADURA DO BOLSO E COMEÇA A CRIAR UM PEIXE) A vida já é difícil com pouco peixe, imaginem se ficamos sem pássaros? Vamos fazer duas coisas! Duas! (ENTREGA O PEIXE PARA UMA CRIANÇA) Uma é aprender a nova letra da cantiga que é pra gente não esquecer de que temos que cuidar dos nossos rios. E a segunda, já falo; vamos cantar!
(A ATRIZ ENSINA A PLATEIA, CANTANDO UM VERSO, PEDINDO QUE A MESMA REPITA E APÓS FAZER OS QUATRO VERSOS, REPETIRÁ TODA A CANTIGA. ENQUANTO ISSO FARÁ OUTRO PEIXE COM O PAPEL DE DOBRADURA).
A canoa parou
Já não posso mais pescar
Foi por causa da sujeira
Nem me deixa navegar…
(EXIBE O PEIXE PARA A PLATEIA) Vejam no que transformei esse papel. Um peixe! Eu disse que faríamos duas coisas, certo? A primeira foi a música. Agora quero ensinar as crianças a fazerem esse peixe. A ideia é a seguinte: sempre que possível, a gente faz um peixe para lembrar que temos que cuidar do rio para que ele volte a nos dar muitos peixes pra pescar. E quando alguém estiver sujando o rio, seja quem for, jogando ou despejando coisas nos nossos rios, nós não vamos brigar, vamos fazer um peixe como este e dar de presente à pessoa, para lembrá-la que rio sujo é rio sem vida. Vamos aprender a fazer esse peixe?
(A ATRIZ FARÁ O ORIGAMI E ENSINARÁ AOS ALUNOS DE CADA SALA. COM CALMA MOSTRARÁ CADA ETAPA DA ATIVIDADE, ORIENTANDO E PERMANECENDO ATENTO PARA QUE TODOS FAÇAM O ORIGAMI. EM SEGUIDA, AGRADECE AS CRIANÇAS E PROSSEGUE).

Dobrar papel é uma arte desenvolvida no Japão. Lá eles dizem origami e assim ficou conhecido no mundo inteiro. Origami. Arte de dobrar papel e transformá-lo em flores, animais e toda uma série de coisas. Quem me ensinou a fazer dobraduras foi meu avô. Como já disse, eu nasci aqui, em Queluz. Sou de uma família de piraquaras. Meu avô foi piraquara. Alguém ai sabe o que é piraquara? Piraquara é pescador. Assim como se diz do camponês que este é caipira, dizem do pescador: é um piraquara! Pois então, venho de uma família de pescadores, de caipiras ribeirinhos vivendo das graças do Rio Paraíba do Sul. Em casa não faltava lambari, curimbatá, surubim… Era tudo muito farto, peixe que não acabava mais.
Do quintal da casa de meus pais eu via a Pedra da Mina, imponente, majestosa. Meu avô vivia dizendo; (IMITA O AVÔ) “- A Pedra da Mina é o ponto mais alto da Serra da Mantiqueira!” Havia um tio que morava mais aí pra frente, já no Estado do Rio de Janeiro, teimava com o meu avô; (IMITA O TIO) “-Que nada! O ponto mais alto da Serra é o Pico das Agulhas Negras, aqui no Estado do Rio de Janeiro”. Era uma briga que não tinha fim. (BRINCA FAZENDO OS DOIS PARENTES) “- A Pedra da Mina é o ponto mais alto”! (IMITA O OUTRO) “- O Pico das Agulhas Negras é o mais alto! (REPETE AS AFIRMATIVAS). “- A Pedra da Mina é o ponto mais alto”! “- O Pico das Agulhas Negras é o mais alto! “- A Pedra da Mina é o ponto mais alto”! “- O Pico das Agulhas Negras é o mais alto”!( INTERROMPE BRUSCAMENTE)
Hoje, com aparelhos sofisticados, sabemos que a nossa Pedra da Mina tem oito metros a mais que a outra e, dizem os aparelhos, são exatos 2.796 metros de altura. 2.796! Eu pequeno, bem pequeno mesmo e a Serra naquela altura! Só é orgulhoso quem quer; a Serra da Mantiqueira está aí, pra mostrar para o ser humano o seu verdadeiro tamanho! Somos pequenininhos!
Meu avô gostava de passear, caminhar pelas trilhas da montanha e acabou ganhando um dinheirinho com isso. De repente começou a aparecer gente querendo subir a serra o pé, ver de perto o Pico dos Três Estados. Meu avô levou muita gente para o lugar que marca a divisa do território dos três estados, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. (BRINCA) Vovô gostava de brincar dando passinhos para um lado e outro: – Olhem, estou em Minas! Vejam, voltei para São Paulo! Agora vou para o Rio de Janeiro!
Eu morria de curiosidade pra saber como era Minas Gerais, o Rio de Janeiro… Acho que foi também por isso que tomei gosto pela ideia de viajar. Um dia arrumei uma mochila, dei tchau para minha família e fui me aventurar no mundo. Peguei carona com um caminhoneiro e fui para bem longe e lá, já muito distante da minha terra, quando dizia ser de Queluz, logo comentavam: (IMITANDO UM SUPOSTO INTERLOCUTOR) Queluz, você é de Queluz então você é português. (FAZENDO SOTAQUE PORTUGUÊS:) “Ora gajo, me diziam, perdestes o sotaque da terrinha? Que raio de português que és se já não falas como os teus?” Hein?
Não sei quantas vezes repeti que a minha Queluz é a do Vale do Paraíba. Há outra Queluz, lá em Portugal, é uma cidade antiga, famosa por nela estar um palácio da família real portuguesa, o Palácio de Queluz, que era um dos locais preferidos de vários membros da família real. É um belo lugar com jardins floridos, enfeitados com estátuas e tem um interior rico, com uma decoração primorosa. Eu dizia tudo isso e emendava falando sobre nossa Queluz, recitando versos que eu mesmo fiz e foi assim que começaram a me chamar de poetisa. Vou recitar os tais versos para vocês.
(SOBE MÚSICA INSTRUMENTAL)
Queluz, no vale do Paraíba,
É minha cidade natal.
Não confunda, meu amigo,
Com a outra de Portugal.
Aquela é cidade de reis
A nossa, bem brasileira,
Para nós é sempre a primeira.
São duas belas cidades
Quem conhece assim afirma
No meu coração não tem igual
Por isso repito e te peço
Não confunda, meu amigo,
Com a outra de Portugal.
(FAZ MESURAS E SEGUE A NARRATIVA) Defendendo minha cidade, falando sobre as belezas daqui, passaram a me chamar de Baronesa. Não que eu tenha sido rica, ou que venha de família poderosa, dona de grandes fazendas. Sou apenas uma atriz e, ainda, aprendiz de poeta. E assim aconteceu: eu chegava aos lugares e já ia explicando qual era a minha Queluz (fala rapidamente):
Queluz, no vale do Paraíba
É minha cidade natal
Não confunda, meu amigo
Com a outra de Portugal.
(VOLTA A CONTAR) Um dia, declamando estes versos, fui desafiado a contar a história da minha cidade. Não assim, de uma maneira qualquer, mas como um grande personagem. Foi um desafio e tanto. Há tantos fatos da nossa cidade que dão boas histórias! Um deles, certamente, está na memória de todos os mais velhos. E cada criança vai aprendendo, ouvindo de seus pais, de seus avós e vendo ali, no meio do rio o que restou da antiga ponte, dinamitada em 1932.
Todos sabem, o Rio de Janeiro está logo ali e, em 1932, era a Capital Federal, sede do governo. Os revolucionários estavam aqui, na nossa cidade, prontos para barrar as tropas federais que, em maior número, ameaçavam derrotar os paulistas. Para retardar o avanço inimigo foi resolvido destruir a ponte. Tenho aqui (tira da bolsa) uma cópia de um jornal de 1932, contando esse fato (LÊ):
“Levo ao vosso conhecimento que a 10 de agosto o Doutor Antonio Bresser Monteiro fez voar dinamitada a ponte da estrada de rodagem sobre o Paraíba, em Queluz… Debaixo de intenso fogo de fuzilaria e metralhadoras o doutor, afirma o jornal – com grande serenidade! -” deu provas de energia, sangue frio e bravura”! Uau! Que herói!
O doutor Monteiro é um grande personagem de Queluz que deve ser sempre lembrado. Um personagem real que merece as melhores interpretações! Mas também há outros, bem longe, lá dos tempos do império. Sabe, eu gosto de lembrar esse tempo onde tínhamos os nobres. Nossa família imperial, toda bonitona e os nossos barões e baronesas do café, naquela época a nossa maior riqueza. (A MESMA VINHETA DE MUDANÇA DE PERSONAGEM) Fiquei pensando nesse tempo, pensando, pensando… (VAI TROCANDO OS ADEREÇOS E TRANSFORMANDO-SE NA BARONESA DE QUELUZ) Fui criando, criando, criando… Fui me transformando e… (APÓS COLOCAR O ADEREÇO FINAL – JÁ COM OUTRA POSTURA E COMPOSIÇÃO DIFERENCIADA) pronto!
(UMA MUDANÇA DE VESTUÁRIO, REMETENDO AOS BARÕES DO CAFÉ E UM LEQUE SÃO OS ADEREÇOS MÍNIMOS SUGERIDOS).

BARONESA DE QUELUZ – Meninos e meninas, mestres e mestras, todos os presentes!Agora sim, devidamente vestida e preparada. Eu sou o Baronesa de Queluz! Sou desta bela cidade onde nasceram outros barões, nobres, como eu. Um deles o Vicente de Paula Vieira, o Barão de Rifaina. Nasceu aqui, na nossa Queluz. Também de nossa Queluz é o Barão de Novais, um dos grandes donos de fazendas de café! Grandes figuras esses barões!
Ainda hoje gosto de passear por essas antigas fazendas… São José, Fazenda Bela Aurora, Fazenda do Regato, Cascata… Fazendas belíssimas que guardam a história dos velhos barões, homens da mais alta linhagem. Certamente vocês nunca ouviram falar a meu respeito, eu, a Baronesa de Queluz. Sim, pois não sou baronesa por decreto, mas por opção! Assim sou a única Baronesa de Queluz!
Outro dia, tive o desprazer de encontrar uma jovem mulher do povo que colocou em dúvida a minha identidade. Ela foi chegando e me dizendo:
(IMITA UMA MULHER DO POVO, DIALOGANDO COM A MESMA, ESTABELECENDO UM JOGO ONDE INTERPRETA AS DUAS PERSONAGENS).
MULHER – Que baronesa que nada! O tempo de condes, duques e barões já passou. Só se você for uma baronesa de araque. Aliás, você tem cara de baronesa de araque! Tão verdadeira quanto uma nota de quinze reais!
BARONESA DE QUELUZ – (PARA A PLATEIA) Que ousadia! Que atrevida! Eu? Falsa? Nota de quinze reais? Não pude deixar de responder: Pois saiba a senhora que sou baronesa sim, de alta linhagem. Barão, minha senhora, é palavra que significa homem livre. Sou uma mulher livre! Sou uma baronesa. (PARA A PLATEIA) E não é que a mulherzinha retrucou!
MULHER – Logo vi; uma baronesa de araque! De mentira!
BARONESA DE QUELUZ – Uma baronesa verdadeira!
MULHER – Uma falsa baronesa!
BARONESA DE QUELUZ – Verdadeira!
MULHER – Falsa.
BARONESA DE QUELUZ – Verdadeira!
MULHER – Falsa!
BARONESA DE QUELUZ – (PARA A PLATEIA) O que aquela mulher queria? Provavelmente me enlouquecer. Eu já estava quase doida quando resolvi, ao invés de brigar, mostrar que posso ser o que quiser ser, pois sou uma atriz e as atrizes transformam-se em tudo o que der na cabeça. Então, enfrentei a megera com minhas armas preferidas: as armas do teatro!
(DECLAMA, PARA A MULHER FICTÍCIA).
Olhe bem, minha senhora,
Quem vos fala sem despeito,
Trazendo poesia no peito,
Dona do próprio nariz!
Atenção, peço respeito!
Minha cara, sou uma atriz!
(VOLTA A FALAR NORMALMENTE) Eu achei que ela se aquietaria com meus versos, mas não é que ela me desafiou novamente?
MULHER – Então a senhora Baronesa de Queluz é uma atriz! Onde é que está o palco, o figurinista, o iluminador?
BARONESA DE QUELUZ – Minha senhora, o figurinista está aqui, presente nas roupas que visto (MOSTRA A ROUPA, DESFILANDO E EXIBINDO-SE). E a luz foi Deus quem deu! Quando precisamos de luz contratamos técnicos, eletricistas, o iluminador! E palco, ah, minha senhora, o palco é onde o ator está. E para cenário, basta a imaginação. Veja só, como vou lhe mostrar!
(TROCA ALGUNS ADEREÇOS. UMA ECHARPE E UM LENÇO {O LENÇO AZUL DO INÍCIO} SE TORNA LENÇO DE CABEÇA, TRANSFORMANDO-SE EM UMA COZINHEIRA TELEVISIVA, QUE ENSINA UMA RECEITA).

COZINHEIRA – Minha querida amiga dona de casa, hoje vamos fazer o prato mais delicioso da região, prato típico oficial de nossa cidade: Queluz na Moranga (FALA RAPIDAMENTE, MAS COM CHARME E SIMPATIA). 1kg de carne seca , 2kg de mandioca, três tomates, uma cebola, cinco dentes de alho, um maço de espinafres, três tabletes de caldo de carne, salsinha e cebolinha, bacon para decorar e, obviamente… Uma moranga! Cozinhe a carne, sem sal. Faça um purê com a mandioca. Frite a carne com a cebola e o alho. Adicione o tomate, o espinafre, os temperos todos e recheie a moranga já assada decorando com salsinha e o bacon. Ai, que delícia!
(VINHETA. VOLTA A SER VIOLETA; ENQUANTO FALA RETIRA, CALMAMENTE, OS ADEREÇOS ANTERIORES).
A mulher que duvidada que eu pudesse ser a Baronesa de Queluz ficou quietinha e depois que eu dei a receita, ficou me olhando, sem saber o que retrucar. Voltei a ser eu mesma e aproveitando a deixa convidei a moça para visitar nossa cidade, na Festa da Moranga e da Mandioca.
Aliás, moranga e mandioca são ingredientes do nosso delicioso prato desde o tempo dos tropeiros que atravessavam nosso país. Quem não quer vir na festa da moranga é porque já morreu! Temos muitas festas por aqui, não é? Gosto muito de ter conterrâneos festeiros, cheios de alegria. Quantas festas a gente tem aqui, por ano? Quer saber, vou chamar algumas crianças para uma brincadeira, sobre as festas da cidade.
(CHAMA AS CRIANÇAS – NO MÁXIMO CINCO – E PROPÕE ALGUMAS ADIVINHAS. DISTRIBUI PRANCHETAS COM PAPEL PARA CADA UMA DELAS).
Atenção crianças, vamos brincar de adivinhas. O tema das nossas perguntas serão as festas da nossa cidade. Prestem atenção! Vamos lá! Eu faço a pergunta e vocês escrevem a resposta no papel. Lembrem-se, o segredo das respostas são as festas da nossa cidade.
Pra Santo Antonio e São Pedro
Vivo pedindo perdão
E prometo todo dia
Jamais soltar balão
Toda vez que em Queluz
Temos festa de… (SÃO JOÃO)
(A ATRIZ DEVE ESTIMULAR, PERGUNTANDO O NOME DO SANTO QUE FALTA. APÓS CONFIRMAR A RESPOSTA – SÃO JOÃO – A ATRIZ COMPLEMENTA).

Parabéns. São João! A festa junina de Queluz é considerada a melhor de todo o vale do Paraíba. Há muitos shows, quadrilhas e muitas comidas gostosas. Eu, sempre que posso, não perco o canjão de galinha, depois da alvorada festiva. Mas, vamos responder qual outra festa está na próxima adivinha:
Bons em forno de lenha,
Também em fogão a gás
Grande festa da cidade
Toda vez que acontece
Da balança a gente esquece
Por isso convido você
Vamos à festa do… (DOCE)
Parabéns aos que acertaram. Eu perco a compostura na festa do doce. Como todas as tortas, compotas, geleias. É a melhor festa do mundo! Agora, vamos para a última adivinha! Prestem atenção e anotem a resposta.
Quando chega o calor
Há festas no litoral
No frio em nossa Queluz
É tempo de festival
Complete o nome, meu amigo,
Dessa festa sem igual
Festival de… (FESTIVAL DE INVERNO)
(VOLTA A COMENTAR) Festival de Inverno. Eu gosto desde quando havia encontro de motociclistas. Mas, o que mais me agradou nesse festival foi o fato de ter feito apresentações das minhas peças de teatro lá, no Espaço de Eventos 8 de Março.
(TERMINANDO A BRINCADEIRA PEDE APLAUSO PARA AS CRIANÇAS E PREPARA-SE PARA SAIR DE CENA)
Bom, obrigado a todos pela participação. Professora, muito obrigado por me ceder tempo de sua aula. Sabem o que eu fico pensando? Se o Padre Francisco das Chagas Lima, fundador da nossa cidade, pensava que teríamos tantas festas assim. É claro que uma cidade que tem São João Batista como padroeiro tem que ter uma bela festa junina e, vamos combinar, festa é sempre bom.
Agora preciso ir embora. Vou visitar muitas escolas, muitas salas e brincar de teatro com muito mais gente. Prestem atenção que tenho algo muito especial a solicitar de vocês: eu gostaria que cada um de vocês escrevesse uma história sobre nossa cidade. Pode ser em versos, uma redação, uma peça de teatro… Professora, se for possível, a senhora ajuda o pessoal nesses trabalhos? Seria muito legal. Quando eu voltar vou ver o que vocês fizeram; combinado? Pra vocês, que ficam por aqui, meu muito obrigado, obrigado especial à escola e então, quem já aprendeu a canção pode cantar comigo.
(CANTA A MUSICA DE DESPEDIDA)
Vamos brincar de teatro
Vamos brincar de ser,
Viver muitos personagens
Nessa viagem e assim crescer.
O palco é a rua, a sala,
A praça ou o nosso quintal
A história a gente inventa
Ou conta aquela já bem contada
Que recontada, não tem igual!
Tchau, pessoal! Adeus! Até logo, professora! Em breve estarei de volta. Até a próxima!
Valdo Resende, Março/2016